O juiz federal Marcelo BretasDivulgação / MPRJ

Rio - O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nesta terça-feira, a incompetência da 7ª Vara Criminal do Rio de Janeiro para julgar processos referentes à Operação Fatura Exposta. Por sete votos a um, os magistrados decidiram retirar o caso do juiz Marcelo Bretas, responsável pela vara. O colegiado acredita que os autos dos processos devem ser distribuídos livremente na Justiça Federal do Rio. 
Assim como ocorreu quando a 13ª Vara Federal de Curitiba foi declarada incompetente para julgar as ações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Operação Lava Jato, as decisões proferidas por Bretas no bojo da 'Fatura Exposta' foram anuladas - inclusive uma das condenações do ex-governador Sérgio Cabral, a 14 anos e 7 meses de prisão por propinas em contratos da Saúde do Rio.

A defesa do ex-mandatário considera até que a decisão do STF 'transcende as operações de saúde'. "Nos fundamentos, os ministros rechaçam as argumentações, até então, trazidas pelo MPF e pelo juiz Marcelo Bretas para fixação da sua competência em operações que não envolvam empreiteiras, como o caso da Eletronuclear, Operação Saqueador e Operação Calicute", diz a advogada Patricia Proetti, que defende Cabral (leia a íntegra da nota ao fim da reportagem).

O entendimento sobre a incompetência da 7ª Vara Federal Criminal do Rio sobre a 'Fatura Exposta' foi firmado no âmbito de habeas corpus impetrado pela defesa do empresário Miguel Iskin, investigado na Operação Ressonância - apuração sobre fornecimento de equipamentos médicos para o Rio de Janeiro - que já dividiu o banco dos réus com Cabral.

Os advogados pediam o reconhecimento da ilegalidade da criação de um 'juízo universal' para analisar as operações iniciadas pelo Ministério Público Federal fluminense. Além disso, a defesa sustentou ausência de conexão entre as Operações Calicute e Fatura Exposta para atrair a competência da 7ª Vara Federal Criminal do Rio sobre o caso.

O relator do habeas corpus, ministro Gilmar Mendes, acolheu os argumentos da defesa, em voto acompanhado pelos ministros Ricardo Lewandowski e Kassio Nunes Marques. Restou vencido o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, que ponderou que a atração em processos por conexão e a criação de varas especializadas para julgar determinados crimes não viola o princípio do juiz natural.

Em seu voto, Gilmar entendeu que não há conexão necessária entre as provas produzidas na Operação Calicute, ligada a crimes que envolvem a Secretaria de Obras, e a Operação Fatura Exposta, que mira crimes praticados na Secretaria de Saúde estadual e no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into). As informações foram divulgadas pelo STF.

O ministro citou trecho de parecer jurídico juntado aos autos que indica que supostos esquemas criminosos 'foram operados em repartições públicas distintas, por meio de funcionários públicos diferentes, para beneficiar conjuntos empresariais diversos (cartel de empreiteiras e cartel de empresas de saúde) e em certames com objetos distintos (licitações para reforma e construções de grandes obras públicas e aquisição de materiais médicos e próteses)'.

Segundo Gilmar, admitir uma conexão instrumental nos dois casos representaria afronta à regra fixada pelo Supremo em relação a grandes operações. Tal instrução entende que o estabelecimento de um juízo universal para apuração de desvios envolvendo propinas viola a garantia do juízo natural.

Na avaliação do decano, a única ligação entre as operações Calicute e Fatura Exposta é a colaboração premiada de Sérgio Romero, ex-subsecretário de Saúde do Rio. Assim, Gilmar considerou que o reconhecimento da competência da 7ª Vara, no caso, ofende outra regra consolidada pelo STF, de que a colaboração premiada como meio de obtenção de prova não constitui critério de determinação, modificação ou concentração de competência.
Lava Jato no Rio
Conhecido pela atuação na Operação Lava Jato no Rio, o juiz Marcelo Bretas foi acusado, em junho deste ano, de relevante parcialidade na condução dos processos da força-tarefa. Em um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR), o advogado criminalista Nythalmar Dias Ferreira Filho revelou que Bretas negociava penas, combinava estratégias e direcionava acordos com o Ministério Público durante a operação. As informações foram reveladas com exclusividade pela revista Veja.
Segundo a reportagem, Nythalmar apresentou a PGR um áudio no qual Marcelo Bretas conta sobre um acordo com o então coordenador da Lava Jato no Rio, Leonardo Cardoso, para 'aliviar' a pena do empresário Fernando Cavendish, ex-dono da Delta Construtora. O intuito do áudio era fazer com que o advogado convencesse o empresário a confessar o crime em troca da redução da pena. Na época, Nythalmar representava Cavendish. 
De acordo com o delator, nas vésperas das eleições de 2018 para o Governo do Rio, Marcelo Bretas vazou o depoimento de um ex-assessor do atual prefeito Eduardo Paes (PSD) que o acusava de envolvimento em fraude de licitações e recebimento de propina. Essa seria uma tentativa do juiz de prejudicar o então candidato a prefeito para apoiar o ex-governador do estado, Wilson Witzel. Nythalmar relatou, ainda, que Paes teria feito um acordo com Bretas e, caso fosse eleito, iria nomear a irmã do juiz para uma secretaria "em troca de não ser perseguido".