Às vésperas da assembleia que discutirá o plano de recuperação do parque temático, credores secundários insistem em pedido já negado pelo Tribunal de Justiça
Parque Hopi Hari passou por reformas e melhorias - fotosDivulgação
Parque Hopi Hari passou por reformas e melhoriasfotosDivulgação
A guerra que vem sendo travada em torno do controle do Hopi Hari, maior parque temático da América Latina, ganhou mais um capítulo na semana passada. A Justiça de Vinhedo, no interior de São Paulo, recebeu o pedido de um credor secundário do parque — uma empresa de comunicação chamada Silo Comunicação e Relacionamento Inteligente —, que deseja incluir na pauta da assembleia prevista para o próximo dia 2 de fevereiro, um pedido para que os credores votem a destituição da atual diretoria do parque. A empresa praticamente reproduz um pedido anterior, que já havia sido negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo no último dia 19 de janeiro.
Em sua decisão, o TJ, suspendeu “a eficácia da determinação de inclusão na pauta da assembleia de credores, como matéria preliminar, a decisão a respeito dos administradores”. A Silo, que passou a se chamar Sagrada Propaganda desde o dia 8 de novembro passado, ignorou a decisão e voltou à carga com base num argumento já desconsiderado pela Justiça. Segundo a empresa, existem dúvidas sobre quem seriam os atuais acionistas do parque.
O primeiro problema é que uma investigação superficial, feita com base nos documentos públicos da Junta Comercial de São Paulo, mostra justamente o contrário: o que existe é a falta de clareza a respeito dos controladores da Sagrada. Outro ponto que reforça a falta de cabimento do pedido é que a reunião que está prevista para o dia 2 de fevereiro não é uma nova reunião de credores, mas a continuação de uma assembleia em andamento.
A reunião tem pauta específica e teve início no dia 7 de julho do ano passado. Desde então, foi adiada duas vezes. “Alterar a pauta de uma Assembleia já iniciada significa, na prática, mudar as regras do jogo com a partida em andamento”, diz um advogado especializado em processos de Recuperação Judicial.
O primeiro pedido de adiamento da assembleia foi feito pelo principal credor, o BNDES — que tem um total de R$ 250 milhões a receber do parque. O banco de fomento estatal pediu tempo para estudar a proposta apresentada pela administração do parque. A proposta prevê a quitação integral do débito junto ao BNDES em até vinte anos e a continuidade do pagamento dos débitos trabalhistas — que já vem sendo feita, com autorização da Justiça, mesmo antes da aprovação do plano de recuperação. O segundo adiamento foi determinado pela Justiça, que solicitou esclarecimentos (já apresentados) em relação à contabilidade do Hopi Hari.
DE MÃO EM MÃO — A primeira tentativa de destituição da diretoria foi apresentado pela Silo, antigo nome da Sagrada Propaganda (que teria pouco mais de R$ 180 mil para receber do Hopi Hari), imediatamente após uma reportagem publicada no site da revista Veja, no dia 16 de dezembro. O pleito se baseou numa suposta dúvida em relação aos nomes dos proprietários do Hopi Hari — que pertence ao Brooklyn International Group, um fundo de investimentos americano com participação em dezenas de empresas e que é representado no Brasil pelo empresário luso brasileiro Nuno Vasconcellos.
A reportagem e o pedido de intervenção insinuam, sem qualquer prova, que Vasconcellos seria, na verdade, o proprietário do Hopi Hari. Trata-se, segundo os advogados que acompanham o caso, de um pedido feito apenas com o propósito de retardar ainda mais a aprovação do regime de recuperação judicial. O que não existe, na realidade, é clareza em relação ao controle da Sagrada’Silo (como a empresa vem se apresentado na internet) e aos interesses que ela representa nesse processo.
A Sagrada’Silo realmente foi habilitada entre os credores do parque ainda no início do longo processo de RJ do parque, em 26 de outubro de 2016. A questão é que uma auditoria realizada pela diretoria do parque, e já informada à Justiça, não localizou documentos que descrevam o serviço que teria sido prestado pela firma nem qualquer comprovação da prestação do serviço. O contrato feito entre as duas empresas não traz a assinatura de nenhuma das partes.
Além de não haver clareza em relação ao serviço que teria transformado a Sagrada’Silo em credora do Hopi Hari, há pontos obscuros em relação à situação societária da própria empresa — que já trocou de mãos várias vezes desde sua fundação, em 2011. De acordo com os registros da Junta Comercial de São Paulo, a empresa teve cinco alterações societárias e seu quadro de acionistas não é o mesmo da época de sua inclusão pelos antigos acionistas entre os credores da RJ por supostos serviços prestados.
