Rafael, Guilherme e Lahire são contra o novo projeto do RoxyPedro Ivo / Agência O DIA

Rio - Localizado na avenida principal de Copacabana, Zona Sul do Rio, o Cinema Roxy, depois de 84 anos, agora cederá espaço para uma casa de espetáculos, com a previsão de inauguração em 2023. A notícia não foi bem recebida por alguns moradores do bairro, que criaram um movimento no Instagram chamado 'Salvem Cinema o Roxy' e marcaram uma manifestação na frente do local no dia 13 de novembro para reivindicar o novo destino do local. Segundo os idealizadores, o Roxy é um patrimônio cultural da população da região e é um dos únicos cinemas que não está em shoppings. De acordo com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação, não há processo de licença de obras para o local. 
O espaço em estilo Art Déco, comprado pelo empresário Alexandre Accioly, sócio da rede de academias Bodytech em parceria com Dody Sirena, empresário do cantor Roberto Carlos, agora será uma casa de espetáculos. A tela dará lugar às apresentações brasileiras, com foco nas músicas e características culturais das cinco regiões do país.
Foi se debruçando na história do Roxy que o cineasta Rafael Lundgren, de 32 anos, percebeu que seria um erro o término do cinema. "Ao chegar com a proposta de fazer um documentário sobre ele, me deparei com esse movimento, não só com a história do local em si", disse.
De acordo com Rafael, o Roxy tem que ser cinema por causa da sua finalidade e para beneficiar os moradores do bairro. "O que está acontecendo que estão desrespeitando tudo que foi acordado? O que está por trás disso?", indagou. O cineasta conseguiu, através das redes sociais, com esse movimento, ganhar visibilidade e apoio de artistas e celebridades, como Najara Toreta. "A gente entra em uma questão social agora, porque o cinema é como arte. Muitos idosos moradores da região, que moram sozinhos, são os espectadores mais assíduos das sessões de filme no período da tarde", explicou. "Para eles, era uma distração muito grande. Eles saiam do universo da solidão, do marasmo, e se conectavam com outro universo através da arte. A gente precisa lembrar que o cinema tem uma função social muito importante e quando tiram o Roxy, o último que existia no bairro, fica complicado. Eles vão precisar pegar um ônibus ou táxi para assistirem filme em outro bairro?", acrescentou. "Essa é uma ameaça muito grande para a cultura", concluiu.
O advogado Guilherme Machado Corrêa, 50, morador de Copacabana desde o seu nascimento, sempre foi um frequentador assíduo do cinema. Ele guarda na memória lembranças do espaço, como o dia que assistiu ao filme Superman e quando foi barrado por causa da idade ao tentar entrar para ver o filme Flashdance. "A proposta do Alexandre Accioly e Dody Sirena não pode ser aprovada pela Prefeitura porque desrespeita dois decretos: o que tomba os Roxy 1, 2 e 3 (não pode quebrar as paredes que separam as salas) e não respeita o decreto do cadastro dos negócios tradicionais e notáveis, ou seja a continuidade da exibição de atividade cinematográfica", completou. Esses shows também dariam impacto na vizinhança, já que a rua Bolívar, onde fica o espaço, já sofre com carga e descarga de caminhões de três supermercados, duas padarias, além de vários bares e restaurantes", completou. "Eles matariam o ponto de táxi ao lado do cinema, já que ali seria feito a carga e descarga e o embarque e desembarque de ônibus de turismo. O projeto não é para o público carioca. É para gringo, tipo público da finada Help! Atrairia o submundo da Zona Sul e desvalorizaria os imóveis residenciais e pontos comerciais", concluiu. 
Para o presidente da Associação de Moradores de Copacabana, Tony Teixeira, o espaço não tem que ficar fechado e é necessário pensar na economia também. "Alguém ali chegou antes, correu atrás do dono do local, e propôs o negócio. A gente lamenta a perda da sala, mas, isso é uma questão no qual quem tem interesse que corra atrás", disse. "A galera da cultura tem que ir atrás e fazer uma proposta. De qualquer forma, aquele espaço não pode ficar parado. Agora, o jogo está feito e lutarem contra isso é um direito de qualquer um, mas acho difícil mudar algo", completou. "Por que esse pessoal não fez barulho antes de fechar acordo? Esperaram materializar o negócio para fazer algo. O cinema é uma atividade mercantil privada que tem que dar lucro. Sem lucro, como consegue manter? É triste, mas é o que rege o mundo. Os moradores estão tristes, é chato perder um cinema, claro, ainda mais o Roxy que é um ícone, mas é preciso dar uma rentabilidade para aquele lugar", declarou. Tony ainda ressalta que não está totalmente satisfeito com a mudança, mas não há o que ser feito. "É a matemática econômica. É ruim, mas precisamos conviver com essa realidade. Não adianta ficar no comodismo", concluiu.
O Grupo Severiano Ribeiro informou, através de nota, que o Roxy não funcionará mais como cinema e reiterou que a decisão de fechamento do espaço foi pautada nos resultados que o ele vinha apresentando nos últimos anos, principalmente, com a migração dos cinemas para os shoppings. "O Grupo ressalta que, em 2019, pré-pandemia, o cinema alcançou um público muito menor do que o esperado, ficando 43% abaixo da média do grupo. Em outubro de 2020, com a reabertura dos cinemas, mais uma vez, ele demonstrou sua inviabilidade, agravada pela característica de ter um público predominantemente sênior. Isso fez com que recebesse, em uma semana, um público de apenas 24 pessoas, 8 por sala, em um dia inteiro de operação, obrigando o Grupo a fechar suas portas", disse parte do comunicado. 
O psicólogo Lahire Marinho, 75, morador do bairro, não acredita em uma transformação do espaço, mas sim no desmonte dele. "É o último cinema de Copacabana, nós assistimos todos os outros serem fechados. Eu acho um horror isso do Roxy virar uma casa de espetáculo. Nós vamos ficar atrofiados sem ele", afirmou.
Lahire contou que seus pais, quando ainda noivos, chegaram a frequentar o Roxy e até mesmo seus avós, na década de 30. "Esse cinema merece nosso respeito porque ele formou opiniões, formou grupos, fez com que o entorno ali da rua Bolívar tivesse comércio enriquecido com a permanência da galera", explicou. "Onde há cinema, há vida. Eu não quero uma casa de show. Cinema é algo para o povo, não é elitizado. Será mesmo que esse novo projeto vai valorizar o entorno?", indagou.
O psicólogo, que é um dos responsáveis pelo movimento "Salvem o Cinema Roxy", participa também de grupos de cinema de rua com o objetivo de esclarecer e denunciar desmanches de salas. "Antes dele fechar por causa da pandemia, nós tentamos entrar em contato com a Rio Filmes para ter alguma informação sobre o caso. Às vezes eu ia lá na frente, via uma galera da empresa do cinema limpando, então acreditávamos que ele ia reabrir", contou. Segundo ele, moradores e apoiadores do Roxy fizeram um abaixo assinado, coletando cerca de 18 mil assinaturas contra o novo projeto.