Mulher de Evaldo se desespera no sepultamento do marido - Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia
Mulher de Evaldo se desespera no sepultamento do maridoReginaldo Pimenta / Agencia O Dia
Por Rachel Siston*

Rio - Foi enterrado no fim da manhã desta quarta-feira o corpo do músico Evaldo Rosa, morto pelo Exército no último domingo, em Guadalupe, Zona Norte do Rio, quando passava de carro com a família por um grupo de militares. O veículo em que estava com os parentes, incluindo o filho de 7 anos, foi atingido por 80 tiros. Ele morreu na hora e o sogro dele e um catador de rua ficaram feridos.

Na primeira nota do Comando Militar do Leste (CML) sobre o fato militares disseram que os soldados atiraram contra criminosos que praticaram assalto na área respondendo a uma injusta agressão por parte deles. Após o caso ter repercussão e ficar provado que no carro havia uma família o CML informou que iria apurar o caso e, no dia seguinte, prendeu dez militares envolvidos na ação.

Em protesto pela morte do amigo Evaldo, Carlos Marques Sampaio levou bandeira do Brasil com manchas que simbolizam sangue - Rachel Siston / Agência O DIA

O sepultamento foi realizado no Cemitério de Ricardo de Albuquerque, no bairro de mesmo nome, também na Zona Norte da cidade, onde quase 200 pessoas, entre amigos e parentes, se reuniram para prestar última homenagem ao músico. Um deles é Carlos MarquesSampaio, amigo da família e assistente social que atua na Comunidade do Muquiço e que levou uma bandeira do Brasil com manchas vermelhas como se fossem sangue.

"Essa bandeira simboliza um tiro na democracia. Um tiro no nosso direito de ir e vir. Um tiro na nossa cidadania. Um tiro na nossa liberdade. Não sei se vamos poder continuar andando nas ruas onde estamos acostumados a andar", protestou Donato.

Ele também criticou o Exército. "Até agora, nem familiares e nem amigos, fomos procurados pelas autoridades, nem pelos militares. O governo do estado não se manifestou. O governo federal não se manifestou, e nós estamos esperando uma satisfação", reclamou ele.

"Somos há mais de 50 anos vizinhos do Exército, que nunca veio falar conosco, nunca promoveu um tipo de ação naquele lugar, e quando vem, vem para dar tiro, para mostrar arma, nos reprimir", lamentou Donato.

Ele disse, que espera, também, punição para quem comandou a ação que vitimou Evaldo ,e foi enfático quando perguntado sobre a possível saída dos militares da prisão ao final da audiência de custódia, que acontece nesta quarta-feira.

"Nós recebemos essa notícia com indignação. Queremos deixar ressaltado que é bem possível que aqueles que estavam ali e que apertaram o gatilho não são os reais responsáveis dessa ação. Qualquer pessoa que já passou por uma carreira militar sabe que um soldado, um cabo, um sargento não tem autorização para disparar um gatilho. Alguém estava ali e autorizou essa barbárie essa execuação sumária. Alguém mandou atirar e quem mandou também precisa responder", disse ele.

Donato contou que os moradores da comunidade estão com medo. "Eu sou negro e tenho um carro aprecido com o do Evaldo. Quero saber se quando eu sair com minha família eu serei alvejado igual ao Evaldo. Queremos saber o que será de nó daqui pra frente. Esse será o modus operandi do Exército? Isso será naturalizado na nossa comunidade? A comunidade está com medo. Não sabemos o que ainda está por vir", contou Donato, que fez um apelo às autoridades.

"Deixo aqui uma súplica, um clamor da comunidade do Complexo do Muquiço: nós queremos ouvir e ser ouvidos, queremos justiça. Evaldo era trabalhador, era uma família dentro do carro", finalizou ele.

Homenagem com samba

Amigos e familiares do músico fizeram uma homenagem com samba durante o enterro. Emocionados, eles cantaram músicas como "Não deixe o samba morrer", de Alcione, e "A amizade", do grupo Fundo de Quintal. Em choque, a viúva Luciana dos Santos Nogueira precisou ser amparada.

Amigos cobraram por Justiça para o caso de Evaldo, que estava a caminho de um chá de bebê quando foi surpreendido pelos disparos dos militares.

*Estagiária sob supervisão de Maria Inez Magalhães

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