Rio - Os livros da escola espalhados em meio ao sangue na Rua Herculano Ribeiro, na Pavuna, dão a dimensão da tragédia da violência urbana que fez mais uma vítima fatal inocente nesta sexta, às 7h, no Rio.
A merendeira Derly Cruz Peixoto, de 76 anos, foi morta atropelada por criminosos em fuga que praticavam crimes na região. Ela estava levando a neta, Letícia de Oliveira, de 14 anos, para o colégio, como fazia todos os dias, quando foi atingida por um dos veículos. A adolescente escapou porque costumava andar mais rápido e estava alguns passos na frente da avó.
Segundo testemunhas, ela ainda foi arrastada por 300 metros e teve as pernas amputadas. A violência da batida quase derrubou um poste de cimento que ficou destruído. Um dos ocupantes do carro, que havia saído da cadeia há três meses, morreu. O outro, um menor, ficou ferido e levado a um hospital da região. O corpo da idosa foi levado para o Instituto Médico Legal (IML), no Centro do Rio.
A neta de Derly está em estado de choque. O bando era formado por oito criminosos que estavam em três carros: um Kia Sorrento, uma S10 e um Onix. Eles faziam arrastão nas ruas próximas.
Rotina alterada por causa da violência
Derly morava na Pavuna há mais de 20 anos, na Alameda Pai Benedito, a poucos metros do local onde perdeu a vida. Ela e a família tiveram a rotina alterada por causa da violência na região. Há cerca de um ano, Leticia foi assaltada. Para dar mais segurança, a avó passou a levá-la até o ponto de ônibus, de onde a menor pegava a condução para ir ao colégio, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. Em seguida, a merendeira pegaria o ônibus para o Centro do Rio, de onde entrava em outra condução para chegar ao local de trabalho, o Colégio Metodista Bennett, no Flamengo, na Zona Sul.
O filho da vítima, um policial civil, estava de plantão na Cidade da Polícia, na Zona Norte do Rio, e ficou em estado de choque ao saber da notícia. O homem foi amparado por colegas e uma ambulância precisou ser chamada para acalmá-lo.
Muito triste, um sobrinho da idosa, Carlos André dos Santos Lopes, de 38 anos, desabafou contra a escalada da violência na cidade e direcionou sua fala às autoridades. "Queria dar um recado para o governador: e quando morrer o filho dele? E quando morrer a mulher dele? Todo dia um ente querido morre nesse Rio de Janeiro. Uma pessoa maravilhosa, perder a sua vida assim..."
Guarda Nacional há poucos metros
Um parente da vítima, que não quis se identificar, contou que se mudou da região há um ano devido à violência. "Os criminosos estavam fazendo arrastão, vieram de carro desesperados e fizeram essa tragédia. Tive que tirar minha família daqui porque não estávamos aguentando de tanta violência", reclamou ele.
A rua onde aconteceu a tragédia é conhecida por registrar muitos assaltos. Nela, há diversas transportadoras. Além disso, a via é uma rota de fuga de criminosos para o Morro da Pedreira. Um residente, que não quis se identificar, relatou um assalto nesta quinta-feira e reclamou do pouco policiamento. "A Guarda Nacional fica na rotátoria, há pouco menos de 1km daqui. Se eles ficassem aqui, evitaria esse tipo de coisa", revoltou-se.
Reportagem dos estagiários Rafael Nascimento e Caio Bellandi, sob supervisão de Maria Inez Magalhães