Dois dias antes da ação que resultou na morte do músico Evaldo Rosa, soldados do Exército já haviam feito disparos de fuzil contra Christian Felipe Santana, de 19 anos, que estava na garupa da moto de um amigo. Christian também acabou morrendo. A blitz ocorreu na sexta-feira, em Guadalupe, mesmo bairro onde Evaldo foi atingido. Se não bastasse a dor de Cristiane de Almeida, mãe do rapaz, de 42 anos, ela também não pôde reaver imediatamente os pertences que estavam com o filho no momento em que ele foi baleado. Terá que aguardar em casa para recebê-los de volta. "Se eles socorreram o meu filho, já morto mesmo, e o levaram para o hospital, eles não tinham que ter tirado nada dele. Tinham que ter deixado ele ir para o hospital com tudo que ele tinha", criticou.
De acordo com Silvia Ramos, pesquisadora do Núcleo de Violência da Universidade Cândido Mendes, se houvesse punição exemplar no primeiro episódio, a morte do último domingo não teria ocorrido. "Tudo indica que houve ausência de protocolos por parte de soldados do Exército, que não estão preparados para fazer trabalho de policiamento. A punição dos envolvidos na primeira morte poderia ter evitado a segunda tragédia", avalia.
A especialista condena o fato de os militares terem atirado antes de averiguarem a situação. "É um erro decorrente de excesso de uso da força letal. Eles atiraram como primeira opção, porque suspeitavam que fossem criminosos dentro do veículo", afirma Silvia Ramos.
Ainda de acordo com a pesquisadora, soldados com menos experiência podem ser influenciados por determinados posicionamentos políticos. "Os agentes não matam porque um político está mandando matar. Eles sabem que isso muda rápido. No entanto, agentes inexperientes podem, sim, sofrer influência de discursos de legitimação do uso excessivo da força", alerta.
Outros casos parecidos chamam atenção. No ano passado, o vendedor Diego Augusto Ferreira também estava em uma moto quando foi morto, após furar uma blitz do Exército, em Magalhães Bastos. O rapaz estava a menos de 800 metros da porta de casa. Essa foi a primeira morte provocada pelas Forças Armadas desde o início da intervenção federal na Segurança Pública do estado, iniciada em fevereiro daquele ano.
Em 2015, soldados da Força de Pacificação que atuavam na Maré efetuaram disparos contra o carro ocupado pelo estoquista Vitor Santiago Borges. A vítima foi atingida por dois disparos de fuzil, sendo um no tórax, que arrancou um pedaço de seu pulmão, e outro na perna esquerda, que acabou sendo amputada.
Já em 2013, o recruta da PM Denis Roberto Filho foi baleado nas costas após furar uma blitz do Exército, em Deodoro.
* Estagiária sob supervisão de Herculano Barreto