
Rio - Sirio Schwamborn Júnior, de 66 anos, pede licença ao motorista, entra no ônibus e recita os primeiros versos da viagem: "Por que enriquecer sem ser com o suor do rosto? Somente aquele que luta tem o pão que lhe faz gosto". No fim do poema, entregue aos passageiros em um bilhete, oferece as balas que vende a um real nos coletivos da linha 562 (Duque de Caxias-Freguesia).
Enquanto espera sair sua aposentadoria, Sirio trabalha como camelô para sobreviver. E encontrou, na poesia, um diferencial que o ajuda nas vendas e é capaz de envolver os passageiros em discussões sobre temas sociais, suscitados por poemas de Castro Alves e Agostinho Neto.
Quando o ônibus passava na altura de Madureira, a passageira Maria Augusta da Costa, de 71 anos, se emocionou com os versos do angolano Agostinho Neto recitados por Sirio: "Outros viemos. Lutar para nós é ver aquilo que o povo quer realizado".
"Eu não esperava ver isso no ônibus. Acho bonito as coisas que ele falou. Se todos procurassem fazer o mesmo, o mundo seria melhor. São palavras que fazem a gente refletir", disse a aposentada, que comprou balas de banana.

A viagem segue. Sirio recita mais poemas, vende doces e se despede, depois de propagar seu lema: "Resistência cultural popular suburbana. Mais poesia, mais amor, menos armas".
"Quando decidi ser camelô nos ônibus, tive a ideia de usar a poesia para atrair a atenção dos clientes e também despertar a consciência deles. Quero mostrar que a poesia é o caminho do amor. Precisamos dela, cada vez mais", disse o vendedor.
Em suas viagens, o baleiro poeta tem tido retorno positivo, de vendas e de afeto. Passageiros trocam contato e passam a enviar-lhe poesias via WhatsApp, que Sirio inclui no repertório de seu recital nos coletivos. Na loja Tarita Doces, no Mercadão de Madureira, onde parou para abastecer o gancho de mercadorias, o fiscal Sandro Tavares fez questão de não cobrar pelo pacote de balas de menta. "O Sirio é um cara do bem e traz alegria para a gente quando diz umas poesias engraçadas. Mas é na crítica social que as pessoas aplaudem", contou Sandro.

Ao deixar a loja, uma pausa para conversar com os colegas camelôs, já que a categoria é tema de um poema de Sirio, que diz: "Camelô não é ladrão. É trabalhador igual a vocês. Vítima dessa nação".
"É verdade. Tem muito motorista que não deixa a gente trabalhar. Acham que vamos entrar no ônibus para roubar, fazer alguma coisa errada", protesta o ambulante Matheus Vieira, de 15 anos.
Gosto pela leitura e causas sociais