Padre Renato na Casa do Menor e nas cracolândias do Rio - Divulgação
Padre Renato na Casa do Menor e nas cracolândias do RioDivulgação
Por O Dia

Um história que começou há 40 anos ganhará mais um capítulo e vai parar nas telonas. O sacerdócio de padre Renato Chiera, conhecido como "padre de rua" ou "padre das cracolândias", que tenta mudar a realidade dos meninos e meninas de rua, vai virar filme e deve ser lançado no segundo bimestre de 2019. Além do trabalho nas cracolândias, o trabalho social desenvolvido na Casa do Menor, em Miguel Couto, Nova Iguaçu, ao longo de 32 anos, será destacado.

O curta, que vai contar a vida do padre e também sua trajetória no Brasil, está na fase de captação recursos financeiros. O projeto está sendo desenvolvido por Donatella Martini e Matteo Ghiglione, da Casa do Menor na Itália.

"São 40 anos ao lado dos que não são amados e dos excluídos, é uma grande graça e privilégio. Espero que o filme sirva para fazer com que as pessoas e autoridades olhem com outro olhar para a realidade da periferia", pede o religioso.

Outra conquista, no ano em que o padre italiano comemora quatro décadas de sua chegada ao Brasil, é a inauguração do Centro Cultural Presença Rosa dos Ventos, em Nova Iguaçu, na próxima terça-feira, dia 10.

Já nas próximas semanas estarão abertas as turmas para cursos de auxiliar de cabeleireiro, RH, Elétrica Predial, Mecânica, Audiovisual, Auxiliar Administrativo, Montagem e Manutenção de Computadores, Gastronomia, Panificação, Inglês e Barbeiro.

CRACOLÂNDIA

Com mais de 50 anos de sacerdócio, padre Renato diz que a cracolândia no Rio é a pior coisa que viu em todos os anos de atuação nas ruas. Fundador da Casa do Menor São Miguel Arcanjo, dedicada a menores infratores, ele foi um dos primeiros a entrar no submundo do crack para resgatar viciados e oferecer alternativas.

"Diria que é um cemitério de vivos que se consolam como podem, usando crack, esperando a morte. São cenas marcantes e muito tristes. Descrever a cracolândia é muito difícil. É preciso ver, sentir o cheiro, abraçar, olhar nos olhos", diz.

O padre faz trabalhos em territórios de maior consumo, como as cracolândias de Manguinhos, Bandeira Dois, Maré e Jacarezinho. Nestes locais, ele costuma ouvir as dramáticas histórias dos usuários da droga, mas sem recriminá-los. 

"Eles (os viciados) me dizem: 'Padre, estamos aqui porque aqui somos todos iguais. Ninguém quer a gente. Aqui um aceita o outro'. Quando entramos lá vamos sem julgamentos porque vamos lá para amar e muitos pedem para sair conosco", relata.

Nas visitas à cracolândia, o padre coloca uma roupa que o identifica como padre, uma vestimenta um pouco africana. Segundo ele, é preciso criar uma relação de simpatia. "Estamos lá não para julgar, mas para escutar".

O primeiro contato com esta realidade veio de um convite de um viciado que ele havia acolhido. "Ele disse que queria me mostrar uma coisa. Quando entrei na cracolândia de Manguinhos, fiquei espantado. Estava acostumado à rua, com crianças e adolescentes. Mas havia ali um povo de todas as idades. Todos debruçados sobre uma pedra. Aliás, sobre um copo, no qual eles quebram uma pedra", lembra.

As experiências do padre nas cracolândias, aliás, lhe renderam um livro, que ele intitulou de 'Presença no Inferno'.  

CASA DO MENOR

 Nascido em Villanova Mondovi, comunidade na região do Piemonte, Itália, Renato estava com quase 40 anos e dava aula de filosofia quando decidiu pelo trabalho missionário no Brasil. Foi enviado a uma região marcada pela violência: Miguel Couto, na periferia de Nova Iguaçu.

Uma noite, ao chegar à casa paroquial, deu de cara com um jovem. Pensou que seria um assalto, mas era um jovem que tinha tomado um tiro de raspão pedindo ajuda. "Ele disse: 'Sou eu, o Pirata. A polícia está atrás de mim, me deu um tiro". 

O menor, acusado de cometer roubos na região, optou por uma nova vida. Começou a estudar e a trabalhar com apoio do padre. Algum tempo depois, ao retornar para casa, o religioso soube que o menor havia sido assassinado.

"Lembro que, na época, ele me disse que já tinham matado 36 em um mês e que tinham mais 40 para morrer. Ele era o primeiro da lista e perguntou se, por acaso, não iríamos fazer nada? O grito de socorro do Pirata é meu, minha missão de recuperar crianças, jovens e adolescentes da violência", pondera.

Foi assim que, então, nasceu a Casa do Menor São Miguel Arcanjo, em 1986, em Miguel Couto. Pirata não viveu para ver o sonho realizado, mas o projeto já ajudou mais de 80 mil jovens e crianças.

Em 32 anos, a Casa do Menor cresceu, e além da sede, possui filiais em Tinguá, Guaratiba, Rosa dos Ventos, Vila Claudia e Shangri-lá, todas no Rio, além de unidades em Santana de Ipanema (Alagoas) e Pacatuba (Ceará). Já foram oferecidos cursos profissionalizantes a mais de 50 mil jovens e mais de 10 mil foram nas casas. Muitos ex-moradores de rua são hoje educadores no projeto.

"O objetivo da casa é mostrar que todo mundo é recuperável, através do amor e da pedagogia. Ninguém quer entender a causa da violência, mas está na falta de amor, na falta de perspectiva, na falta de futuro. Não é cadeia que resolve. Não se combate violência com mais violência. Por isso, aqui oferecemos essa oportunidade de futuro, ressalta". 

COMO AJUDAR

Quem quiser fazer algum tipo de doação para a Casa do Menor ou conhecer o local, pode ir até lá. O endereço é Avenida Duque Estrada Meyer, 222, bairro de Miguel Couto, em Nova Iguaçu. O espaço está sempre aberto.

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