Prefeito Eduardo Paes durante coletiva de "VLTzação"Beth Santos / Divulgação Prefeitura do Rio
Paes anuncia plano de transformação do BRT em VLT e expansão por toda a cidade; especialistas veem ideia como 'audaciosa'
Chamado de "VLTzação", projeto tem prazo de 15 anos. 'Questão de mobilidade precisa perpassar governos', disse o prefeito em coletiva; Implantação na Zona Sul desponta como desafiadora
Rio - O prefeito Eduardo Paes (PSD-RJ) apresentou um projeto, nesta quinta-feira (7), que promete revolucionar o sistema de transporte carioca. A "VLTzação", como foi batizado, objetiva implementar uma malha de veículos leves sobre trilhos no lugar dos ônibus do BRT e em várias partes da cidade em um prazo de 15 anos. O plano inicial prevê aproveitamento da infraestrutura do corredor de ônibus e restrição quase total de importantes vias para carros. Especialistas ouvidos pelo DIA se dizem favoráveis, mas chamam atenção para a dificuldade na execução da proposta.
Na implantação do projeto, o Rio de Janeiro passaria a ter 251 km de malha de VLT, a maior das Américas, e estimativa de 500 mil usuários por dia. Com previsão de conclusão em até 15 anos, Paes defendeu que mobilidade pública precisa ser uma política de Estado, e não de governo. "Não adianta eu estar aqui e amanhã chegar outro e mudar tudo. É preciso pensar no que é melhor para o povo carioca", disse, durante coletiva no Palácio da Cidade.
Segundo o prefeito, toda estrutura já existente do BRT será utilizada, o que, tratando-se de Transcarioca e Transoeste, representaria uma economia de R$ 7 bilhões. Os dois projetos, também somados, têm investimento estimado em, aproximadamente, R$ 15 bilhões. A previsão, pelo cronograma, é de início dos estudos no primeiro semestre do ano que vem. Já a licitação e início da implantação ficariam para o segundo semestre de 2023. No entanto, o processo não será rápido: já estão encomendados novos ônibus para o BRT, que serão, posteriormente, substituídos pelos trens.
Também estão nos planos a construção do Terminal Gentileza, na Zona Portuária do Rio, que fará integração com BRT Transbrasil, 2 linhas de VLT e 22 ônibus municipais.
A provável parte mais complicada do projeto e que promete levantar polêmicas é a implantação de VLT na Zona Sul e transformações de importantes vias, como a Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo, em um grande Boulevard, com acesso muito reduzido de carros, como ocorre no Boulevard Olímpico, no Centro. A expectativa é que o VLT ligue as estações do metrô de Botafogo até a Gávea, que está inacabada.
Durante entrevista com jornalistas, Paes disse não ligar para as críticas que sabe que irá receber. "Muita gente me xingou, quando do derrubamento da Perimetral. Hoje, essas mesmas pessoas curtem os benefícios que só essa ação foi capaz de causar", afirmou. O VLT Botafogo-Gávea tem previsão de edital de licitação no segundo semestre deste ano, início da implantação no primeiro de 2023 e início de operação no primeiro de 2025. O investimento é orçado em R$ 1,3 bilhões, via PPP (Parceria Público-Privada).
Questionados pela reportagem do DIA, especialistas acreditam que o projeto direciona a cidade para um caminho de outros bem sucedidos centros mundiais na questão dos transportes, mas alertam quanto às dificuldades de execução e o cuidado para não repetir velhos erros de gestão.
Ronaldo Balassiano, professor da Coppe-UFRJ, se diz contente com sobre o ponto de vista de conquistas para a população — que vão de aspectos climáticos, como a necessidade do menor uso de veículos à base de combustível fóssil, à importância do tempo de viagem. "Em transportes assim, você tem mais capacidade de gerir melhor a cronologia. Se está marcando que o trem chega em 5 minutos ou sai da estação às 16h33, você tem a certeza que vai ser aquilo ali. Nos ônibus, nos BRTs, inúmeros outros fatores podem fazer de uma viagem de 30 minutos durar 3 horas. Tempo é qualidade de vida", pontuou.
Professor da FGV, Marcus Quintella, vê o contexto com mais preocupação. Ele afirma que a ideia é louvável, necessária, mas de execução "audaciosa". "É preciso que se estude muito bem estudado. Não podemos reviver os transtornos para a população e para o comércio que foi a construção do metrô do Catete. É preciso que haja muito cuidado da implantação até a operação. Imagina, por exemplo, que uma obra dessa magnitude em uma via como a (Rua) São Clemente começa e, sem mais nem menos, é paralisada e não acaba? Viveremos o caos na cidade. Precisa haver o mínimo possível de intervenção com o máximo objetividade", defende.
Outro ponto convergente entre os professores é a necessidade de apender com os erros do BRT. Ambos defendem que será mais que necessário que o Estado impeça que as paradas do VLT tenham o mesmo destino dos ônibus, com estações tomadas por pessoas em situação de rua, do crime organizado, depredadas e inseguras. "Não é porque mudará o tipo de transporte que os problemas desaparecerão, como em um passe de mágica. Se não forem bem mantidas, cairemos nos mesmos erros", afirmam.
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