A atual bula do imunizante não recomenda a aplicação em grávidas sem orientação médica individual.
A atual bula do imunizante não recomenda a aplicação em grávidas sem orientação médica individual. AFP
Por Jenifer Alves
Rio - Após mais de um ano vivendo reclusa para evitar a infecção pelo novo coronavírus, uma aposentada recebeu um áudio falso via WhatsApp falando sobre a possível ligação entre a formação de coágulos sanguíneos e a morte de pessoas que foram imunizadas com a vacina Astrazeneca/Oxford. Diante do grande número de mensagens que vêm influenciando parte da população a desistir de tomar o imunizante, a Anvisa se pronunciou e informou que não existem casos de óbitos com relação à causa.
Por causa das mensagens falsas, a idosa, de 65 anos, que segue todas medidas rígidas de confinamento, entrou em pânico e passou a negar a vacina, mesmo morando com a filha com comorbidades e o marido de 80 anos, grupos de risco para a doença. O caso aconteceu em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, mas pode se repetir em qualquer lar do Brasil ao mínimo contato com informações tendenciosas. 
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A formação de coágulos a partir da vacinação é uma condição extremamente rara. A continuidade do programa de imunização com o imunizante segue fortemente recomendada pela Fiocruz, produtora da vacina no Brasil e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para combater a disseminação do vírus.
As mensagens no WhatsApp com a informação de óbitos frequentes, resultados da formação de trombose após a vacinação com Astrazeneca, não são verdadeiras. É fundamental destacar que o surgimento de coágulos é uma condição incomum, ao contrário do que as mensagens dizem.
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Nos Estados Unidos, autoridades da saúde recomendaram a suspensão da vacinação da Jonhson&Jonhson que também apresentou, de maneira isolada, surgimento de coágulos em pessoas imunizadas. Na Europa, a Dinamarca suspendeu o uso da Astrazeneca para a vacinação da população depois que a Agência Europeia de Medicamentos iniciou uma investigação para apurar a relação dos imunizantes com a formação de coágulos.
A filha da idosa que mora em Niterói e não quis se identificar diz que a mãe travou uma batalha com a família para não tomar a vacina e que o município não dispõe mais da CoronaVac, único imunizante que a aposentada diz que aceitará. Enquanto isso, ela segue desprotegida.
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"Ela é totalmente a favor da vacina, é a favor do lockdown, mas acreditou nessa informação que recebeu por áudio, falando que uma pessoa que tem doença cardíaca, assim como ela, morreu porque tomou Astrazeneca após a primeira dose. Enviaram um "estudo" para ela falando que existe uma probabilidade grande de quem tomar Astrazeneca morrer por trombose", disse. 
O infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, alertou que as chances de desenvolvimento de um coágulo sanguíneo são muito baixas e que mulheres abaixo de 60 anos estão mais suscetíveis. Ainda assim, ele destaca que a vacina é segura e explicou qual a relação entre o imunizante e a formação de coágulos.
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"O que está sendo estudado é se a vacina pode ser o gatilho para o desenvolvimento de uma condição autoimune semelhante a que provoca a queda de plaquetas da trombose. No entanto, é um evento muito raro, de um caso entre mais de um milhão de doses aplicadas", disse.
Apesar de muitas conversas e tentativas, a idosa de Niterói segue aguardando mais um abastecimento da CoronaVac para se vacinar. 
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"Meu pai tem 80 anos já tomou as duas doses da CoronaVac e também tentou explicar para ela. Minha irmã, meu pai e eu conversamos, mostramos dados, estudos, falei que ela prejudica também quem mora com ela que no caso sou eu que, ainda não fui vacinada e sou do grupo prioritário porque tenho lúpus e sou imunossuprimida, mas não mudou de ideia", explicou a filha da aposentada.
Segundo Kfouri, o benefício de tomar a vacina é muito maior do que um eventual risco da formação de coágulos. O infectologista detalhou ainda que a Anvisa vai passar a informar essa possibilidade na bula do imunizante.
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"Essa constatação fez com que a própria Anvisa, as agências de regulação europeias e agora também com a vacina Jonhson, nos Estados Unidos, colocassem na bula essa possibilidade como muito rara. As recomendações (na bula) existem em qualquer remédio que pode causar outros efeitos. O risco de desenvolver um coágulo (ao tomar a vacina) é muito menor do que uma mulher que toma anticoncepcional ou um paciente que é infectado com o vírus e tem sequelas podendo vir a desenvolver a trombose por causa da covid-19", disse.
A Fiocruz se manifestou sobre a situação no último dia 7 e destacou os estudos conduzidos pela Agência de Medicamentos Europeia (EMA, na sigla em inglês) e a Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde do Reino Unido (MHRA, em inglês). As instituições divulgaram análises sobre possível ligação entre eventos extremamente raros de coágulos sanguíneos, associados à baixa contagem de plaquetas (trombocitopenia) e à aplicação da vacina Oxford/AstraZeneca, produzida pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Brasil.
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A instituição salientou que os casos são bastante raros. Além disso, também recomendou fortemente a continuidade da vacinação, alegando que os benefícios superam em muito os riscos. Segundo a Fiocruz, a vacina oferece alto nível de proteção contra todos os graus de severidade da covid-19, incluindo a formação de trombos pulmonares em decorrência da doença.
Um estudo realizado na Escócia, também divulgado em nota pela Fiocruz, constatou que uma única dose da vacina apresentou efetividade de 94% para hospitalização de 28 e 34 dias após a vacinação. Os resultados também demonstraram altos índices de efetividade em idosos acima de 80 anos. Até o dia da publicação do comunicado, mais de 200 milhões de pessoas já tinham sido vacinadas com o imunizante Atrazeneca, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
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A OMS também reforça a necessidade de mais estudos para compreender totalmente a potencial relação entre a vacinação e possíveis fatores de risco. E destaca que os eventos adversos raros após imunizações em massa são normais de serem identificados e nem sempre estão ligados a vacinação, entretanto, devem ser investigados. 
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) salientou também que não há dados que sustentem que a vacina não deve ser utilizada e que os efeitos colaterais reconhecidos como associados à vacina são aqueles que constam em bula. Segundo a Agência, ao longo do uso do medicamento pela população e na medida em que novos eventos vão sendo identificados, estes novos efeitos podem ser incluídos na bula do medicamento ou vacina.

No último dia 7 de abril, a Anvisa fez a inclusão na lista de eventos adversos da vacina da Astrazeneca de casos muito raros de formação de coágulos sanguíneos associados à trombocitopenia - diminuição do número de plaquetas (fragmentos de células que ajudam a coagular o sangue). Até esta data, foram identificados 47 casos suspeitos de eventos adversos tromboembólicos dentre 4 milhões de doses administradas.