A mãe de Marcos Vinícius se despede do filho no velório, no Palácio da Cidade. O corpo foi coberto com a blusa do colégio suja de sangue - Daniel Castelo Branco
A mãe de Marcos Vinícius se despede do filho no velório, no Palácio da Cidade. O corpo foi coberto com a blusa do colégio suja de sangueDaniel Castelo Branco
Por NADEDJA CALADO

Rio - Mais de 24 horas após a morte do estudante Marcos Vinícius da Silva, de 14 anos, durante operação policial no Complexo da Maré, a cúpula da Segurança Pública se mantém em silêncio. Não há explicações ou pedido de desculpas para a família do jovem, cujo corpo foi velado no Palácio da Cidade, coberto com a blusa de escola ensanguentada.

"Essa é a bandeira do meu filho, vai ser com esse pedacinho de pano que eu vou pedir justiça para o meu filho. Vou usar essa blusa aqui para pedir um país melhor, porque esse país está matando os inocentes, os inocentes estão sumindo. Isso aqui quem fez não foi a polícia despreparada, foi um policial despreparado", declarou a mãe do adolescente, a diarista Bruna Silva.

A operação da Polícia Civil na quarta, pela manhã, foi realizada por policiais da Delegacia de Combate às Drogas na busca por criminosos que mataram o chefe de investigações da especializada, na semana passada. Com a apoio de tropas de elite e do Exército, a própria polícia descumpriu norma assinada pelo governo na qual se comprometia a não realizar operações em horário escolar.

Questões enviadas à Secretaria de Segurança Pública sobre a operação na Maré - Arte O DIA

Iniciada às 9h, a ação provocou tiroteios no Complexo da Maré. Marcos Vinícius estava a caminho da escola, quando um tiro de fuzil o atingiu. Segundo perícia preliminar, a bala entrou pelas costas e saiu pela barriga. Ainda vivo, conseguiu conversar com a mãe e apontou que o disparo foi de policiais. "Quando eu cheguei ele disse que viu quem atirou nele, que foi de um blindado. 'Ele não viu que eu estava com roupa de escola, mãe?', me perguntou", disse Bruna.

Após baleado, outro drama: o atraso no socorro, que fez o secretário de Educação, Cesar Benjamin, clamar por telefone a cessão da operação ao secretário de Segurança, Richard Nunes. "Fiquei em contato direto com o secretário de Segurança solicitando a abertura das barreiras (para passagem da ambulância)", disse. "Houve uma perda de mais ou menos uma hora nessa negociação. Talvez essa hora tenha sido fatal". O jovem entrou às 10h na UPA da Maré, horário em que os médicos pediram sua transferência para o Hospital Getúlio Vargas, onde só chegou às 11h23. O prefeito Marcelo Crivella também criticou a ação da polícia. "Não aguentamos mais ver crianças inocentes morrendo em tiroteios que a experiência mostra terem tido pouco resultado no combate efetivo ao crime organizado", disse Crivella.

O Ministério Público se reuniu com a Chefia da Polícia Civil e solicitou esclarecimentos sobre o descumprimento das normas de operações; o relatório da operação e imagens realizadas. Também quer saber o motivo da ausência de ambulância no local, em descumprimento à decisão judicial. Moradores afirmaram que, do helicóptero, policiais atiraram em direção à comunidade. Mais de 50 marcas de balas no chão foram contabilizados. A Defensoria Pública informou que vai recorrer do pedido negado pela Justiça de proibir tiros a partir de helicóptero sobre comunidades.

A Delegacia de Homicídios ouviu ontem os policiais envolvidos na operação. Em nota, a Polícia Civil disse que o uso do helicóptero "se dá para a garantia da segurança de toda a população" e que não há registro de que alguém tenha sido atingido. O corpo do estudante foi enterrado ontem no São João Batista.

Na Vila Vintém, outra vítima de 14 anos
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Outro menino de 14 anos morreu, na quarta-feira à noite, vítima de tiro. Guilherme Henrique Pereira foi atingido por dois disparos feitos por bandidos que passaram atirando em um carro cinza na Rua Marechal Falcão da Frota, na Vila Vintém, em Padre Miguel. Segundo a família, ele voltava para casa de bicicleta, após ir cortar o cabelo, quando houve o ataque, que deixou ainda dois feridos.
O adolescente Matheus Atheus de Pereira de Azevedo, de 16 anos, e Carlos Antônio Lima Correia, de 34 anos, que teria um grau de deficiência mental, estavam próximos de Guilherme e também foram atingidos. Eles estão hospitalizados, com quadro estável. "Era um menino tão estudioso, gostava de soltar pipa, era cheio de amigos", disse o pai do jovem, o cozinheiro Roberto Carlos Ribeiro Natal, de 50 anos.
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