"E assim sempre será. Uma viagem para a Região dos Lagos, que faço desde menina, nunca acontecerá do mesmo modo"
"E assim sempre será. Uma viagem para a Região dos Lagos, que faço desde menina, nunca acontecerá do mesmo modo" Arte: Kiko
Por ANA CARLA GOMES
Era um almoço típico de domingo, e o cenário se repetia: a mesa de sempre, numa área externa da casa, e o meu pai sentado na sua cadeira de costume. Ali mesmo, eu, ele e minha irmã viajamos pelo Brasil. Nossas memórias promoveram o embarque imediato em várias lembranças de passeios que fizemos juntos ou somente em parte da família. Talvez as duas doses de vacina já tomadas pelo meu pai tenham sido a injeção de esperança para que um dia possamos reencontrar esses destinos de perto.
Meu pai é o tipo de viajante que se apega a todo roteiro feito na primeira visita e, caso volte ao lugar, quer repeti-lo nos mínimos detalhes. É capaz de memorizar rotas completas, como a que nos levou em 2016 até a famosa Rua das Rendeiras, em Maceió. E, assim, com sua memória privilegiada, refizemos no nosso bate-papo esse mosaico de experiências, conjuntas e pessoais. Quando a conversa chegou ao Sul do país, eu me lembrei de um passeio de caiaque ao lado do meu cunhado na Lagoa da Conceição, em Florianópolis. O barco estava furado e a situação felizmente terminou bem, mas rendeu risos na bagagem de volta para casa.
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Não passou muito tempo e, numa das conversas virtuais que nos aproxima hoje de tanta gente, recebi a pergunta: "Ana, diga um lugar em que nunca esteve, qualquer um, que é doida para conhecer!". Parecia uma conexão direta com os meus pensamentos, sem escalas. Como já sou passageira certa no mundo da imaginação, embarquei logo na resposta. Citei duas viagens dos sonhos, daquelas de revistas, e emendei: "Mas sempre acho que um lugar nunca é o mesmo quando voltamos a ele. Já fui muitas vezes a trabalho a São Paulo. Mas queria voltar para passear e conhecer o Mercado Municipal, as padarias...".
E assim sempre será. Uma viagem para a Região dos Lagos, que faço desde menina, nunca acontecerá do mesmo modo. Meu coração guarda com carinho a animação da minha avó Ruth para que a gente não se cansasse com os engarrafamentos, e a empolgação da minha mãe para levar meus primos, sem que ninguém ficasse para trás. E mesmo que o embarque seja solitário, construiremos novos trajetos com as pessoas que entrarão no nosso caminho na viagem: aquelas que nos vendem o artesanato do local e nos contam a história de sua cidade, por exemplo.
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Todo esse tour pela memória é delicioso, ainda mais em tempos em que estamos tão saudosos de embarcar por aí sem angústias. Nem é preciso recorrer ao álbum de fotos para contar o que vivemos ou sentimos. Uma vez visitado, o destino deixa de ser universal. Tomamos a liberdade de fazê-lo único ao descrevê-lo pelo nosso olhar, influenciado por momentos particulares. Se voltar um dia à capital alagoana, Maceió já será outra, sob a minha visão.