Imagens em homenagem a São Cosme e Damião são vistas por todo o Mercadão de MadureiraFotos de Júlia Belloube/Agência O Dia

Rio - Dois dias de homenagem celebram o Cosme e Damião: segunda (26) e nesta terça-feira (27). Considerados pela Igreja Católica e religiões de matriz africana como santos protetores das crianças, a tradição da data destinada aos irmãos gêmeos continua. Mesmo em meio à crise financeira e aumento do preço dos produtos, o costume de distribuição de doces permanece forte.


A segunda-feira do Mercadão de Madureira, na Zona Norte do Rio, foi de grande movimento e procura por doces. Devotos de São Cosme e São Damião aproveitaram a véspera da celebração para garantir as guloseimas a serem oferecidas às crianças.

Há 36 anos, Neuza Catarina Souza, de 58 anos, faz a alegria da criançada no Engenho de Dentro. Tudo começou por um motivo especial: o desejo de ter uma menina. Depois de dar à luz a três meninos, fez uma promessa a São Cosme e Damião e, meses depois, sua filha nasceu. Mas, agora, o motivo não é mais a promessa. "Eu gosto mesmo é de fazer a felicidade das crianças. Elas gostam tanto. E elas estando felizes, nós estamos também”, contou a diarista.

No entanto, Neuza disse que, apesar de adorar a tradição, teve que diminuir o volume das compras. "Esse ano tá tudo muito caro, um absurdo. E isso está impactando na quantidade, estou reduzindo os itens. Não tem condição de ser como antigamente. Antes, eu fazia 200 saquinhos. Agora, vou fazer 50. Até a quantidade de criança diminuiu bastante", alegou.

Gerente da Big 2000 Doces há 23 anos, Anselmo Henrique Dias, de 77 anos, contou que, apesar da crise, o movimento na loja foi maior do que em 2021. "Hoje as vendas estão andando relativamente bem. Em relação ao ano passado, está melhor. O preço das coisas não aumentou muito não, cerca de 5%. Alguns produtos aumentaram, outros mantiveram os valores", afirmou Anselmo.

Anselmo disse que, além de comandar a loja, também distribui guloseimas para a molecada. Por isso, ele vê o movimento da tradição dentro e fora do estabelecimento. "Eu faço isso tem cinco anos devido à uma promessa da minha esposa, que ela nunca me disse qual é. Apesar de ainda vermos muita criança, é diferente do meu tempo. Na minha época, tinha mais gente na rua. Agora a distribuição e as vendas são maiores no Dia Das Crianças", explicou o gerente.
Já Cátia Maria de Paula, de 55 anos, distribui os doces há seis anos em Turiaçu, depois de fazer promessa para uma grande conquista: conseguir tirar a carteira de motorista. Passado o juramento, a tradição se manteve e hoje ela divide as despesas dos 100 saquinhos de doces com a filha, devido à alta dos preços. "A gente não consegue mais distribuir como antes. Tudo aumentou. Antigamente dava-se bem mais coisa, como brinquedos. Antes, comprava-se um pacote de bala e vinha um quilo. Agora, eles diminuíram a quantidade de bala pra em torno de 500 e 700 gramas e aumentaram o preço", desabafou a dona de casa.

Mãe de dois filhos, Fabiane da Fontoura, de 42 anos e moradora de Bento Ribeiro, contou que este é o terceiro ano que faz a tradição. Ela disse que fez promessa de distribuir doces por no mínimo sete anos, caso o filho passasse na prova da Escola Preparatória de Cadetes do Ar (EPCAR). Hoje, o rapaz está cursando o segundo ano na instituição de ensino militar. "Ele fez a prova no dia de São Cosme e Damião. É uma conquista enorme para nós", comemorou Fabiane.

Ela disse, ainda, que mais do que pela promessa, ela dá as guloseimas pela necessidade que as crianças passam nas ruas. "A quantidade de crianças está aumentando bastante. Cada vez mais nós vemos crianças em situação de rua. Querendo ou não, esses docinhos fazem uma alegria e um alívio, porque o nível de pobreza no nosso país é enorme. Nós distribuímos na rua, mas geralmente ando pouco, porque quando coloco o pé para fora de casa, já tem criança", disse a dona de casa.

Elizabeth Paulino da Cruz, de 53 anos, contou que a tradição da distribuição de doces começou com a mãe, que hoje tem 84 anos, mas ainda dá saquinhos na porta de casa, na Cidade de Deus. "Não falta criança. Ano passado, eu achei que tinham poucas. Mas esse ano eu já estou comprando mais doces, porque acho que vai ter bastante gente. Eu faço 150 saquinhos e no mesmo dia vai tudo embora. O que importa é deixar a criança feliz e brincar. No Dia das Crianças, eu faço um bolo bem grande também. E é uma briga, porque o bolo é uma delícia", afirmou a doméstica.

A história de São Cosme e São Damião

Irmãos gêmeos e médicos, Cosme e Damião exerciam a profissão sem nenhum custo para a população da Egeia, na Ásia menor. Missionários, foram perseguidos pelo imperador romano Diocleciano. Eles foram acusados de serem inimigos dos deuses romanos e usar feitiçaria para disfarçar as curas, e por volta de 300 d.C, foram decapitados. Na celebração católica, o dia dos santos é 26 de setembro.

Nas religiões de matriz africana, os irmãos representam os orixás Ibejis e a comemoração ocorre em 27 de setembro. Também gêmeos, as divindades resolviam os problemas levados a eles e em agradecimento, recebiam brinquedos e doces. Algumas religiões ainda acreditam que eles tinham um trigêmeo, chamado Doum, que teria morrido ainda criança. Assim, os outros irmãos se tornaram médicos para curar a todas as crianças, de forma gratuita. Doum é considerado o protetor das crianças de até 7 anos.

Este ano, a Paróquia São Cosme e Damião, no Andaraí, Zona Norte do Rio, conta com dois dias de celebrações: dia 26, com missa às 6h, 8h, 10h, 12h, 14h, 16h e 19h, com barraca de doces e salgados e dia 27, com missa de hora em hora, entre 6h e 20h.

Além disso, membros do Instituto Expo Religião farão distribuição de doces neste dia 27, às 11h para as crianças da Barreira do Vasco e Tuiuti. Será na Rua Dulce Rosalina - 09, em São Cristóvão. O Expo Religião conta com as religiões Católica, Umbanda, Ifá, Hare Krishna, Wicca, Xamanismo, Catimbó e Fé Bahá'i , Espiritismo e Judaísmo.