Cleo no clipe de ’Tormento’ErnnaCost / Divulgação

Rio - Depois de adiar os planos de lançamento de seu primeiro álbum por conta da pandemia da covid-19, Cleo está de volta com força total. A música "Tormento", que ela gravou e compôs em parceria com as rappers Karol Conká e Azzy, ganhou no início de dezembro seu primeiro clipe, que já conta com mais de 3,8 milhões de visualizações no YouTube. E o lançamento do disco da artista tem previsão de estreia para o primeiro semestre de 2022. Empolgada, Cleo fala sobre o processo de criação de sua carreira musical. 
"Estou trabalhando nesse álbum que a gente vai lançar ano que vem há um dois anos. Ele estava quase pronto antes da pandemia, mas durante esse período outros processos de autoconhecimento acabaram se revelando para mim. Aí eu quis mudar muita coisa, adicionar muita coisa no álbum e 'Tormento' veio junto com essa nova leva de ideias", explica a cantora, que também conta os motivos que a levaram a convidar Karol Conká, de 35, e Azzy, de 20, para dividir o microfone com ela. 
"Eu queria falar sobre renascimento, mas de uma forma que fosse divertida e que fosse um pouco sombria também. Eu já conhecia a Azzy, principalmente pela poesia rústica, e fiquei muito deslumbrada com o estilo dela. E a Karol já conheço e consumo há muito tempo. Por isso, pensei nas duas e falei 'preciso dessas duas mulheres comigo', porque são duas mulheres que têm representatividade, que falam sobre o poder feminino, sobre o alcance que a gente precisa dar uma a outra nessa esfera. Quando elas chegaram, escreveram essas coisas lindas, que levaram a música para outro patamar", comemora.
"Tormento" é uma resposta das intérpretes à opressão que o patriarcado exerce sobre as mulheres, e como a potência do poder feminino pode romper esse ciclo. Para este fim, Cleo acredita que as mulheres têm que se unir. "A gente se unir é sim uma forma de romper a opressão às mulheres. Eu gosto de me unir a mulheres. Não é a primeira vez e não vai ser a última. E eu sou libriana, então adoro parcerias", diz a cantora sobre o feat com Azzy e Karol Conká. 
Inspirações para o clipe
Dirigido por Fernando Moraes, o clipe tem seu conceito baseado em referências medievais, período notório pela deslegitimação das mulheres na sociedade. Cheio de simbologias, o vídeo de "Tormento" faz referência a figura da bruxa, assim como todos os estereótipos negativos associados a essa figura mítica. 
"Esse é um tema recorrente para mim: ser calada, objetificada, colocada dentro de uma caixa, não ser dado o direito de me reinventar ou de renascer e crescer e querer fazer novas coisas. Falar sobre as minhas dores e não ser levada a sério. Acho que as referências estéticas (da Era Medieval) têm muita riqueza. Mas eu pensei numa coisa mais super heroína, feiticeiras mais lúdicas do que bruxas mesmo (para o clipe)", explica Cleo. 
Julgamentos
Filha da atriz Glória Pires e do cantor Fábio Jr., a artista sofre o julgamento de pessoas que acreditam que ela só chegou onde está por conta dos pais famosos. Isso fora o preconceito que já é natural contra mulheres em geral. 
"Eu já me senti deslegitimada várias vezes. São 20 anos de carreira, mas no dia a dia parece sempre que você é inadequada, que você não merece estar ali. Você cresce com uma síndrome de impostora, de que você não sabe o que está fazendo. Por você ser mulher, parece que você não está ali por você, parece que alguém te colocou ali. É esperado que você esteja sempre bonita, maquiada, de salto, doce, simpática. Se você for assertiva, você é uma megera. Se você souber o que você quer, você é grossa. São pequenas formas de tentar tirar o seu poder sobre a sua narrativa e isso é feroz".  
Parceria
Karol Conká e Azzy também estão felizes da vida com a parceria com Cleo e contam como foi participar do projeto. "Eu gosto desse jeito da Cleo, dessa rebeldia com sensualidade e potência. Ela é muito autêntica e dinâmica nas coisas que faz e se propõe a fazer. Então, essa união é mais para somar uma na carreira da outra. É uma forma de espalhar a nossa mensagem juntas e mostrar que não estamos sozinhas nos nossos pensamentos e nos nossos aprendizados da vida. Estar com a Cleo e com a Azzy é um momento mágico, principalmente como pessoa, mas também na minha carreira como artista", diz Karol.
"A Cleo está expandindo mais a musicalidade dela, o que é muito legal. Uma artista que está expandindo a sua musicalidade, saindo da sua zona de conforto, que está conhecendo o trap, o funk e o rap... A gente fez uma união de problemas que tivemos que lidar (na vida) e transformamos isso em música. Quando a gente é convidado para compor uma música que fala da nossa vida é tudo mais especial, é uma energia diferente. Quando eu recebi esse convite foi incrível. As duas são maravilhosas, tanto no set quanto pessoalmente", exalta Azzy. 
Para Karol, "Tormento" foi a oportunidade também de desabafar. "Consegui colocar para fora algumas coisas que ainda não tinha colocado nessa letra. Transformar a dor em arte é libertador. Eu acho que também traz elevação para a consciência. A gente bota pra fora e transforma algo cinza em algo dourado, que você pode pegar e refletir sobre aquilo. Digamos que eu já estou expert em transformar a dor em arte", diz a cantora, que deu a volta por cima e está feliz e bem resolvida após a sua polêmica participação no "BBB 21". 
Artista consolidada em um meio formado majoritariamente por homens, Azzy concorda que a música é uma forma de protestar. "Quando eu comecei no rap, 99% eram homens. O rap nacional é um dos estilos mais machistas porque os caras sempre fecham uma bolha entre eles. E pra gente ter voz, a gente tem que se unir. A gente sempre encontra uma forma de botar pra fora toda essa opressão que sofremos na música, na vida... Só nós mulheres sabemos o que a gente passa. E a gente colocar isso na música, é a nossa válvula de escape, a nossa forma de ser ouvida. É como se fosse um grito. A gente fala e as pessoas não escutam a gente, então a gente grita mesmo".