Rio - O governador Luiz Fernando Pezão, preso na manhã desta quinta-feira pela Polícia Federal (PF) na operação "Boca de Lobo", desdobramento das ações da Lava Jato no Rio, recebeu mais de R$ 25 milhões em propina entre os anos de 2007 e 2014, período em que foi secretário de Obras e vice-governador de Sérgio Cabral. E mais: a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, destacou na petição em que pede a prisão do governador do Rio e mais oito pessoas ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que ele substituiu Cabral no esquema criminoso e tinha operadores financeiros próprios.
"Cabia a Pezão dar suporte político aos demais membros da organização que estão abaixo dele na estrutura do poder público e, para tanto, recebeu valores vultosos, desviados dos cofres públicos e que foram objeto de posterior lavagem”, destacou a procuradora. Além dos mandados de prisão e e busca e apreensão, foram autorizados os sequestros dos bens de envolvidos, entre eles Pezão, no valor de R$ 39,1 milhões, montante do prejuízo causado, em valores atualizados. Raquel Dogde reforçou as acusações que pesam contra o governador em coletiva na manhã de hoje em Brasília.
"Há uma sucessão de pessoas partícipes ao longo do tempo, mesmo depois das prisões dos que lideravam. Houve uma nova liderança e é nessa perceptiva que aponta a figura de Pezão como novo líder e a inclusão de novos atores", disse a procuradora.
Em entrevista à imprensa na PF do Rio, o delegado Ricardo Saadi, superintendente regional da PF, disse que o grupo movimentou pelo menos R$ 40 milhões até julho deste ano, quando começaram as investigações. "Mesmo na crise financeira do estado, em que aposentados ficaram sem receber e passando necessidades, eles continuaram pressionando as empresas e recebendo propina", destacou.
A operação é resultado de delação premiada de Carlos Miranda, apontado como o operador da quadrilha chefiada por Cabral, com base em diversos documentos que comprovam que Pezão recebeu propina por oito anos. De acordo com Miranda, Pezão recebia ilegalmente uma mesada de R$ 150 mil quando era vice-governador e teria recebido dois prêmios no valor de R$ 1 milhão e um terceiro de R$ 300 mil para fazer obras em sua casa, em Barra do Piraí, no Sul Fluminense.
Raquel Dodge destacou que a organização criminosa chefiada por Cabral vem sendo desarticulada de forma progressiva, com o avanço das investigações. "A novidade é que ficou demostrado ainda que, apesar de ter sido homem de confiança de Sérgio Cabral e assumido papel fundamental naquela organização criminosa, inclusive sucedendo-o na sua liderança, Luiz Fernando Pezão operou esquema de corrupção próprio, com seus próprios operadores financeiros", diz a procuradora na petição.
A origem das investigações contra Pezão começou com a colaboração premiada de Carlos Miranda homologada no Supremo Tribunal Federal (STF) e documentos apreendidos na residência de um dos investigados na Operação Calicute. Elas deram origem às diligências que permitiram aos investigadores complementarem as provas.
Foram analisadas provas documentais como dados bancários, telefônicos e fiscais. A procuradora-geral explicou que a análise do material revelou que o governador Pezão e assessores integraram a operação da organização criminosa de Sérgio Cabral e que o atual governador sucedeu Cabral na liderança do esquema criminoso.
O pedido destaca que o esquema continua ativo e manter o governador do Rio preso poderia atrapalhar as investigações e a recuperação dos valores movimentados pelo grupo. "Há registros documentais, nos autos, do pagamento em espécie a Pezão de mais de R$ 25 milhões no período 2007 e 2015. Valor absolutamente incompatível com o patrimônio declarado pelo emedebista à Receita Federal".
"Existe uma verdadeira vocação profissional ao crime, com estrutura complexa, tracejando um estilo de vida criminoso dos investigados, que merece resposta efetiva por parte do sistema de defesa social", pontua um dos trechos da petição.
Após a prisão de Pezão, Wilson Witzel, governador eleito em outubro para cumprir mandado a partir de 2019, disse que a transição não será afetada. Ele também disse confiar na 'justiça e na condução dos trabalhos pelo Superior Tribunal de Justiça e pela Polícia Federal'
Boca de Lobo
A operação que prendeu o governador do Rio foi apelidada de "Boca de Lobo", em referência aos bueiros instalados em vias públicas para o escoamento das águas da chuva drenadas pelas sarjetas com destino às
galerias pluviais. A alusão é por conta dos desvios de recursos, revelados nas diversas fases da Operação Lava Jato, "que causa a sensação na sociedade de que o dinheiro público vem escorrendo para o esgoto", diz a Polícia Federal.