Crônica - É preciso mergulhar Arte/Kiko
É preciso mergulhar...
Era possível sentir o mar bem próximo de mim. Reparei ainda numa criança pulando diante da tela como se quisesse alcançar uma das embarcações
Acordei na hora certa para o meu compromisso e logo pulei da cama. Era o último dia de março deste ano que já parece voar. Fui para a cozinha e, enquanto preparava o café, simulei no aplicativo o trajeto de Caxias, na Baixada Fluminense, até o Centro do Rio. Estava lá a previsão: 1h20, com alguns pontos de congestionamento. Eu já sabia, mas, após dois anos de trabalho em casa, me desacostumei com a rotina de ir de carro para a capital nesses horários mais movimentados. É incrível como a gente perdeu referências da vida pré-pandemia.
Percebi, então, que não tinha tempo a perder. Queria chegar antes, com calma. E sabia que poderia ter imprevistos na Linha Vermelha. Assim, tomei banho, mudei de roupa e dispensei o ritual de secar o cabelo e também a pouca maquiagem que costumo usar.
Quando saí de casa, o horário estava contadinho para eu chegar ao Centro às 10h, a tempo de conferir a exposição 'Monet à beira d'água'. Realmente, havia trechos de lentidão na via expressa. Cheguei à Rua Venezuela, de carro, e logo avistei a tenda montada para o evento. Rodei o quarteirão em busca de uma vaga, mas em três estacionamentos a resposta era a mesma: "Lotado!" Enquanto isso, o relógio rodava... Até que consegui vaga na quarta tentativa. Ufa!
Aí foi só atravessar a rua e entrar finalmente na tenda, com alguns minutos de atraso. Mostrei o ingresso, o comprovante de vacinação e pronto! Após a agitação de conferir o relógio a todo instante, ouvi as orientações ao lado da minha amiga Tainara, que tinha ido de moto: "Vocês podem fotografar, filmar, sentar, deitar..." Chegava, enfim, a hora de embarcar no universo impressionista do pintor francês.
Logo no primeiro ambiente da exposição, entendi por que ela é chamada de imersiva. Ao olhar para o piso, refletindo a imagem dos visitantes, perdi um pouco a referência de onde estava. Afinal, havia acabado de sair do asfalto. E a viagem do concreto para o abstrato é sempre mágica para mim.
Pouco a pouco, as imagens, aliadas aos sons, me fizeram entrar no clima do ambiente em que paisagens do pintor são animadas e projetadas em painéis de mais de 7 metros de altura. Era possível sentir o mar bem próximo de mim. Reparei ainda numa criança pulando diante da tela como se quisesse alcançar uma das embarcações. E, lembrando as orientações na entrada, eu e a Tainara deitamos e lançamos o nosso olhar para o alto.
Em outro momento, reparei nas silhuetas dos visitantes que se formavam nos painéis. Afinal, sou fascinada pelo subentendido, que dá espaço para a imaginação. Dava para deduzir que uma menina posava para uma foto, uma criança era carregada nos ombros de um adulto e alguém erguia o celular para uma selfie.
Assim, durante uma hora, eu imergi num mundo bem diferente do que eu havia deixado lá fora. E conheci também um mergulho de onde saímos com o respiro necessário para voltar à superfície da realidade.
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