Rio - Os investigadores da 21ª DP (Bonsucesso) tentam encontrar o local em que um traficante foi socorrido pelo médico sequestrado na madrugada de domingo a partir de três depoimentos e do rastreamento da ambulância roubada. Os bandidos pegaram o veículo na UPA do Complexo da Maré e levaram o médico e o traficante dentro até um lugar que seria uma clínica, provavelmente na Baixada.
Prestaram depoimento o médico sequestrado, o motorista da ambulância e o supervisor operacional da empresa Savior, que limpou o sangue do bandido do veículo antes da perícia chegar. Segundo a polícia, por volta de 1h30, traficantes da Vila do João, na Maré, trocaram tiros com policiais na Linha Amarela. Depois, socorreram um comparsa baleado para a UPA da Maré. A notícia foi publicada ontem pelo Extra e O Globo.
Na UPA havia três médicos: um pediatra e dois clínicos-gerais, sendo um homem e uma mulher. O clínico-geral atendeu o criminoso e observou que "estava com ferimentos no braço, cotovelo e antebraço esquerdos, 'completamente caído', tendo feito o atendimento básico e que ele deveria ser removido para hospital". No entanto, os traficantes queriam socorrer a quem eles chamavam de "chefe" em uma clínica clandestina. A polícia acredita que o traficante ferido seja Thiago Folly, o TH, chefe da facção TCP na Maré.
A supervisão da UPA foi forçada a pedir ambulância, que veio da unidade Engenho Novo. Em depoimento, o motorista disse que "foi recebido na Maré por cerca de 50 traficantes armados e obrigado a trocar de roupa com um deles dentro da ambulância". O paciente socorrido tinha "cabelos castanhos e escuros, era pardo e forte" a mesma descrição de TH.
O médico foi obrigado a entrar na ambulância e, antes de sair da favela, disse que "dois homens entraram no carro, fazendo perguntas sobre o quadro do paciente, aparentando ser conhecedores da área médica, devido às perguntas feitas". Uma mulher também entrou na ambulância como acompanhante. O médico disse que "por diversas vezes o ferido entrou em choque, em razão da quantidade de sangue perdida, tendo conseguido estabilizar minimamente o paciente". Após trafegar por "bastante tempo", a ambulância parou em um local, onde outros criminosos receberam o ferido. Ele, então, conta o colocaram em um carro preto, "sempre de cabeça baixa", e que foi deixado de volta na UPA da Maré. O médico não reconheceu os criminosos por fotos.
A ambulância foi devolvida às 11h de domingo, "por um homem branco, alto, aparentando 30 anos", segundo o supervisor da Savior. "Fizemos o cálculo e concluímos que a ambulância trafegou 111 Km com os criminosos", disse o delegado Wellington Vieira.
Sequestro não foi comunicado
Os investigadores querem saber o motivo de a Viva Rio, que administra a UPA Maré, não ter comunicado à polícia que um médico havia sido levado com uma ambulância. Em nota, a Secretaria Estadual de Saúde disse que “a Viva Rio informou à secretaria sobre o ocorrido após a liberação do médico” e que colabora com a investigação.
A Viva Rio não retornou aos contatos. Em depoimento, o médico disse que ficou refém por três horas e meia. A ambulância foi devolvida às 11h, mas a polícia só soube do caso no fim da tarde, após o registro feito na delegacia pela empresa Savior, responsável pela ambulância.
A polícia requisitou imagens das câmeras da UPA, das vias expressas por onde a ambulância teria passado (provavelmente a Washington Luiz) e do GPS do veículo. A polícia acredita que o traficante seja o TH ou outro bandido importante para o tráfico pela inscrição em um fuzil (Tropa do TH) abandonado na fuga para a Maré após o tiroteio com policiais e pela descrição física.
TH foi indiciado pela morte do soldado da Força Nacional Hélio Andrade pouco antes da Rio 2016, na Vila do João. O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio considerou inaceitável que qualquer profissional de saúde sofra violência no ambiente de trabalho.