Rio - Planilhas encontradas em aparelhos telefônicos apreendidos na casa do contraventor Rogério Andrade, durante a Operação Calígula, realizada há três meses pelo Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), apontam um grande esquema de pagamento de propina para delegacias e batalhões da PM do Rio de Janeiro. O MPRJ afirma que há indícios desses valores serem direcionados ao controle do Jogo do Bicho.
De acordo com o Tribunal de Justiça, por meio da 1º Vara Criminal Especializada do Rio, as propinas passavam de R$ 750 mil e eram enviadas às seguintes delegacias e batalhões: 41ªDP (Tanque), 32ªDP (Taquara), 28ªDP (Praça Seca), 42ªDP (Recreio dos Bandeirantes), delegacias da Mulher (Deam), de Defraudações, Homicídios, Combate às Drogas (Decod), Crimes de Informática (DRCI), de Apoio ao Turismo (Deat) e de Atendimento ao Idoso, 9º BPM (Rocha Miranda), 18º BPM (Jacarepagua) e 31º BPM (Recreio dos Bandeirantes).
Em uma outra planilha, é possível ver que o esquema milionário detalhava os gastos com segurança, despesas operacionais, cestas básicas, hospital, entre outros.
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Ainda segundo as investigações, essas planilhas são de períodos anteriores, que não dizem respeito às atuais gestões dos órgãos de Segurança Pública citados.
Na decisão do TJRJ sobre o inquérito enviado pelo MPRJ, o juiz Bruno Monteiro Rulière escreveu que estas planilhas não poderiam passar despercebidas nas investigações.
"Não pode passar despercebido do juízo que novos dados produzidos reforçam a possibilidade de um gigantesco esquema de corrupção envolvendo a suposta organização criminosa denunciada. Os novos elementos de prova conferem mais robustez aos indícios de um alinhamento espúrio da suposta organização criminosa com diversas unidades de órgãos responsáveis pela Segurança Pública do Estado. Nas planilhas constam apontamentos de pagamentos (indicados pela os a diversos órgãos da Polícia Civil e Polícia Militar do Estado que, em tese, deveriam atuar na repressão aos crimes", afirmou o magistrado em sua decisão.
Procurada, a Polícia Militar informou que todas as denúncias encaminhadas pelo Ministério Público relativas à Operação Calígula serão apuradas pela Corregedoria Geral da Polícia Militar (CGPM), através de Inquérito Policial Militar (IPM) e Procedimentos Administrativos Disciplinares (PAD). Em nota, a corporação ressaltou ainda que a CGPM vem prestando integral apoio no processo investigatório liderado pelo MP.
A Polícia Civil foi questionada pela reportagem sobre as planilhas, mas até o momento não obteve resposta.
Em nota ao DIA, a defesa de Cipriano negou que as planilhas estivessem com o delegado e que só se manifestará após ter acesso aos documentos.
Bilhete com supostas propinas
Conforme o DIA publicou no último dia 4, também foi encontrado pela Polícia Civil uma folha de caderno com anotações em caneta sobre os pagamentos das propinas feitas para delegacias e batalhões. O papel foi apreendido durante a prisão do seu filho, Gustavo de Andrade e Silva, em Petrópolis, também no dia 4 de agosto. Andrade também estava no local e foi conduzido para a sede da Polícia Federal, onde recebeu voz de prisão.
Na folha, apresentada à Justiça com o pedido da prisão, está escrito: "Xiquinho passou que a Deac Centro (Delegacia de Acervo Cartorário), Deac Especializada e Deam Centro (Delegacia de Atendimento à Mulher), querem o retorno da merenda delas (tinha parado a pedido das próprias unidades)". Xiquinho, segundo o MP, seria um homem subordinado a Rogério; merenda seria gíria para propinas.
Operação Calígula
A Operação Calígula foi deflagrada no dia 10 de abril deste ano e mirou uma organização criminosa entorno do jogo do bicho liderada por Rogério de Andrade e seu filho, Gustavo de Andrade. O grupo tem como membro Ronnie Lessa, preso no Presídio Federal de Campo Grande pela execução da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes. Policiais civis estiveram entre os alvos. Entre eles estão: a delegada Adriana Belém, o delegado Marcos Cipriano, e outros dez agentes.
Segundo as denúncias, Rogério e Gustavo de Andrade comandam uma estrutura criminosa voltada à exploração de jogos de azar não apenas no Rio de Janeiro, mas em diversos outros estados, fundamentando-se em dois pilares: a permanente corrupção de agentes públicos e o emprego de violência contra concorrentes e desafetos. A organização é suspeita da prática de homicídios.
Entre os agentes públicos corrompidos estão agentes da Polícia Civil e da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Os integrantes do grupo mantinham contatos permanentes com policiais civis com pagamento de propinas. Por outro lado, oficiais da PMERJ serviam de elo entre a organização e batalhões, que recebiam valores mensais para permitir o livre funcionamento das casas de aposta do grupo.
Em um destes episódios, segundo a denúncia, o delegado de polícia Marcos Cipriano intermediou um encontro entre Ronnie Lessa e a delegada Adriana Belém e seu braço-direito, o inspetor Jorge Luiz Camillo. A reunião resultou em um acordo que viabilizou a retirada em caminhões de quase oitenta máquinas caça-níquel apreendidas em casa de apostas. O pagamento foi providenciado por Rogério de Andrade.
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