Pensão na Tijuca faz sucesso com comida gostosa e opções de sobremesaPedro Ivo/ Agência O Dia

Rio - Os azulejos portugueses na parede, a imagem da santa em evidência, o quadro com o cardápio do dia e o bate-papo com amigos de longa data fazem a pensão Colina da Tijuca, na Zona Norte, parecer uma extensão da cozinha da própria casa para os clientes mais fiéis. O modelo de negócio foi perdendo espaço ao longo dos anos, mas o espaço aconchegante na Rua Santa Sofia é um daqueles estabelecimentos que resistem às imposições do tempo e mantém viva uma antiga tradição da cidade e da família Lemos, responsável por fundar uma das pensões mais antigas do Rio em 1974 e que há três gerações está na administração.
Com uma clientela fiel, os rostos já conhecidos pelos donos e funcionários são quase como parte de uma grande família, a ponto de nem precisarem mais explicar suas preferências todos os dias. Na contramão da tendência dos milhares de self-services, a comida ainda é servida quase da mesmo forma que há 49 anos: uma grande panela de feijão na extensa mesa e carne individual. Já o arroz e demais complementos passaram a ser entregues individualmente após a pandemia da covid-19, período em que o estabelecimento permaneceu fechado por quatro meses. Foi necessário se reinventar para manter as portas abertas.
"Ficamos pensando se continuaríamos ou não, mas eram muitas pessoas que dependiam da nossa decisão. Isso pesa um pouco. Continuamos, mas foram dois anos de muita dificuldade. Hoje temos mesas individuais e as mesas comunitárias, que os clientes mais antigos costumam preferir. Tivemos que entrar no delivery também para poder sustentar o negócio", explica Lourdes Lemos, de 67 anos, que é nascida em Portugal, mas chegou ainda criança ao Brasil e ajudou os pais a escolher o nome da pensão durante a adolescência - a inspiração vem de uma restaurante português.
Contudo, não foi apenas por causa das reinvenções como negócio que a pensão conseguiu se manter ativo por tanto tempo. Um dos motivos para conquistar clientes tão fiéis é ter preservado o tempero original durantes os quase 50 anos de existência, definido pela atual administradora como 'bem saudável'. Mas foram necessárias adaptações para manter o preço abaixo da média - o almoço custa R$ 20 – e agradar todos os tipos de clientes, como explica Leonardo Lemos, filho de Lourdes e jornalista.
"Antigamente, a pensão era um lugar onde as pessoas vinham para comer muito. Hoje elas vêm com o intuito de comer bem. O conceito da pensão, desde o começo, é a comida fresca. O segrede de ter um preço baixo é justamente você ter um cardápio variado todos os dias, porque eles conseguem ir ao mercado, ver o que está com o preço mais em conta e fazer o cardápio em cima daquilo. Hoje, também somos obrigados a ter um legume, algo a mais, porque as pessoas se preocupam mais com isso. Temos que trabalhar com uma comida mais saudável para que as pessoas possam comer todos os dias", explica Leonardo.
A manutenção da qualidade tradicional, apesar das mudanças forçadas pelo tempo, é o que faz os clientes mais antigos não perderem o hábito de almoçar no pensão quase diariamente, como o gerente lotérico Everaldo Carvalho, frequentador da Colina da Tijuca há quase 30 anos. Fica até difícil elencar os todos fatores que o levam a fazer pelo menos uma refeição no local.
"É o carinho que eles têm com a gente, a atenção. As atendentes são maravilhosas. E também a qualidade do alimento, sempre fresquinho, nunca me fez mal nenhum, quantidade ótima...", explica Everaldo. Já a babá Cristina Viana, de 59 anos, chega a andar por até 20 minutos do Grajaú até a pensão da qual é uma das clientes mais fiéis. Sempre que pode, ainda leva filhas e filhos para almoçar por lá e prefere não cozinhar em casa. Mas o apreço pela comida da pensão é tanto que ela prefere comer na pensão mesmo em dias em que prepara o almoço em casa.
"Venho quase todos os dias, já que moro no Grajaú, e só não venho quando estou no trabalho, que é na Freguesia. Sendo sincera, não gosto de cozinhar, mas eu amo isso aqui. Conheço todos aqui, pessoas maravilhosas. Meus filhos também vêm sempre aqui. Mesmo passando momentos difíceis na pandemia, em momento nenhum largaram os clientes", elogia Cristina.
O estabelecimento é outro, mas o mesmo modelo é o que faz Leonídio Brito ir quase religiosamente à Pensão Santa Luzia, no Centro, todos os dias. O estabelecimento existe desde 1966, mas o funcionário público de 56 anos o conheceu há apenas seis. Desde então, não parou de frequentar durante o horário de almoço do trabalho. O toque caseiro do tempero e o ambiente aconchegante são os maiores atrativos, além do preço abaixo da média para as redondezas.
"O sabor é diferente, tem aquele tempero caseiro. Quando vou lá, gosto de ir com calma. Chego e converso com Marcelo, que acabou se tornando meu amigo. O preço também é atrativo. Lá, pago em média de 25 a 29 reais. Aqui por perto, a comida é a quilo, e com 29 reais você não coloca praticamente nada”, comenta o morador da Vila da Penha, que foi apresentado à pensão por um ex-colega de trabalho.
O almoço em grupo dos funcionários da Secretaria de Estado de Saúde já virou até tradição, mas Brito não deixa de ir à pensão mesmo que esteja sozinho, enquanto outros preferem pedir uma quentinha por delivery. O preferido dos colegas é quase unanimidade: a feijoada, prato de toda sexta-feira.
"Independentemente de irem comigo ou não, eu vou lá. Vou porque gosto de conversar. Sexta-feira o pessoal vai lá comer a feijoada. Eu vou todos os dias, principalmente na quinta, que tem a rabada, e na sexta", diz o funcionário público.
Fundada pela Dona Diva, que trabalhava no local até a pandemia, a pensão Santa Luzia também precisou s reinventar ao logo do tempo. Nos últimos anos, foi administrada por Rita, filha de Diva, e agora por Marcelo, neto. Assim como na Colina da Tijuca, o estabelecimento passou a movimentar as redes sociais e trabalhar com delivery para alavancar as vendas. Os pratos costumam custar de R$ 19, preço de um omelete de queijo com presunto, a R$ 45 para quem quiser um sofisticado bife de chorizo.