Quando o messiânico Antônio Conselheiro organizou uma comunidade religiosa pró-monarquia no sertão baiano, nem nos sonhos mais remotos imaginou que uma das consequências seria o nascimento da primeira favela no Rio de Janeiro. Com o fim da Guerra de Canudos, cerca de 10 mil soldados voltaram para então capital da República esgotados, mas certos que a promessa do governo seria paga com juros, afinal as investidas contra o exército informal de Conselheiro não foi nada fácil e, em alguns momentos, a expectativa era de derrota das forças oficiais. Os soldados venceram a batalha, mas em solo carioca ficaram sabendo que não receberiam dinheiro por isso e, pior, nem tinham onde morar. Aquele 1897 marcaria a vida dos militares e o futuro habitacional do Rio.
Atrás da Central do Brasil havia ( e ainda há) o Morro da Providência. Sem terem para onde correr, e contando com a autorização das administrações militares, soldados (às vezes acompanhados de mulheres ou trazidas à força ou conquistadas) começaram a construir pequenos casebres na região, de alvenaria com telhados de madeira. Era na parte de baixo do Morro, que logo ganhou o nome de Favela, uma homenagem a como era chamado o monte em que os combatentes acamparam na Bahia. Favela é uma pequena planta comum no sertão baiano. Há vertentes históricas que vão defender que os soldados trouxeram favelas para o Rio de Janeiro, gerando o nome e, principalmente a partir da década de 1920, o apelido.
Os primeiros passos do Morro da Favela, hoje novamente Morro da Providência, foram destruídos. A extração de terra do sopé contribuiu para construção de aterros e obras do centro da cidade. Jornais estigmatizavam. Junto aos soldados desguarnecidos, pessoas escravizadas recém libertas e aqueles com baixas condições financeiras construíram casas para moradia. Era essa uma forma de estar perto do centro administrativo, aumentando as chances de empregabilidade. Desde o começo, os moradores da Favela eram encarados como violentos, estigma ofertado especialmente aos cidadãos com menos poder aquisitivo. A fama de lugar perigoso aumentaria com o surgimento do malandro Sete Coroas, símbolo da Favela.
O preconceito vem de longe.
* Sete Coroas
Em 1921, o sambista Sinhô lançou a música “Sete Coroas”, que oferecia um panorama do homenageado: “É noite escura/ Iaiá acende a vela / Sete Coroas / Bambambã lá da Favela / E a polícia / Já tentou / Sete Coroas / Meia dúzia já matou / E o homenzinho / É perigoso / Sete Coroas / Nasceu no Barroso”.
Morador do buraco quente do Morro da Favela, Sete Coroas ganhou esse apelido por participar de um assalto à um funeral de luxo. Roubou tudo que via pela frente. Saiu com os bolsos carregados. Apesar de tudo, não há relatos de ter afanado as flores. Temido e famoso nas páginas policiais, foi preso em 1923.
Depois de morto, passou a ser chamado pelo povo da Umbanda de Exu Sete Coroas, com direito a ponto e cantoria: “É noite escura / Na rua acende a vela / Sete Coroas / É o bamba da Favela”.
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Primeira Favela?
Há quem defenda que a primeira favela foi o Morro de Santo Antônio, também no centro do Rio. Ele foi demolido na década de 1960 para contribuir no Aterro do Flamengo.
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Banca Cultural
E não é que o jornalista e músico Alexandre Nadai vai lançar uma banca cultural? O rapaz transformou uma antiga banca de jornais, pertinho da Lavradio, em um ponto de encontro para lançamentos, em especial, de escritores afrodescendentes.
A estreia será no domingo, dia 5 de dezembro, às 11h. O homenageado é o grande Zé Ketti, que completaria 100 anos em 2021. A filha do compositor de “Opinião”, Geisa Ketti, estará presente. Nadai acabou de assumir o vocal do “Filhos de Gandhi”.
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Por falar no Centro...
O subprefeito do Centro Leonardo Pavão tem recebido elogios por parecer estar em tudo que é canto a todo momento.
Parece ter o fôlego do amigo Didi Vaz, subprefeito da Zona Norte.
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MUHCAB
O Museu da História e Cultura Afro-Brasileira, que fica no belíssimo José Bonifácio, na Gamboa, reabre as portas hoje (23).
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