Família de Yezzie no Rio de Janeiro - Arquivo Pessoal
Família de Yezzie no Rio de JaneiroArquivo Pessoal
Por Karen Rodrigues*
Rio - Desde 2018 até agosto de 2020, mais de 260 mil venezuelanos migraram para o Brasil pela fronteira de Roraima com destino a outros estados do país, devido à crise econômica que assola a Venezuela. De acordo com dados da Organização Internacional para as Migrações (OMI), o Rio de Janeiro, até dezembro do ano passado, recebeu 1.441 venezuelanos, em busca de uma nova vida. Este é o caso da Yessie Orozco, que largou tudo na Venezuela aos 25 anos e se mudou, em dezembro de 2017, com o marido e os três filhos para Ramos, na Zona Norte do Rio. Agora, ela vive a angústia da migração pela segunda vez com a outra parte da família que ficou na Venezuela e tenta vir para o estado.
Sem emprego, Yessie tenta trazer mais cinco integrantes da família que deixou na Venezuela apenas com o salário de frentista do marido e do cunhado. A mãe, o padrasto, a irmã, o cunhado e mais um sobrinho bebê de Yessie começaram a vinda ao Brasil no dia 30 de dezembro de 2020, mas a situação ficou crítica quando foram assaltados em um ônibus, a caminho da cidade de Santa Elena, na Venezuela, e perderam todo o dinheiro que tinham economizado para a viagem.
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"Eles juntaram dinheiro para a passagem, pegaram um ônibus e no caminho subiram quatro homens com armas e roubaram tudo, a roupa, o dinheiro que eles tinham. Bateram no meu cunhado e na minha irmã. Eles falaram que foi horrível", contou Yessie.
Após o assalto, Yessie conta que eles conseguiram chegar à divisa entre Venezuela e o estado de Roraima através de um atalho e entraram ilegalmente no país, no dia 1º de janeiro, sem dinheiro, sem roupas, apenas com os documentos que estavam escondidos nas calças.
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O drama da família agora é tentar sobreviver em Roraima durante este mês de janeiro e vir para o Rio. No momento, eles estão em um abrigo na rodoviária local, com mais de 500 venezuelanos na mesma situação. Segundo Yessie, o lugar é pequeno e comporta no máximo 300 pessoas, além de não ter alimentação e banheiro para todo os abrigados.
"Mandamos uma pessoa que conhecemos [em Roraima] para cuidar deles. Eles ficaram dois dias tomando só água, até que essa pessoa conseguiu falar com todos eles. O bebê está com muita gripe e febre, minha mãe caiu e está com o pé inchado, e o marido da minha mãe sofre de asma e roubaram todos os remédios dele no assalto. Um amigo nosso emprestou um cartão de crédito para a gente pagar a passagem de avião. Eu estou procurando lugar para fazer faxina, qualquer coisa para pagar a passagem".
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A previsão de chegada da família de Yessie ao Rio é no dia 6 de fevereiro, mas ainda há a incerteza se eles vão conseguir embarcar no avião por causa dos documentos. De acordo com Yessie, eles precisam da documentação brasileira para viajar, mas a Receita Federal de Roraima está com agendamento limitado, devido à pandemia da covid-19, e muitas pessoas estão em busca do serviço no estado.
"A documentação da Venezuela é muito diferente daqui do Brasil e, para eles subirem no avião, eles têm que pegar pelo menos a documentação. Mas como eles precisam agendar em Roraima, estamos com medo de eles não conseguirem tirar a documentação, por causa do fluxo de pessoas. Estou tentando enviar um comprovante de residência, alguma comprovação de que o bebê não é roubado, que é filho da minha irmã".
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Quando chegarem ao Rio, o novo desafio será buscar emprego. Na Venezuela, a família de Yessie vendia café e o cunhado era dono de uma pequena empresa de desinfetantes, mas com a variação diária da inflação no país, os empreendimentos faliram. Yessie vendia frios no país de origem e o marido trabalhava em um supermercado mas, diante da crise econômica, decidiram migrar para o Brasil em busca de sobrevivência.
Após um ano em Roraima e 11 horas de ônibus, Yessie chegou ao Rio, através de uma Igreja Missionária, acompanhada do marido, dos três filhos, da irmã, do cunhado e mais três sobrinhos.
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"Quando chegamos [no Brasil], a primeira impressão foi o medo, porque a gente não sabia onde nós íamos chegar. Nós deixamos nossa casa, deixamos tudo pra trás e começamos de novo uma nova vida. Foi difícil para nós com três crianças. A gente jamais ia pensar que a nossa vida fosse mudar tanto. A gente não hesitou em vir para o Rio, mas tínhamos medo, porque tinham falado para nós que o Rio de Janeiro era perigoso, mas a gente veio com medo", contou.
Logo que chegou ao Rio, o marido de Yessie conseguiu um emprego e a família alugou uma quitinete para morar em Ramos. No entanto, a situação mudou quando ela, junto ao marido e os três filhos, duas meninas de 12 e 9 anos e um menino de 11, precisaram sair do imóvel e se mudar para Senador Camará, na Zona Oeste, longe da irmã dela, que permaneceu morando na Zona Norte.
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"Como eu vim para cá com três crianças, eu fico com medo de deixar eles sozinhos, e estou longe da minha irmã. Eu estou tentando mudar de novo para Ramos para arranjar um emprego e para minha irmã me ajudar a cuidar das crianças", explicou.
A experiência de fugir da Venezuela e tentar uma vida no Rio ficou mais difícil com a pandemia da covid-19 e a falta de recursos para manter mais quatro pessoas e um bebê na família.
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"Essa [a migração] é uma das coisas que nos fez ser fortes, nos fez corajosos. A gente não tinha nada, só muita esperança. Temos medo, nós não sabemos o que vai acontecer, com essa pandemia muitas coisas estão fechadas, como vai ser com comida, com mais pessoas na família. Temos que pensar na realidade, não temos colchão, não temos cama, precisamos de roupa, sapato, pratos", finalizou.
*Estagiária sob supervisão de Thiago Antunes