um dos poucos espaços destinados à cultura na região, biblioteca municipal, em Campo Grande, inaugurada em 2019, permanece fechada  - fotos Divulgação
um dos poucos espaços destinados à cultura na região, biblioteca municipal, em Campo Grande, inaugurada em 2019, permanece fechada fotos Divulgação
Por Danillo Pedrosa

Quem mora na Zona Oeste, mais especificamente nos bairros periféricos (AP 5), sabe muito bem como é difícil ter acesso à cultura na região, principalmente quando a comparação é com o centro e a Zona Sul do Rio. Na luta para mudar essa realidade, dezenas de instituições assinaram uma carta enviada à Prefeitura do Rio com um pedido pela ampliação e adequação da Biblioteca Municipal Manuel Ignácio de Alvarenga, em Campo Grande, uma das poucas opções de acesso a livros gratuitos para os moradores.

O documento, que faz uma série de reivindicações, foi elaborado a partir de reuniões online da comissão composta por nove moradores da Zona Oeste: Silvia Fernandes, Angélica Angelo, Silmo Prata, Alice Franco, André Luis Mansur, José Fontenele, Deca Serejo, Luiz Alberto Damásio e Julia Daniela. E nem mesmo a pandemia foi capaz atrapalhar o grupo, que conseguiu reunir 74 assinaturas, entre elas a da Associação Empresarial de Campo Grande (AECG).

Desde o dia da inauguração da biblioteca, em novembro de 2019, ela não foi aberta ao público, já que são necessárias algumas adequações, como acessibilidade para idosos, cadeirantes e portadores de outras deficiências. Para atender esse público, uma das reivindicações é o ajuste do espaço integral do primeiro andar, já que todo o acervo de livros deve ficar no térreo para facilitar o acesso. Outro pedido é a instalação de um elevador para chegar ao segundo andar, o que dobraria a capacidade da biblioteca.

Também não há acesso à internet no local, uma das solicitações da comissão organizadora. A segurança é um problema, já que a biblioteca ainda não conta com uma saída de emergência. Para isso, a carta sugere a extensão do espaço físico, com um acesso à sala contígua, que consolidaria a saída de emergência.

"Isso contribuiria de forma determinante para o desenvolvimento inicial das atividades, visto que constituem importantes práticas de que a população necessita urgentemente", diz a carta.

Em outro trecho, a comissão destaca a alta demanda por serviços na região, apesar das poucas opções oferecidas pelo poder público. "São poucos os aparelhos municipais para a região e são inúmeros os artistas, pesquisadores e uma gama variada de outros profissionais locais que podem colaborar em oficinas, workshops, cursos e palestras, formando um material humano local de grande qualidade e potencial para o desenvolvimento e repercussão na comunidade".

 

Baixo investimento na região
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Membro da comissão organizadora responsável pela carta, a animadora cultural e psicóloga Alice Franco observa com olhar crítico a falta de investimento em diversas áreas na região. Moradora de Campo Grande desde a infância, ela luta para mudar essa realidade em diversas frentes, como na Associação de Remanescentes Quilombola Dona Bilina, na Pastoral do Meio Ambiente, no Coletivo Cultura do Rio da Prata, na Teia de Solidariedade da Zona Oeste e no Centro de Estudos da Cultura Negra (CEDICUN).
"A gente se ressente muito enquanto campograndense. É uma região de grande concentração de pessoas - e também de pagadores de impostos, como o ICMS -, contudo, o percentual investido em Campo Grande é menor que 5% do total da cidade. É quase nada. E faz falta, porque Campo Grande tem uma cultura vasta, que fala dos povos indígenas, dos quilombos, grandes pesquisadores... Mas isso não tem visibilidade porque pouco se investe", analisa Alice, que também destacou a importância da biblioteca para o bairro. 
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"A importância dela é essencial para a formação intelectual e cultural da comunidade. A biblioteca precisa ser um local aberto para a comunidade, tanto para crianças ou para uso universitário. Um espaço plural de letramento", disse.
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Políticos que só lembram em campanhas
Em período eleitoral, sempre aparecem aqueles políticos prometendo uma série de melhorias e comprometimento com a região. Mas, nos quatro anos seguintes, parece que nenhum deles se lembra das promessas. A prática é comum em todo o Brasil, e não é diferente na Zona Oeste.  Angélica Angelo, historiadora e pesquisadora de Campo Grande, conhece muito bem a prática, principalmente depois de anos de muita luta por mais investimento em cultura no bairro. 
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"As pessoas que estão se candidatando têm um prazer enorme em visitar a Zona Oeste, nossa região, mas é difícil conseguir alguma coisa para cá. Falam que não somos organizados, não somos legalizados. A maior parte da pessoas, realmente, não tem registro. Mas nós produzimos arte, nossa comunidade não é carente de arte", disse Angélica, que também faz parte parte da comissão organizadora que enviou reivindicações à prefeitura.
E mesmo com tanta dificuldade, a produção de cultura e arte continua intensa na região, muitas vezes sem qualquer retorno financeiro. "São poucos os aparelhos municipais na nossa região. E os poucos que a gente tem carecem de investimento. A verba é mínima quando conseguimos uma parceria. Acabamos fazendo a cultura aqui à parte de qualquer investimento. Nós temos coletivos na região que sobrevivem evando arte à comunidade, mas sem nenhum tipo de incentivo", afirma a historiadora.
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Recursos da iniciativa privada
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Gestora cultural do Movimento Territórios Diversos - Associação Cultural de Sepetiba - e conselheira municipal de cultura, Elizabeth Manja também se incomoda com a falta de investimento na região, o que faz com que a maior parte dos recursos direcionados à cultura sejam da iniciativa privada, já que o poder público direciona a maior parte deles para a Zona Sul e o Centro, apesar da grande população da Zona Oeste.
"Os investimentos públicos para a Zona Oeste são os menores comparados com o Centro e Zona Sul, que concentram a maior parte dos recursos da cidade. Ficamos sempre aquém desses subsídios culturais. Faltam teatros, museus, cinemas, espaços culturais de grande porte e mais bibliotecas como essa. As iniciativas que temos são em sua maioria da iniciativa privada, de coletivos e fazedores culturais que se reinventam para suprir essa carência", analisa Elizabeth, que também destaca a importância da Biblioteca Regional de Campo Grande para a região.
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"É uma conquista valorosa para a AP5 (Área de Planejamento). Sua ampliação e funcionamento adequado atenderá a demandas não só de Campo Grande como de todos os bairros e sub-bairros dessa grande e populosa região. Poder contar com esse equipamento já é um avanço significativo para uma região que historicamente vem sendo negligenciada pelas políticas culturais", afirma Manja sobre o equipamento.
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