Rogério de Andrade é apontado como líder, ao lado do filho, de rede criminosa Arquivo / o Dia

Rio - A Operação Calígula deflagrada, nesta terça-feira (10), mira uma organização criminosa entorno do jogo do bicho liderada por Rogério de Andrade e seu filho, Gustavo de Andrade. O grupo tem como membro Ronnie Lessa, preso no Presídio Federal de Campo Grande pela execução da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes. Policiais civis estão entre os alvos. Na casa da delegada Adriana Belém, foi apreendida grande quantia de dinheiro. Até o momento, foram contabilizados R$ 1,2 milhão em espécie, mas o valor chegaria a quase R$ 2 milhões.
Além dessa quantia, os agentes apreenderam ainda R$ 48.251,20, US$ 2.200, 4420 pesos argentinos, 70 pesos uruguaios, todos em espécie, e R$ 3.800 em cheque. A ação cumpre 29 mandados de prisão e 119 mandados de busca e apreensão. Até o momento, o delegado da Polícia Civil, Marcos Cipriano, e outros dez foram presos. Rogério e o filho são procurados. 
Quatro bingos comandados pela organização foram estourados e também foram apreendidos 107 máquinas  caça-níqueis, 17 aparelhos de celular, cinco notebooks, um HD e um pen drive, diversos documentos, pendrive, chips, máquinas de cartão, cópias de processos e componentes eletrônicos.
Ao todo, foram denunciadas trinta pessoas, pelos crimes de organização criminosa, corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A operação foi fruto de investigação da Força Tarefa do Gaeco para o caso Marielle e Anderson, do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. 
No total, 12 pessoas foram presas na Operação Calígula, 24 pedidos de prisão foram expedidos, 119 mandados de busca e apreensão foram cumpridos e 30 pessoas foram denunciadas.
Segundo as denúncias, Rogério e Gustavo de Andrade comandam uma estrutura criminosa voltada à exploração de jogos de azar não apenas no Rio de Janeiro, mas em diversos outros Estados, fundamentando-se em dois pilares: a permanente corrupção de agentes públicos e o emprego de violência contra concorrentes e desafetos. A organização é suspeita da prática de homicídios.

Entre os agentes públicos corrompidos estão agentes da Polícia Civil e da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Os integrantes do grupo mantinham contatos permanentes com policiais civis com pagamento de propinas. Em contrapartida, o grupo liderado por Rogério Andrade. Por outro lado, oficiais da PMERJ serviam de elo entre a organização e batalhões, que recebiam valores mensais para permitir o livre funcionamento das casas de aposta do grupo.

Em um destes episódios, segundo a denúncia, o delegado de polícia Marcos Cipriano intermediou um encontro entre Ronnie Lessa e a delegada Adriana Belém e seu braço-direito, o inspetor Jorge Luiz Camillo. A reunião resultou em um acordo que viabilizou a retirada em caminhões de quase oitenta máquinas caça-níquel apreendidas em casa de apostas. O pagamento foi providenciado por Rogério de Andrade.
No apartamento da delegada Adriana Belém foram apreendidos quase R$ 2 milhões em espécie. A quantia estava alocada em bolsas de sapato de marcas de luxo. O condomínio de luxo da policial na Barra da Tijuca foi alvo de busca e apreensão.
Também foi denunciado o policial civil aposentado Amaury Lopes Junior, elo do grupo com diversas delegacias. O inspetor de polícia Vinícius de Lima Gomez foi apontado como receptor de propinas, agindo em favor de integrantes do alto escalão da PCERJ.
A parceria entre Rogério de Andrade e Ronnie Lessa é apontada nas denúncias como antiga, havendo elementos de prova de sua existência ao menos desde 2009, quando Ronnie perdeu uma perna em atentado à bomba que explodiu seu carro. Ele já atuava como segurança do contraventor. Em 2018, ano da morte de Marielle Franco e Anderson Gomes, os dois denunciados se reaproximaram e abriram uma casa de apostas no Quebra-Mar, na Barra da Tijuca. Segundo os investigadores, elementos indicavam a previsão de inauguração de outras casas na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
O bingo financiado por Rogério de Andrade e administrado por Ronnie Lessa, Gustavo de Andrade e outros comparsas foi fechado pela Polícia Militar no dia de sua inauguração. No entanto, as máquinas apreendidas foram liberadas e a casa foi reaberta após atos de corrupção com policiais civis e militares.
Então titular da 16ª DP, Belém deixou o comando da delegacia após prisão de seu braço-direito, o chefe de Investigação da distrital, o inspetor Jorge Luiz Camillo Alves, na operação Os Intocáveis II - Reprodução / Instagram
Então titular da 16ª DP, Belém deixou o comando da delegacia após prisão de seu braço-direito, o chefe de Investigação da distrital, o inspetor Jorge Luiz Camillo Alves, na operação Os Intocáveis IIReprodução / Instagram
Braço-direito de Adriana era "Amigo da 16"
Adriana Belém entregou a titularidade da 16ª DP em janeiro de 2020, durante a operação Intocáveis II, também do Gaeco do MPRJ. Na ocasião, seu braço-direito Jorge Luiz Camillo e o inspetor Alex Fabiano Costa de Abreu foram presos por atuarem contra investigações que envolviam a milícia do Rio das Pedras e Muzema, na Zona Oeste do Rio. 
A ligação do chefe de investigação da 16ª DP com o grupo paramilitar era tão grande que ele era conhecido como o "Amigo da 16" pelos criminosos. O policial foi flagrado em várias conversas com o PM reformado Ronnie Lessa.
Rogério disputa espólio de Castor de Andrade
Rogério de Andrade é sobrinho de Castor de Andrade, que dominava o jogo do bicho entre as décadas de 1970 e 1980. A partir da morte do patrono, em 1997, Rogério e o genro de Castor, Fernando Iggnácio, disputavam o espólio do patriarca na Zona Oeste do Rio. Fernando Iggnácio foi assassinado em novembro de 2020 e a Justiça chegou a mandar prender Rogério, que é patrono da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel. O Supremo Tribunal Federal, no entanto, suspendeu a ação penal em fevereiro deste ano.
A defesa de Rogério de Andrade afirma que a operação não deixou demonstrado a necessidade da prisão cautelar. "Se mostra claramente uma afronta ao STF que acaba de conceder o trancamento de uma ação penal contra ele. Isso vem ocorrendo desde juízes como o De Sanctis, Marcelo Bretas e Sérgio Moro, que tentam burlar as decisões do STF", afirma o advogado Ary Bergher.
Em nota, a Polícia Civil informou que os delegados alvos da operação não têm cargos na Polícia Civil atualmente. "Adriana Belém está afastada de licença e Cipriano trabalhando em outra instituição. A Corregedoria solicitará acesso às investigações para dar andamento aos processos administrativos necessários", diz o texto.