Entrevista coletiva na Superintendência da Polícia Federal, no Rio de Janeiro, sobre a operação Furna da Onça - Onofre Veras/Parceiro/Agência O Dia
Entrevista coletiva na Superintendência da Polícia Federal, no Rio de Janeiro, sobre a operação Furna da OnçaOnofre Veras/Parceiro/Agência O Dia
Por RAFAEL NASCIMENTO

Rio - O esquema de lavagem de dinheiro, loteamento de cargos públicos e mão de obra terceirizada na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) movimentou ao menos R$ 54 milhões, de acordo com Ricardo Saadi, superintendente da Polícia Federal. Até o momento, a PF cumpriu, 20 de 22 mandados de prisão - dez dos quais, contra deputados estaduais, cinco deles reeleitos este ano.

A Operação Furna da Onça foi deflagrada, na manhã desta quinta-feira, investiga um suposto "mensalinho" na Casa. Os valores chegavam a R$ 900 mil, segundo os investigadores. 

Entre os presos estão: Coronel Jairo (MDB), Luiz Martins (PDT), Marcelo Simão (PP), Marcos Vinícios “Neskau” (PTB), André Corrêa (DEM), Marcos Abrahão (Avante) e Chiquinho da Mangueira (PSC).Também foi alvo da operação o secretário estadual de Governo, Affonso Monnerat, apontado como o canal entre Alerj e Palácio Guanabara. Confira quem são os deputados e quanto recebiam no esquema criminoso.

Estão foragidos o presidente do Detran, Leonardo Jacob, e seu antecessor, Vinícius Farah, em cujas gestões, segundo a força-tarefa, lotearam-se cargos como parte das vantagens indevidas. 

De acordo com a investigação, que foi iniciada em 2011 e terminou em 2014, a organização criminosa era chefiada pelo ex-governador Sérgio Cabral, que pagava propina a deputados estaduais, para que patrocinassem interesses do grupo criminoso na Alerj. O "mensalinho" ia de R$ 20 mil reais a R$ 900 mil por mês.  

André Corrêa chega à sede da PF: ele é um dos presos por receber mensalinho e negou acusações - Estefan Radovicz / Agência O Dia

Cabral teria criado um fundo único onde o dinheiro era depositado. Em caso de necessidade de interferir em votações  — aprovar ou não —  eles pagavam para algum parlamentar. Entretanto Paulo Melo e Picciani, presidentes da Casa (na gestão do ex-governador) recebiam a propina mensalmente, segundo os agentes.

“Estima-se que o valor desviado e pago em propina seja de, pelo menos, R$ 54,5 milhões, dos quais uma parte foi financiada pelo sobrepreço de alguns contratos”, afirmou Ricardo Saadi, superintendente da Polícia Federal.

Loteamento de cargos no Detran era outra forma de coagir. De acordo com a PF, o órgão era o que mais mais loteava cargos. Paulo melo teve 40 indicações, Chiquinho da Mangueira 74 e Luiz Martins 137. “As investigações demonstraram que esses personagens lotearam o estado do Rio de Janeiro para viabilizar a execução dos seus interesses políticos. Alerj se tornou propinolândia”, declarou o procurador-regional da República, Carlos Aguiar.

Fora de controle

A delegada da PF, Xênia Soares, disse que o "mensalinho" durou quatro anos. "A operação é a continuação da Cadeia Velha, que vimos que esses pagamentos eram direcionados para representantes da Alerj, incluindo os ex-presidentes. Durante as investigações nós vimos que houve uma manipulação nos dados. Vimos que Albertassi e Paulo Melo, o dono do Detran, usavam os seus cargos em benefícios próprios", contou Xênia.

"Albertassi loteava cargos no Detran com colegas em uma espécie de coalizão para o crime. No primeiro momento, quando o doleiro Carlos Mirando disse que os deputados recebiam propina nós não sabíamos quais eram esses deputados", completou. 

De acordo com  a delegado, Carlos Miranda era responsável pela distribuição das propinas. No entanto, a "situação ficou tão grande" que ele perdeu o controle e terceirizou a distribuição de propina. "Isso passou a ser feito pelos irmãos Chebab", relatou.

