Rio - O Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF/RJ) recomendou, na sexta-feira (28), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a iniciar, imediatamente, a devolução de 15 girafas importadas ilegalmente da África do Sul pelo Zoológico do Rio de Janeiro (BioParque). Além de maus tratos, o Ibama apontou ainda uma possível importação ilegal das 18 girafas. Segundo os fiscais do órgão ambiental, o próprio documento de autorização registra que os animais são oriundos de vida livre ("specimens taken from the wild"), o que torna a importação ilegal, uma vez que a legislação brasileira proíbe a importação de espécies ameaçadas nessas condições.
O MPF também recomendou ao presidente e ao diretor de Uso Sustentável da Biodiversidade e Florestas (DBFLO) do Ibama que suspendam o andamento de todos os processos de importação de animais da fauna exótica ainda não concluídos, até que haja a revisão dos protocolos administrativos internos de emissão de autorizações. Segundo apurou o MPF, além das girafas, o BioParque do Rio já havia iniciado os procedimentos para importação de 18 impalas (Aepyceros melampus) e 15 zebras (Equus quagga), também da África.
O MPF também notificou o BioParque a informar, no prazo de 48 horas, a data de início e conclusão das obras de adequação da área onde se encontram provisoriamente as girafas, de forma a garantir o pleno bem-estar e saúde dos animais.
Fiscais do Ibama e agentes da Polícia Federal estiveram no Hotel, na última quarta-feira (26), e constataram a ocorrência do crime de maus tratos contra os animais. Dois representantes do BioParque foram conduzidos à Superintendência da Polícia Federal. O BioParque também foi multado e sofreu embargo do Ibama, que proibiu o recebimento de novos animais no RioZoo até que todos os recintos de animais tenham o devido "habite-se" expedido pelo órgão ambiental competente.
Parecer Técnico do Ibama
O Parecer Técnico, elaborado pela equipe de fiscalização do Ibama, que concluiu que "a morte dos animais é a consequência trágica de uma série de erros processuais" nos quais os agentes do Ibama envolvidos na autorização para importação "não atuaram de forma a preservar o maior interesse público e ambiental (...). [P]revaleceram os interesses particulares, com base econômica, disfarçados, porém, de medida conservacionista calcada em um projeto falho e fraco de conservação. Houvesse as análises considerado a legislação nacional vigente e, também, questões técnicas da biologia da conservação, os animais não teriam sido importados e, consequentemente, três deles não viriam a óbito".
Os fiscais do Ibama também registraram que "a fuga, seguida de morte, desnudou a imperícia na construção do recinto [onde se encontram presas, em Mangaratiba] e demonstrou que aqueles que pretendem contribuir com a conservação da espécie não possuem a competência sequer de conseguirem conter adequadamente e em segurança os animais. O fato não está sujeito a discussão, a fuga das girafas e a morte de três delas argumentam por si contra qualquer explicação".
Procurado, o BioParque do Rio esclareceu algumas denúncias que estavam sendo analisadas pelo MPF. Confira a nota na íntegra:
"O BioParque do Rio reitera sua absoluta responsabilidade com o manejo de fauna e com projetos de longo prazo de restauração da natureza, amparados em educação, pesquisa e conservação de espécies. Não há maus-tratos a animais. O manejo ex situ de espécies é uma importante ferramenta complementar de conservação da biodiversidade e a ele foi dedicado o artigo 9º da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB), assinado pelo Brasil em 1992.
Diante do cenário, o BioParque do Rio informa:
— Sobre a liminar do MPF, a empresa, por meio de seu corpo jurídico, está analisando a decisão para adotar os caminhos legais cabíveis. É importante ressaltar que a empresa possui todas as licenças necessárias e que atende a regulamentação aplicável, conforme demonstrará em juízo;
— Quanto ao laudo de necropsia da morte das girafas, o documento foi entregue às autoridades competentes. O INEA pediu esclarecimentos técnicos e o BioParque do Rio solicitou a ampliação do prazo das respostas, que já estão sendo elaboradas para serem enviadas ao órgão;
— O grupo de girafas veio de uma reserva autorizada para manejo sustentável e desenvolvimento comunitário com essas espécies na África do Sul. Como os animais são oriundos de tal local, o código determinado pela Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites) é W. Em qualquer exportação que ocorra, para qualquer lugar no mundo, a Cites sempre irá atribuir a sigla W em casos específicos de animais oriundos de reservas de manejo sustentável. A instituição foi devidamente aprovada pelos órgãos competentes brasileiros e sul-africanos e não há ilegalidade no processo de importação que foi aprovado pelos dois governos;
— O BioParque do Rio reforça ainda que, ao contrário do que sugerem denúncias, os animais não sofrem maus-tratos. O parque conta com uma equipe dedicada às girafas, formada por sete especialistas no manejo dessa espécie, entre veterinários, biólogos e zootecnista. Os indícios apontados como sendo maus-tratos de forma alguma caracterizam tal situação. Os animais têm fichas de acompanhamento diário nas quais constam informações sobre condutas comportamentais naturais, atividades de enriquecimento, relações positivas com os tratadores, a própria relação entre elas, além de ganho de peso e desenvolvimento corpóreo. A área total das girafas no Portobello Safari é de aproximadamente 44mil m². Existem quatro estágios para a adaptação dos animais: 1) cambiamento (ambiente controlado para o manejo) 2) acesso ao solário 3) recinto de manejo 4) recinto de 44mil m². A evolução dos estágios de adaptação dos animais leva em consideração o seu comportamento adaptativo e alinhamento com os técnicos do IBAMA e INEA;
—As girafas estão classificadas na categoria vulnerável pela lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e ter animais em outro continente é uma estratégia de preservação importante, a exemplo de outras espécies emblemáticas que foram salvas por projetos semelhantes: mico-leão-dourado e ararinha-azul. As girafas seguem um Programa de Conservação. Parte dos animais ficará em Portobello, parte irá para o BioParque do Rio e alguns indivíduos irão, conforme estudos de análise genética, para outras instituições parceiras que possuem girafas, conforme a evolução do programa de conservação integrada, sempre visando o bem-estar dos animais;
—Por fim, transformar o propósito da conservação em realidade é uma jornada longa, de mais de 40 anos. Além do programa de conservação das girafas, o BioParque do Rio participa de vários programas de pesquisa e conservação e está à frente de um estudo nacional em biotecnologia para conservação de onças-pintadas. A concessionária também participa de um projeto com guarás-vermelhos, que estiveram presentes na Baía de Guanabara há quase 100 anos e que estão passando por uma pesquisa para viabilizar a sua reintrodução na natureza. Ainda há outros projetos de destaque, como a reintrodução das araras-canindés no Parque Nacional da Tijuca, a instalação de um Centro de Conservação de Carnívoros para apoio aos órgãos ambientais no resgate, recuperação de espécies ameaçadas, sempre trabalhando alinhado e em parceria com diversas instituições de pesquisa e órgãos ambientais."
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