José Henrique da Silva, conhecido como "Zé Careca", de 53 anos, foi morto durante operação da PM e Polícia Civil no Complexo da MaréReprodução/Facebook

Rio - "Eles acham que todo mundo ali é traficante". A frase dita pela mulher de José Henrique da Silva, conhecido como 'Zé Careca', de 53 anos, durante o enterro do barraqueiro, na tarde desta quarta-feira (28), no Cemitério do Caju, Zona Portuária, reflete a dor e a revolta da família. O morador da Maré foi um dos sete mortos durante ação feita pelas forças de segurança, na segunda-feira passada (27), no interior das comunidades que integram o complexo.

A mulher, que não quis ser identificada, explicou que o marido foi assassinado quando estava indo encontrá-la. "Ele montava a barraca, voltava para casa para descansar e vinha de manhã para nos ajudar a tirar tudo. Ele deve ter escutado tiro e, como sabe que fico nervosa, foi para ficar comigo. Não deu tempo do meu marido chegar até mim", lamentou a viúva.
José Henrique da Silva, conhecido como "Zé Careca", de 53 anos, foi morto durante operação da PM e Polícia Civil no Complexo da Maré - Reprodução/Facebook
José Henrique da Silva, conhecido como "Zé Careca", de 53 anos, foi morto durante operação da PM e Polícia Civil no Complexo da MaréReprodução/Facebook


O sepultamento de Zé Careca foi acompanhado por cerca de 50 pessoas, entre familiares e amigos que também moram no Complexo da Maré. Segundo a viúva, ele era um homem trabalhador e foi morto como se fosse um criminoso.

"A gente mora em comunidade e eles acham que todo mundo é traficante. A gente mora ali porque não tem condições de morar em um lugar melhor. (...) Ele é trabalhador, aposentado, nunca se envolveu com ninguém ali de dentro. Eles entram e não perguntam quem é bandido, quem não presta. Viram ele na moto atiraram e perguntaram depois", disse a mulher .
A viúva diz que o casal, juntamente com as duas filhas, mantinha o negócio da venda de bebidas e petiscos durante os eventos na comunidade para complementar a renda e ajudar no tratamento de animais resgatados. "Nós precisamos trabalhar para manter nossos bichinhos, por isso estávamos lá", comentou.
O barraqueiro morreu antes mesmo de receber socorro. Além dele, outras seis pessoas, apontadas como suspeitas, também morreram durante a ação. Durante a operação de emergência que, segundo a PM, tinha por objetivo impedir uma tentativa de invasão, 15 pessoas também ficaram feridas.
Tragédia anterior
A família de Zé Careca já havia passado por drama parecido em 2005, quando um dos filhos do barraqueiro foi morto a tiros dentro da Maré. O adolescente, de 16 anos, era estudante e soltava pipa em uma rua da comunidade. Segundo relato dos familiares, ele foi abordado por PMs, obrigado a deitar no chão e atingido.

A violência que atinge a Maré voltou a encontrar Zé Careca em 2018. No ano em questão, o barraqueiro foi testemunha da morte do menor Marcus Vinicius Silva, de 14 anos, atingido quando ia para a escola na comunidade. O adolescente foi morto após ser baleado na barriga, no mesmo momento em que forças segurança realizavam operação no complexo de favelas.

O barraqueiro estava convocado para depor sobre o ocorrido na Delegacia de Homicídios no próximo dia 3 de outubro. A investigação do caso que aconteceu há quatro anos segue sem novidades e ainda não foi encaminhado para a Justiça. 

A mãe de Marcus, Bruna da Silva, foi a primeira pessoa a encontrar o corpo de Zé. Segundo relato de parentes, a barraca da família funcionava durante bailes e eventos no interior da comunidade, com a venda de bebidas e petiscos.