"Tivemos acesso a uma lista de pagamentos a assessores desses deputados. Essas informações dão conta do que acontecia e nos mostram que há um trânsito de valor impensáveis. Só um desses assessores em 2016 conseguimos identificar R$ 32 milhões", finalizou.

'Propinolândia'

Para Carlos Aguiar, Procurador Regional da República, ao longo dos anos a Alerj se tornou uma "Propinolândia". "Essa organização é ainda atual e causa efeitos desastrosos ao Rio", afirmou. "Infelizmente, obtivemos provas de um sistema de corrupção desde o ex-governador Cabral que estabeleceu uma relação de promiscuidade de 'toma lá da cá' para que os deputados atuassem no interesse dessa organização criminosa", completou.

"Não estamos investigando deputados ou Alerj, e sim pessoas que se valiam de cargos para perpetuar seus poderes políticos. Eles lotearam o Rio em uma fatia de bolo e fizeram isso com um esquema de pagamento de dinheiro em espécie de propina", concluiu Aguiar. 

Dinheiro para o Carnaval

De acordo com Luiz Henrique Casemiro, superintendente da Receita Federal da 7ª Região, a organização agia com a certeza da impunidade.

"Chiquinho recebeu, entre dezembro de 2013 e fevereiro de 2014, R$ 3 milhões em propina para ser usado no carnaval da Estação Primeira de Mangueira", declarou.

Desses R$ 3 milhões, pelo menos R$ 200 mil foram pagos por Sergio Castro de Oliveira, o Serjão, ex-assessor de Sergio Cabral e um dos principais operadores do esquema que funcionava na Alerj.

Segundo Serjão, o pagamento foi feito perto da casa da mãe de Chiquinho, em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio. Em depoimento o doleiro disse que era comum um intermediário de nome Vivaldo (conhecido também como Fiel ou Fred) receber R$ 20 mil.

"Não conseguimos saber, no entanto, se esse valor (os R$ 3 mi) todo foi usado no Carnaval. Porém, o período em que foi pago essa propina mostra que pelo menos uma parte foi para o Carnaval. Essa é uma falência que descontrola o estado com esses esquemas", afirmou Casemiro.

Para Renata Ribeiro Baptista, procuradora da República, foi detectado movimentos incompatíveis com rendimentos: carros de luxos, imóveis, entre outros bens. "Eles já chegaram até a tentar declarar uma quantia muito grande do imposto de renda", disse.

Em nota, a assessoria do deputado Chiquinho da Mangueira declarou "que todas as acusações imputadas a ele através da operação 'Furna da Onça', realizada pela Polícia Federal, que o levou a prisão temporária no dia de hoje (08), são infundadas e totalmente inverídicas. Segundo o advogado Pablo Andrade, da equipe jurídica de Chiquinho da Mangueira, a medida foi completamente desarrazoada e ficará demonstrado que não houve qualquer ato ilícito praticado pelo deputado".

A assessoria do deputado André Corrêa publicou a seguinte nota em suas redes sociais: "Deus no controle sempre. Nunca envergonhei vocês. Confio na justiça do meu Estado e do meu País. Quem não deve não teme. Lamento que no momento que 44 deputados assinam um compromisso com minha candidatura à Alerj isto aconteça. Repito que estou tranquilo. Quem me conhece sabe meu modo de agir. Continuarei de cabeça erguida. Não tenho sequer advogado. Confio em Deus."

"O Ministério Público Federal (MPF) transformou a persecução penal em uma ação sem critério lógico. como se fosse uma loteria. Ressaltamos que o deputado Edson Albertassi nunca participou de qualquer ato criminoso durante seus mandatos e reafirma sua inocência”, declarou a defesa de Albertassi em nota.

"O sr. Vinicius Farah confia na Justiça e afirma que a situação será devidamente elucidada. Ele já se apresentou às autoridades em Brasília para os devidos esclarecimentos. Ele estava na cidade para agenda de trabalho", declarou a defesa de Farah.

Em nota, a Estação Primeira de Mangueira informou que, "apesar dos acontecimentos políticos recentes que motivaram a ausência temporária de seu presidente Chiquinho da Mangueira, todas as atividades da agremiação seguirão normalmente, assim como o seu planejamento para o carnaval 2019. A instituição, que completou 90 anos em abril, sempre estará acima das pessoas e possui um estatuto vigente que vem sendo cumprido em sua totalidade".

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