Geral - Movimentaçao na cidade na manha de hoje, com o primeiro dia de flexibilizaçao das medidas restritivas. Na foto, comercio no SAARA, centro do Rio.Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia

Rio - Com o anúncio da Prefeitura do Rio sobre o novo plano de flexibilização das medidas contra a covid-19, que prevê a liberação do uso de máscaras em novembro e a volta do público em estádios e boates em setembro, parte da população ouvida pelo DIA se mostrou receosa com as medidas. Especialistas também se posicionam de forma contrária à reabertura gradual das atividades, diante do aparecimento da variante Delta.
As três etapas se darão a partir das seguintes datas: 2 de setembro, 17 de outubro e 15 de novembro. De acordo com a Prefeitura do Rio, se os números da doença continuarem regredindo, o início de setembro terá a liberação de eventos em ambientes abertos, com a permissão de 50% de público com esquema vacinal completo em estádios e em danceterias, boates, casas de show e festas em locais fechados.
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Já em 17 de outubro, a flexibilização avança para 100% da capacidade de público em estádios e em danceterias, boates, casas de show e festas em ambientes fechados. Nos dois casos, o público precisa estar imunizado com duas doses. Na última etapa, em 15 de novembro, o uso de máscaras será obrigatório apenas no transporte público e nas unidades de saúde. A partir da data, a circulação de pessoas será livre e sem restrições.
Mesmo com o planejamento progressivo, a população não se mostrou segura com a reabertura. Mesmo após o ciclo de vacinação completo, alguns seguem temerosos em deixar de lado as máscaras. "Sobre esse assunto de reabertura, eu acho que o prefeito deveria ter paciência, ainda tem especialista na área que está argumentando que não deveriam fazer [a flexibilização]. Sobretudo por causa dessa variante delta, que ainda está muito presente e parece que é a mais contagiosa de todas. Então, nesse sentido eu acho que não deveria reabrir. Já faz mais de quinze dias que eu recebi a segunda dose e ainda estou usando máscara", contou o funcionário público Jorge Nogueira, 61 anos.
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Já outros depositam as esperanças na vacinação em massa, que visa proteger a população das formas mais graves da covid-19. "Na minha opinião, a questão vai depender muito da vacinação. Se já tiver um bom índice de pessoas vacinadas, não só com a primeira dose, mas com a segunda também, você não se torna imune, mas diminui as chances de ir para o hospital. Então, se chegarmos ao fim do ano com índice alto, não digo nem razoável, mas bem alto de pessoas vacinadas, eu até poderia concordar com a retomada dessas atividades. Quanto a máscara, acho que vamos ter que ficar com ela até termos uma ideia dessas variantes", argumentou o taxista Otávio Guerreiro, 55 anos, morador de Copacabana.
Alguns pensão na questão econômica que movimenta a cidade, mas também aglomerações provocadas por turistas não vacinados na cidade e preferem seguir a recomendação de especialistas da saúde. É o caso da engenheira Claudia Fernandes, 69 anos. "Não é que eu tenha uma opinião formada, eu acho que temos que ouvir os especialistas. Nós ainda temos pouca gente vacinada, percentualmente. O Rio de Janeiro é um polo de turismo, e eu sei que a gente tem que ganhar dinheiro com isso, mas atrai muita gente, e nem todo mundo vai estar tão vacinado quanto nós estaremos em setembro ou outubro. Então, temos que fazer uma avaliação muito criteriosa", opinou.
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O que os especialistas dizem?
De acordo com a pesquisadora em saúde e membro do comitê de combate ao coronavírus da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Chrystina Barros, a divulgação do planejamento de flexibilização da Prefeitura do Rio ainda é 'prematuro' e 'temeroso', diante do aparecimento da nova variante Delta; cepa ainda mais contagiosa que as anteriores.
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"Essas medidas se baseiam em experiências de outros países. Só que, primeiro, não dá para nos comparar com outros países. Nós usamos vacinas seguras, sim, mas o perfil de vacinas pode ser um perfil diferente, com níveis de eficiência diferentes. Nos Estados Unidos, aonde já houve flexibilização do uso de máscaras, a variante Delta tem feito os números subirem e já existe por lá uma grande tendência a se voltar a usar máscaras. Isso vem acontecendo inclusive em outros países da Europa, onde essa variante tem se demonstrado muito mais transmissível", explicou Barros.
A pesquisadora esclarece que em algum momento será necessário retomar a vida normal, mas anunciar desde já medidas de flexibilização para 'uma população que na prática já tem deixado de lado os cuidados necessários' é uma atitude que a especialista classifica como 'precipitada'.
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"Basta vermos as ruas, os encontros dos principais pontos boêmios e bares. Então, a divulgação desse plano agora é antecipar uma notícia que se vier e quando, tem que ser dada de forma segura e consciente. Mesmo para quem já teve a doença e tomou as duas doses da vacina, eles não podem deixar os cuidados de lado. Não dá para pensar agora no carnaval fora de época, é comemorar antes da hora", disse.
"Um anúncio desse pode deixar uma mensagem errada, um sinal trocado de que já superamos, quando na verdade ainda não superamos. Os cuidados tem que ser mantidos e isso é a consciência de cada um, em relação a si próprio e ao risco de levar essa doença para outras pessoas. Ela ainda pode ser grave e com essa disseminação outras variantes podem surgir, e complicar ainda mais o cenário. É muito prematuro e é temeroso", completou.
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"É um anúncio absolutamente político, que não leva em consideração nenhuma evidência científica. Não temos bola de cristal para sabermos como estará a pandemia daqui a três meses, especialmente em relação ao comportamento da variante delta. Não sabemos se ela fará uma onda mais tardia de casos ou não. Também ainda não sabemos qual é o período de proteção oferecido pelas vacinas. São questões imprevisíveis, imponderáveis. Por isso, não se pode fazer qualquer anúncio com datas e hora marcada para o fim das medidas restritivas", afirmou o diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, Renato Kfouri.
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O médico e professor titular de epidemiologia da UFRJ, Roberto Medronho, também reafirmou o argumento e voltou a alertar sobre o nível desconhecido de proteção que as vacinas poderão oferecer contra a nova variante.
"Esse anúncio e, no mínimo, uma temeridade. Não estamos numa situação tão confortável assim. Temos a variante delta circulando no país e no Rio e não sabemos, ainda, o nível de proteção que as vacinas oferecem contra ela", ressaltou o médico.
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*Estagiária sob supervisão de Thiago Antunes