Por Leonardo Rocha e Adriano Araújo
A Polícia Civil e o Ministério Público Federal (MPF) investigam o caso de intolerância religiosa que aconteceu nesta quinta-feira, no Parque Paulista, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Na ocasião, criminosos, que se intitulam "bandidos de Jesus", invadiram e destruíram um terreiro de candomblé, dando ordens para que o espaço fosse fechado. Este é décimo sexto caso de ódio à crenças africanas registrado no município, só neste ano. De acordo com dados da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), até agora foram contabilizados 40 ações criminosas na capital, 20 em São Gonçalo e 15 em Campos dos Goytacazes.
"A gente vem fazendo um esforço muito grande para tentar estancar este cenário de violência. Estamos em contato com o governo, prefeituras e municípios, além das comunidades, terreiros e pastores. É um problema de difícil resolução", destacou o procurador da República Júlio Araújo.
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No momento do ataque ao terreiro em Duque de Caxias, a mãe de santo líder do espaço religioso, uma idosa de 85 anos, estava presente e sofreu várias ameaças sob a mira de uma arma. Os "bandidos de Jesus" são apontados como traficantes que tomaram conta do Parque Paulista, ligados à facção Terceiro Comando Puro (TCP). Foi a primeira vez que o terreiro, há mais de 50 anos no bairro, sofreu um ataque, apesar das ameaças já existirem. "Eles já fecharam três, quatro espaços religiosos. Estamos ali há 52 anos e nunca passamos por situação parecida. Não vamos voltar, a segurança dela (mãe de santo) em primeiro lugar", contou o familiar da mãe de santo, que não quis se identificar.
O babalaô Ivanir dos Santos, da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), disse que após o registro na DECRADI vai auxiliar os membros do terreiro no encaminhamento do caso no Ministério Público do Rio (MPRJ). O líder religioso fez duras críticas ao governo do estado que, segundo ele, não tem adotado as medidas prometidas durante reunião com o CCIR e o Ministério Público Federal (MPF).  "O mais triste é a inércia das autoridades. Conversei com o governador Wilson Witzel para fazermos uma agenda, mas até hoje nada foi feito. Acertamos fazer uma reunião num espaço que poderia ser o TJ e convocar líderes de várias religiões junto com o secretário de Segurança para pensarmos uma estratégia em conjunto, mas nada foi feito. Está na hora do governador chamar para si essa responsabilidade. Se fosse uma igreja cristã ou uma sinagoga, a solução seria imediata. Não dá para fingir que nada está acontecendo", criticou.
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O caso foi registrado por uma integrante do terreiro na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (DECRADI) na manhã de ontem. A especializada faz diligências para apurar as circunstâncias e os responsáveis pelo ataque. A investigação corre sob sigilo. "Não há informações de que os crimes sejam ordenado de dentro de presídios, mas há uma preocupação com a integridade das vítimas e testemunhas.  O acesso ao inquérito pode ter um aspecto bem negativo em relação às vitimas", explica Júlio.
Em resposta aos ataques, uma caminhada inter-religiosa será realizada neste domingo em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, em protesto contra a intolerância religiosa. A concentração acontecerá na Rua D'Walmor (Praça dos Direitos Humanos) a partir das 9h. "O importante nesse momento é a mobilização para que as autoridades comecem a se movimentar. É uma caminhada voltada para toda a Baixada, para
encorajar as pessoas e pedir ajuda às autoridades. Isso que aconteceu é uma ameaça ao estado laico e a democracia. Precisamos de medidas efetivas. Atualmente, vivemos um jogo de empurra. Uma luta do bem contra o mau", destaca Ivanir dos Santos.