Com 88 metros de altura, a Rio Star fica pronta em novembro para receber 1 milhão de turistas por ano - Estefan Radovicz
Com 88 metros de altura, a Rio Star fica pronta em novembro para receber 1 milhão de turistas por anoEstefan Radovicz
Por GUSTAVO RIBEIRO
Nova menina dos olhos da Região Portuária, a roda-gigante Rio Star vai ganhando forma ao lado do AquaRio com seus 88m de altura. A expectativa de atrair 1 milhão de visitantes, por ano, e impulsionar a economia, no entanto, é ameaçada por um histórico problema de segurança pública. O ponto turístico, que tem previsão de ser inaugurado em novembro, é montado bem em frente ao conflagrado Morro da Providência, a apenas um quilômetro de distância. E, de cara, contraria a letra do “Rap da Felicidade”, de Cidinho e Doca, que fez 25 anos em 2019: “Nunca vi cartão-postal em que se destaque uma favela. Só vejo paisagem muito linda e muito bela... o gringo vem aqui e não conhece a realidade”.
Se os turistas, gringos ou não, poderão ver do alto a paisagem da favela, os cinco mil moradores da comunidade, a primeira do Brasil, olham mais para os problemas da violência em seus quintais: só este ano, ele conviveram com 18 tiroteios ou disparos de arma de fogo até 29 de agosto — média de dois casos por mês, com um morto e um ferido.
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Os dados de tiroteios são do Laboratório de Violência Armada Fogo Cruzado. Em sete dos casos foi identificada a presença de agentes de segurança. Devido a confrontos no morro, o VLT para, em média, uma vez por mês. O Instituto de Segurança Pública registrou 4.166 roubos na área do 5º BPM (Praça da Harmonia) - que abrange a região da nova atração - de janeiro a julho de 2019, ou 20 por dia.
Roda gigante da Gamboa, na zona portuária, está prestes a ser inaugurada. Na foto, Vitor Portilho e sua filha,Nayara Avelar Portilho. - Estefan Radovicz / Agência O Dia
“Sempre existirá o risco de que um disparo errático (bala perdida) vá atingir a roda-gigante. A essa distância, a potência do disparo com fuzil é suficiente para matar”, ressaltou Vinícius Cavalcante, especialista em armas e diretor da Associação Brasileira de Profissionais de Segurança.
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Segundo Cavalcante, mesmo que as cabines sejam fechadas e reforçadas com policarbonato, como a roda London Eye, de Londres, não segurariam tiros de fuzil. “O policarbonato resiste ao impacto de uma pedra, um pássaro. Poderia até segurar um disparo de calibre baixo”.
O professor Rodrigo Carvalho, 36, que trabalha na região, se preocupa: “Acho legal, para os moradores, uma atração com essa visibilidade. Por outro lado, a estação de trem já teve que fechar, na Central, por causa de tiroteio na Providência”, lembrou. “Quando olhei a roda, já falei que não ia andar nela. Vai que eu leve uma bala perdida”, reforçou a maranhense Naira Santos, 21, freelance de eventos que vive há um ano no Rio. 
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Roda gigante da Gamboa, na zona portuária, está prestes a ser inaugurada. Na foto,Rodrigo Carvalho. - Estefan Radovicz / Agência O Dia
Turistas, no entanto, estão empolgados. "Todo lugar tem risco. Não é a roda que vai proporcionar isso. É maravilhosa", ressaltou o mineiro aposentado Vitor Portilho, de 63. “A expectativa é de mais um ponto turístico muito bonito para admirar a Baía com tudo o que tem de antigo no Rio. Eu não teria medo”, completou Daniela Freitas, de Campos dos Goytacazes.

Morador critica projeto
Primeira favela do Brasil, a Providência foi ocupada por excombatentes da Guerra de Canudos. Vitoriosos contra o grupo liderado por Antônio Conselheiro, eles vieram ao Rio em busca da casa prometida pelo governo, por volta de 1897. Sem lugar para morar, se fixaram no morro batizado, na época, com o nome de uma planta rasteirinha do sertão baiano: Favela.
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Criador do projeto Turismo Providência, Cosme Felippsen reclama da falta de políticas públicas: “Não é a primeira vez que se constrói algo monstruoso sem consulta popular, como já aconteceu com o teleférico, que custou mais de R$ 75 milhões.
Dependendo do valor cobrado, a população nem vai usufruir”. O teleférico está parado desde dezembro de 2016, sem contrato de operação. Felippsen critica, ainda, a ausência do estado na comunidade: “A Providência não conta com escola nem clínica da família. A única presença do estado é uma UPP. Também
falta vaga em creches. As mães arranjam emprego e não têm como trabalhar”.

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Sem informação sobre blindagem das cabines
A Companhia Urbana da Região do Porto (Cdurp) informou que a Arc Big Eye, vencedora da licitação da prefeitura para operar a Rio Star, contratou empresa de segurança com funcionários treinados para situações emergenciais, e que as gôndolas serão fechadas, climatizadas e sonorizadas.
Mas frisou que a estrutura não é isolada na Região Portuária, mencionando que o local tem prédios comerciais de grande porte, conjuntos residenciais, a própria comunidade do Morro da Providência, a Cidade do Samba, o centro de manutenção do VLT e a Via Binário do Porto, “por onde passam milhares de pessoas todos os dias”, destacou.
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A Cdurp comentou que a preocupação com segurança pública reside em todos os pontos da cidade, e não só em áreas turísticas. “O protocolo para a Rio Star será o mesmo adotado em todos os lugares com o apoio das forças de segurança do governo do estado”, afirmou. A Arc Big Eye e a Cdurp não responderam sobre blindagem. A Polícia Militar foi procurada, mas não comentou o assunto.