Nova York - O empresário José Hawilla, dono da empresa de marketing esportivo Traffic, revelou nesta segunda-feira, em Nova York, durante depoimento do julgamento do caso de corrupção da Fifa, que pagou regularmente propinas ao ex-presidente da CBF, Ricardo Teixeira. Por até aproximadamente R$ 10 milhões, o acordo visava facilitar a compra de direitos de transmissão de três edições da Copa América.
"Era muito difícil fazer algo sem pagar subornos", disse o empresário de 74 anos no depoimento. J.Hawilla contou que um primeiro momento passava a Ricardo Teixeira cerca de R$ 330 mil por ano em propina. O montante acabou crescendo, até chegar a cerca de R$ 10 milhões, mesma quantia paga a outros dirigentes sul-americanos como o paraguaio Nicolás Leoz, ex-presidente da Conmebol, e o argentino Julio Grondona, ex-presidente da AFA (Associação de Futebol Argentino), falecido em 2014.
O julgamento do caso de corrupção na Fifa está na quarta semana na corte do Brooklyn, em Nova York. Segundo J.Hawilla, no acordo entre o empresário e Ricardo Teixeira, existia uma suposta exigência para que a seleção brasileira levasse os principais jogadores para os torneios. Como parte da admissão de culpa, J Hawilla aceitou pagar cerca de US$ 151 milhões (R$ 489 milhões). O dono da Traffic aceitou voltar a depor como testemunha na sessão desta terça-feira.
J.Hawilla prestou depoimento durante sete horas carregando um tanque de oxigênio e auxiliado por tradutores. A propina, segundo o empresário, garantiu à Traffic a comercialização dos direitos de transmissão das Copas Américas de 2007, 2011 e 2015. Para cada edição, era preciso gastar cerca de R$ 60 milhões em subornos para dirigentes sul-americanos. "Eu cometi um erro e me arrependo muito disso", afirmou o empresário.
Procurado pelo Estado, o advogado de Ricardo Teixeira, Michel Assef Filho, afirmou que considera uma "covardia" o seu cliente ser atacado por J.Hawilla sem ter direito de defesa. "É bom esclarecer que Ricardo não está sendo julgado e é uma covardia ser atacado sem ter direito de defesa e do contraditório dentro do processo judicial".
"Ricardo (Teixeira) nega veementemente as acusações irresponsáveis do delator e réu confesso José Hawilla. Ele desafia o delator a informar os nomes dos doleiros e as contas onde as propinas supostamente foram pagas, já que tais pagamentos nunca existiram. Sobre a acusação em relação a ter recebido propina para que fossem escalados os melhores jogadores para disputar a Copa América, Ricardo não só nega a acusação, como tem provas de que tais valores foram objeto de contrato e de pagamento realizado na conta da CBF", completou o advogado.
O dono da Traffic aceitou colaborar com a investigação do FBI depois de ter sido preso, em 2013. O empresário usou um gravador escondido para captar conversas com Hugo e Mariano Jinkis, pai e filho responsáveis pela empresa argentina Full Play. O áudio do diálogo foi ouvido pela primeira vez na Corte norte-americana e trata sobre esquema de propinas a vários presidentes de confederações nacionais de futebol de alguns países.
"Eu quero coexistir com eles e fazer todos os presidentes ricos", disse Mariano Jinkis em uma das gravações. Quando J Hawilla comentou com o pai e filho sobre a vontade de sair do esquema para fazer a sua empresa se tornar limpa novamente para que pudesse vendê-la a algum interessado, ouviu uma reprovação de Mariano. O argentino disse que não gostaria de contar com um parceiro que não entendesse de suborno ou de recompensas, como definiu os pagamentos.
Nas conversas gravadas, os argentinos disseram ser comum a existência do esquema. "Sempre existiram recompensas. E teremos recompensas para sempre", comentaram. Hugo e Mariano Jenkis estão entre os 40 indiciados por corrupção na Fifa. No ano passado, a Justiça da Argentina negou aos Estados Unidos o pedido de extradição da dupla ao alegar que os dois já têm sido investigados no próprio país.
A corte do Brooklin, em Nova York, tem julgado nas últimas semanas três ex-presidentes de federações nacionais de futebol na América do Sul. Os réus são o paraguaio Angel Napout, o peruano Manuel Burga e o brasileiro José Maria Marin, que dirigiu a CBF. Todos se declararam inocentes da acusação de conspiração e lavagem de dinheiro.
Reportagem de Ciro Campos e Paulo Favero