Luarlindo Ernesto - Histórias do LuarDaniel Castelo Branco

O mundo parou. Os mais jovens quase surtaram. Como ficar sem o tal do zap de uma hora para outra, sem aviso prévio ? Como se comunicar? Não conhecem outro meio, nem usam telefone do celular. Mais de seis horas longe de tudo e de todos. Até os malandros golpistas se assustaram.
Como ganhar a vida desonestamente sem o zap ? E os bandidos nas cadeias? Já comerciantes, blogueiros, empreendedores e os rapazes das entregas rápidas (delivery), ficaram sem trabalhar. Aplicativos, transportes e de outros meios, parados. Pane geral na velha Terra. Cadê o Plano B ?
Já inventaram o telefone ! Não temos o catálogo de assinantes. Muita gente nunca ouviu falar, ou chegou a usar. Não se tem mais, na memória, os números dos parentes, amigos, comércio e o antigo ponto de táxi. Lembram do ditado: "Quem dorme no ponto é motorista de táxi ? Mas, como chamar o Uber ? Ih, e aquelas mensagens dos amantes, "moor, te amo..." E aquelas terríveis: "Senhor fulano, sua fatura está em atraso..." deixaram de constar na telinha do aparelho por quase sete horas. Pelo que ouvi, e vi, as pessoas ficaram desarrumadas e, uma pequena maioria, se sentiu desamparada, até as meninas, aquelas das saliências, ficaram prejudicadas. Bem, melhor deixar esse assunto de lado.

Detesto WhatsApp. Eu e uma turma de veteranos aqui do bairro (de outros, também). Até hoje, falamos pelo telefone. Até o e-mail foi quase esquecido. Concordam? Lembram quando era Correios e Thelégrafos
? E, do telegrama fonado? Hoje em dia, com o zap fora do ar, cheguei a ver, na rua, jovens atordoados, com o celular nas mãos, olhares tristes. Será que só usam os aparelhos para mensagens via zap? Pois é.
Muita gente só usa o zap. Ou aquele amigo malandrão que envia fotos e vídeos de mulheres peladas. O apagão é assunto corrente, até hoje. O Gastão, vizinho, veio puxar conversa, presencial: "Ô Luar, na China
não tem zap ou Face. Como os chineses se comunicam ?. Deve ser por isso que a população cresceu muito". Céus, nem respondi.

Fingi que estava recebendo uma ligação telefônica do Cesário. E comecei a falar sozinho, respondendo e perguntando sobre futebol, culinária, defeito do carro, custo de vida, inflação. E nada do Gastão
 se afastar. Vou revelar um detalhe: Gastão é apelido de Honorato. É que ele é conhecido como o sujeito mais pão duro do mundo. Daí, pouca gente aqui do bairro atura o cara. Me contaram que ele foi visto em um supermercado, tentando ver qual o pacote de arroz era mais pesado que o outro. Entenderam? E repetiu o gesto com o café e o feijão. Dizem que ele tem ligação clandestina de energia elétrica. Desconjuro !

A tarde de 4 de outubro, logo na segunda feira, que o zap, o Face e o Instagram, mudos, permitiram jovens aparecerem nas ruas do bairro. E conversaram cara a cara ! Mas o assunto, claro, foi o exagero de ficar sem comunicação móvel.
Incrível como se gasta o tempo com baboseiras via celular. Tá explicado o poder das fake news entre jovens e uns outros mais vividos (e velhos, também). É por isso que o Siri, outro vizinho, dia desses trouxe netos e sobrinhos aqui em casa. "Ô Luar, pode mostrar os seus aparelhos de telefones antigos para essas crianças ?", perguntou. "Claro, podem entrar. Tenho um, de manivela, daqueles de madeira. De causar espanto para quem não conhece. Fora os outros, de 1950 em diante. Todos funcionam. Até adultos ficam admirados...
Então, por ainda confiar na telefonia, sugiro aos amigos que o Plano B pode ser o velho e confiável telefone. Quer dizer, antes que roubem os fios. Então, sinais de fumaça (Plano C)! Bem, sem zap  amém), fui
assistir, em vídeo-cassete, o antigo seriado M.A.S.H., enquanto esperava o mundo voltar a funcionar.