Alberto Júnior e o pai, Alberto MeyrellesArquivo Pessoal

Rio - Enquanto aguarda a soltura do filho no Presídio de Benfica, na Zona Norte do Rio, Alberto Meyrelles SantAnna, 60, criticou a prisão do filho e atribuiu as fragilidades do processo ao racismo estrutural. Alberto Júnior foi preso no último dia 17 com base no reconhecimento de uma foto 3x4 de uma CNH sua que havia sido roupada no dia do crime do qual é acusado. Estivador, ele é supervisor de uma empresa na Zona Portuária no Rio na qual trabalha de carteira assinada há 20 anos.
O pai de Alberto Júnior, Alberto Meyrelles (de boné), a esposa Karine Garcia (de vestido) e parentes aguardam soltura de estivador no Presídio de Benfica, Zona Norte do Rio - Marcos Porto/ Agência O DIA
O pai de Alberto Júnior, Alberto Meyrelles (de boné), a esposa Karine Garcia (de vestido) e parentes aguardam soltura de estivador no Presídio de Benfica, Zona Norte do RioMarcos Porto/ Agência O DIA
"Muito racismo. Se ele fosse loirinho de olhos verdes, com certeza não estaria aí. Teriam olhado o caso. A pessoa que reconheceu teria que voltar à delegacia. Bastou apontar o dedo pra acusá-lo como ladrão. Não teve investigação", criticou.
A Justiça determinou neste domingo a soltura de Alberto Júnior. A decisão é liminar e atende um pedido de habeas corpus da Defensoria Pública. 
O Tribunal de Justiça do Rio informa que estão sendo realizados os procedimentos para expedição do alvará, mas não é possível especificar uma previsão de horário. 
A mulher de Alberto Meyrelles Júnior, Karine Garcia, 38, nem dormiu essa noite. Grávida com quatro meses de gestação, ela recebeu a notícia por volta das 21h de domingo que o estivador preso há vinte dias por reconhecimento em uma foto 3x4 conseguiu um habeas corpus e deve ser solto nesta segunda-feira. A família aguarda a soltura no presídio de Benfica, Zona Norte do Rio, na manhã desta segunda-feira.
"Eu estou com uma emoção tão grande. Não vejo a hora do portão abrir e dele sair. Só quero estar com ele", conta Karine, que mora com Alberto há oito anos. Durante a prisão, a gestante foi amparada pela mãe e pela sogra na casa do casal em Realengo, Zona Oeste do Rio. "Todo mundo ficou preocupado com o neném. Estava no começo da gestação durante a prisão, essa semana entrei no quarto mês", conta.
O empresário Alberto Meyrelles SantAnna, 60, acordou às 4h nesta segunda-feira para sair de Del Castilho, Zona Norte do Rio, para receber o filho do lado de fora do presídio em Benfica, onde está desde as 6h30. Após sofrer uma taquicardia na semana passada, o empresário conta que está com o coração feliz.
"A defensora me ligou ontem à noite e falou que a desembargadora havia concedido o HC. Agora meu coração está bom. Hoje é só alegria. Não vejo a hora de pegar ele e levar para casa para ele descansar. Vinte dias aí é brabo, dentro de uma grade. Horrível. Todo mundo já viu que ele é inocente. Erro grave dessa Justiça. Não teria nem que ter sido preso. Sofrem amigos, família. Uma coisa horrível", contou o pai.
A defensora Isabel Schprejer espera que o alvará de soltura seja expedido e cumprido nesta segunda-feira.
"No pedido de habeas corpus, a gente ressaltou a situação do reconhecimento fotográfico, por foto 3x4 da CNH, de que ele foi vítima de assalto. Trata-se de uma pessoa com mais de 20 anos de carteira assinada. A empresa nos mandou uma declaração de que quer mantê-lo nos quadros caso ele seja solto. Ele continuou trabalhando mesmo com mandado. Não estava fugindo e foi preso na casa da mãe, muito próximo à casa dele, que tem residência comprovada e uma companheira gestante", contou a defensora sobre os argumentos utilizados pela defesa no processo.
O estivador trabalhava de carteira assinada há 20 anos no Cais do Porto. Ele foi preso no último dia 17 enquanto seguia de casa para a de sua mãe, há uma distância de cerca de 100 metros. Ao chegar, foi abordado e preso por policiais civis em uma viatura descaracterizada.

Segundo o inquérito policial, o documento de Alberto foi encontrado em um carro Toyota Corolla, mesmo modelo de veículo utilizado pelo grupo que o havia assaltado. A carteira de habilitação foi, então, apresentada pela polícia à mulher vítima do outro roubo, que o identificou como autor do crime apenas pela fotografia da CNH. Inicialmente, ela havia descrito o assaltante como uma pessoa "de cor negra, altura aproximada de 1,70m, cerca de 25 a 30 anos, gordo, sem barba, cabelo crespo". O acusado tem 1,80m e 39 anos.

Na época, Alberto registrou o assalto e chegou a mencionar o veículo e o extravio da CNH no boletim de ocorrência. No entanto, não houve desdobramentos na investigação do caso. Mas, quase sete meses depois, em 6 de novembro de 2019, foi instaurado inquérito para apurar as circunstâncias do assalto sofrido pela mulher e, por conta do reconhecimento fotográfico, Alberto passou a constar como suspeito.

O caso teve novo desdobramento em outubro de 2020, quando o Ministério Público do Rio de Janeiro (MRPJ) ofereceu denúncia e requereu sua prisão preventiva, pedido que foi acolhido pelo juízo da 1ª Vara Criminal de Bangu, com base, mais uma vez, apenas no reconhecimento feito através de imagem 3x4. A Justiça já havia negado seis pedidos de soltura no processo.