A que o senhor atribui a sua expressiva votação? O senhor acreditava que seria o mais votado do Rio?
Foi uma grata surpresa essa votação, mas também um grande reconhecimento do nosso primeiro mandato. Apresentamos muitas propostas, enfrentamos poderosos, que dominam a cidade de várias formas, e estivemos presentes em todos os debates da Câmara. Fizemos investigações detalhadas na CPI dos Ônibus e na CPI das Enchentes que identificaram irregularidades e descasos das prefeituras com a vida das pessoas. O relatório alternativo que fizemos na CPI dos Ônibus serviu de base para as ações do Ministério Público. Dois aumentos da passagem de ônibus chegaram a ser impedidos por conta disso. Para impedir tragédias decorrentes das fortes chuvas, visitamos áreas atingidas, identificamos os principais problemas e enviamos para a prefeitura e para o MP mais de 100 recomendações. Isso tudo com transparência, publicando documentos e informando a população sobre nossas ações por meio de nossas redes sociais e imprensa, ou seja, a população via, nas redes e nas ruas, que nosso mandato de fato trabalha muito para melhorar a vida dos cariocas.
Qual deve ser a agenda prioritária do Rio de Janeiro nos próximos 4 anos?
Certamente teremos muitos desafios pela frente. O primeiro deles será o retorno das aulas presenciais nas escolas públicas no pós-pandemia. Além disso, a pandemia não acabou, a Câmara precisará trabalhar para organizar o sistema de saúde para enfrentar essa segunda onda. A revisão do Plano Diretor da cidade é outra prioridade que deve ser discutida ainda no início do ano. É uma das principais legislações do município, define como e para onde a cidade deve crescer. Outro desafio será a aprovação do Plano Municipal de Cultura. Equivocadamente, esse setor costuma ser desprezado, mas é principalmente em períodos em que precisamos de recuperação econômica e fortalecimento de ações para a construção de uma sociedade melhor que a cultura é essencial. Vamos enfrentar esse desafio de definir as metas da política do setor para os próximos 10 anos junto com os trabalhadores da cultura.
Cientistas políticos andam dizendo que o Rio é de direita. O senhor foi o mais votado e o PSOL ampliou sua bancada. A capital é conservadora?
O Rio de Janeiro é o berço do bolsonarismo, mas isso não a torna automaticamente uma cidade conservadora. A cidade levou o PSOL ao segundo turno em 2016 e tem eleito bancadas expressivas de parlamentares, prova de que os eleitores cariocas têm reconhecido o projeto da esquerda. O Rio também é berço do samba, do carnaval de avenida, do funk… São expressões culturais que sempre resistiram e enfrentaram a opressão. E é essa coragem e liberdade de expressão dos cariocas que faz a cidade ser respeitada e reconhecida no mundo todo. O bolsonarismo só envergonha a Rio.
O Plano Diretor será discutido na Câmara de Vereadores como o tema merece?
Trabalharemos para isso. É um assunto que a própria sociedade tem dificuldade de acompanhar, mas é decisivo, essencial. Precisa entrar em revisão o mais rápido possível, já estamos atrasados, mas é prioridade em 2021. Será um desafio do legislativo do qual nosso mandato não vai fugir do debate para defender uma cidade mais democrática, menos excludente e social e ambientalmente responsável. Vamos ter que fazer um debate amplo sobre as políticas de organização da cidade e urbanismo para, inclusive, diminuir o poder econômico das milícias que controlam determinados territórios. Além disso, temas como meio ambiente e mobilidade urbana são imprescindíveis no plano diretor.
Hoje o povo escolherá entre Crivella e Eduardo Paes. O que levou o eleitor a entender que os dois são as melhores opções?
Foi uma eleição peculiar, sem debates na televisão, que impediu que os eleitores conhecessem melhor os candidatos mais novos. Nesse contexto de pandemia, os mais conhecidos tiveram vantagem. Além disso, o prefeito tem o benefício, pelo seu cargo, de aparecer mais na mídia. Ainda assim, mesmo com o apoio do presidente da República, teve uma votação muito menor do que se esperaria de um prefeito. Sua rejeição é tão grande que as pessoas estão sendo iludidas pela candidatura de Eduardo Paes.
Como o novo prefeito deve conduzir as finanças para evitar que o caixa seja quebrado de vez?
É preciso seguir três linhas de ação de forma simultânea: induzir e incentivar atividades que gerem emprego e movimentem a economia de forma social e ambientalmente responsável; melhorar a eficiência do gasto público, com mais transparência, mais obras que movimentem a economia e garantam direitos e menos obras de maquiagem, eleitoreiras; e tornar os impostos da cidade mais justos, cobrando mais de quem tem mais e menos de quem tem menos.
O senhor é professor, quais são as necessidades mais urgentes do setor?
Estamos vendo agora um retorno irresponsável das aulas presenciais, as escolas não foram preparadas para receber os estudantes, e isso está ameaçando a vida de profissionais da educação, de familiares dos alunos e dos próprios alunos. É uma situação que não vai se resolver no final desse caótico governo do Crivella. Isso significa que é essencial ter um plano emergencial para adequar os prédios das escolas para que possam receber os estudantes no ano que vem.
A situação da saúde é o principal problema a ser enfrentado?
Com certeza, é o problema mais urgente. Já era preocupante antes da pandemia, agora piorou. Não há mais leitos de UTI disponíveis no SUS para o tratamento de Covid e o número de casos voltou a aumentar. É urgente organizar o sistema de saúde e conter o avanço do novo coronavírus.
A atual administração conduziu bem o enfrentamento da pandemia?
Foi e ainda está sendo um desastre. Em maio, quando a pandemia estava crescendo a todo vapor, Crivella já quis esconder casos de contaminação. A precoce flexibilização do isolamento social foi de uma irresponsabilidade absurda, um crime gravíssimo contra a vida das pessoas. Neste mês, ele chegou a afirmar que a covid-19 havia matado menos que o esperado, como se a pandemia já tivesse acabado.
O senhor é um expoente da esquerda, como derrotar o bolsonarismo e a extrema-direita conservadora?
Costumo dizer que a gente vai virar o jogo contra o bolsonarismo. Nesse primeiro tempo, fizemos apenas o primeiro gol para iniciar uma virada que será concluída em 2022. Estamos diante de uma responsabilidade enorme: a construção da unidade de esquerda em torno de um projeto para o estado e para o país em torno de propostas, e não de nomes. Isso se faz dialogando com a população, acolhendo as experiências dos movimentos sociais, da luta de classes e dos trabalhadores. Se não começarmos a pensar agora a construir a unidade necessária para 2022, podemos chegar às próximas eleições fragmentados.