A Sagrada’Silo tem como sócia e administradora uma profissional de comunicação chamada Denise Petrone. O portfolio publicado no site da empresa traz o nome de 41 clientes que são ou em algum momento foram atendidos pela firma. Entre eles estão várias empresas do ramo imobiliário e grandes organizações. Também há empresas menores. Não há, porém, qualquer menção ao Hopi Hari.
Além de Denise Petrone, a empresa tem como sócio um grupo de comunicação chamado ECI Empresa de Comunicação Integrada — que controla outras empresas como a Mindo, a Progiro e a Brandset. A ECI, por sua vez, é controlada por uma empresa chamada Intramark - Comunicacao e Endomarketing Integrados Ltda., que tem entre seus sócios o Grupo ECI. Isso mesmo: a empresa é dona do grupo que é dono da empresa... Essa participação cruzada dificulta a identificação dos verdadeiros controladores. Além de Denise Petrone, fazem parte da sociedade os nomes de Renato Bruchmann, Rodrigo Moreira Jimenez, Ricardo Kromberg e Rodrigo Dias Bonissato.
A impressão que se tem é a de que, ao pedir a destituição da diretoria do Hopi Hari, a Sagrada’Silo não estivesse agindo em seu próprio nome nem em seu próprio interesse — mas no de antigos controladores e administradores do parque. Ou, então, de alguém entre as pessoas que têm demonstrado interesse em inviabilizar o projeto de recuperação do Hopi Hari e fazer com que as negociações feitas até aqui voltem à estaca zero.
NOVOS INVESTIMENTOS — A situação jurídica do Hopi Hari, por sua vez, é do conhecimento da Justiça e nunca foi posta em dúvida até ser questionada pela Sagrada’Silo. No dia 20 de junho de 2017, o antigo acionista majoritário José Luiz Abdalla vendeu 75% das ações do parque — que aquela altura já se encontrava em regime de RJ — para os atuais controladores.
Na época, o parque se encontrava fechado e só voltou a receber visitantes porque os aportes de capital feitos pelos novos acionistas saldaram as pendências trabalhistas mais urgentes. Também foram feitos investimentos de urgência na manutenção e na recuperação dos equipamentos que estavam desativados. Nesse período, o Hopi Hari já recebeu mais de R$ 100 milhões em novos investimentos.
O problema é que desde o momento em que as portas foram reabertas e tão logo o parque voltou a ter receita, no dia 5 de agosto de 2017, os antigos controladores passaram a contestar o negócio que eles mesmos tinham feito e a questionar a licitude da operação — que teve sua legalidade reconhecida pela Justiça no dia 27 de março de 2019. A partir daí, os novos acionistas destituíram o antigo presidente José David Xavier e, com o apoio de Oficiais de Justiça e de força policial, assumiram o controle do parque no dia 27 de maio de 2019.
PEDRA BRUTA — Desde que os novos controladores assumiram, não houve mais atrasos de salários e as dívidas trabalhistas herdadas da gestão anterior passaram a ser quitadas mesmo antes da aprovação do plano de recuperação pela Justiça. Também não houve redução no quadro de colaboradores durante o período em que, devido à pandemia da Covid-19, o Hopi Hari permaneceu fechado durante quase todo o ano de 2020.
Depois da reabertura, feita no início de 2020, o parque, que gera mais de mil empregos diretos, cerca de oitocentos indiretos e, nos últimos meses, tem recebido mais de 30 mil visitantes aos finais de semana, vem recuperando sua receita, equilibrando as contas e atraindo a cobiça do pessoas que, antes, não acreditaram no negócio. A ponto de se transformar, da pedra bruta e sem valor que parecia ser no período em que suas portas estavam fechadas, numa joia cobiçada pelos antigos controladores e por muita gente que até pouco tempo atrás via o parque como um poço de problemas.
Desde o ano passado, os atuais controladores vêm tentando aprovar um plano de recuperação Judicial para substituir o que foi elaborado pelos antigos acionistas e rejeitado pela Justiça. O esforço, porém, sempre tem esbarrado em manobras que parecem destinadas a tumultuar o processo e passar a impressão que a atual diretoria age com incompetência ou má fé. Todas essas manobras, porém, têm esbarrado em decisões da própria Justiça.
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