Só que, neste caso, diferentemente da tradição do Rio de Janeiro de se importar mais com as questões nacionais e nunca se unir em torno dos seus próprios interesses, o Rio se uniu e o governo federal se deparou com uma rara unanimidade
Na política, quando não se quer resolver coisa alguma, mas é preciso dar uma satisfação à sociedade, forma-se um grupo de trabalho. É mais ou menos isso o que imaginava fazer o Ministério da Infraestrutura quando, diante da pressão de todos os atores políticos e econômicos do Rio, anunciou, em meados de janeiro, que estava se abrindo ao diálogo, disposto a ouvir as posições divergentes sobre o polêmico edital de venda do Aeroporto Santos Dumont. Sem mudar os prazos previstos para o leilão, formou-se o grupo de trabalho.
Só que, neste caso, diferentemente da tradição do Rio de Janeiro de se importar mais com as questões nacionais e nunca se unir em torno dos seus próprios interesses, o Rio se uniu e o governo federal se deparou com uma rara unanimidade. Assembleia Legislativa, Firjan, Fecomércio, Associação Comercial, Prefeitura do Rio, o senador Carlos Portinho (PL) e até o governador do Estado, do mesmo partido do presidente Bolsonaro - que a princípio era a favor do edital, mas que felizmente mudou de opinião - se uniram num consenso: da forma que está modelada a concessão do Santos Dumont, ela quebra o Aeroporto Internacional Tom Jobim, mais conhecido como Galeão.
Quebrar o Galeão, que já não vai bem das pernas e hoje tem menos passageiros que Guarulhos, Brasília, Campinas, Congonhas, Recife, Cofins, Salvador e Porto Alegre (nesta ordem), significa atingir também o transporte de cargas e manutenção de aeronaves, geradores de importantes receitas e empregos para o estado. Essas duas atividades – cargas e manutenção – não são viáveis no espaço do Santos Dumont, a menos que aterre quilômetros da Baía de Guanabara, o que seria uma insanidade sob todos os pontos de vista.
A primeira vitória do Grupo de Trabalho sobre o qual o Ministério da Infraestrutura, a princípio, queria passar o rolo compressor foi impedir que as empresas concessionárias dos aeroportos de Guarulhos (SP), Confins (MG) e Brasília participassem do colegiado, como chegou a ser anunciado. O ministério foi obrigado a retirá-los, sob o protesto de um CEO que ameaçou ir à Justiça para manter seu assento. Obviamente, ele estava ali para defender os seus próprios interesses, ou seja, jogar a pá de cal no Galeão.
A segunda vitória – mas nem tanto – foi convencer o governo federal a retirar os aeroportos do interior de Minas Gerais (Uberlândia, Uberaba e Montes Claros) do pacote de quem levasse o Santos Dumont. Da maneira que estava, a concessão só interessaria a uma empresa, a CCR, que já administra os terminais de Cofins e Pampullha (MG). Na verdade, nesse sentido, o Grupo de Trabalho fez um favor a Bolsonaro: livrou seu governo de um escândalo.
A mudança será boa para a empresa que vencer o leilão, que vai lucrar mais sem os terminais deficitários, e para o governo federal, que decerto conseguirá um valor maior pela outorga. Entretanto, do ponto de vista dos interesses do Rio, foi trocar seis por meia dúzia. Pois o que importa aos fluminenses é impedir que o edital permaneça permitindo um número de voos ilimitados para o Santos Dumont, inclusive internacionais.
Ora, se o argumento anterior era de que seria preciso aumentar a grade de voos porque isso compensaria o prejuízo do ente privado, então a conta agora mudou, e é nisso que nossos representantes no grupo de trabalho devem se concentrar agora. A união faz a força.
André Ceciliano (PT) é deputado estadual e presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj)
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