WhatsApp - Reprodução
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Por Nathalia Duarte

Rio - Nas últimas horas um áudio de WhatsApp tomou conta da internet. Nele, um suposto funcionário de uma padaria em Botafogo se recusa a ir trabalhar devido às fortes chuvas e xinga o patrão. O conteúdo viralizou e milhares de pessoas compartilharam a mensagem, saindo em defesa do funcionário revoltado.

Logo se descobriu que o áudio em questão não é verdadeiro. O trabalhador que fala nele não existe, muito menos um "Seu Armando", dono da padaria em Botafogo. O conteúdo foi produzido por um canal no YouTube e não passou de uma brincadeira. Mas, com a velocidade da internet, o áudio tomou grandes proporções e consequências: de pessoas que desejavam dar um novo emprego ao trabalhador a um protesto marcado na porta da suposta padaria contra 'Seu Armando' e a favor de um boicote.

Após a brincadeira e os "resultados", a pergunta que fica é: Por que as pessoas se deixam levar por qualquer coisa que recebem nas redes sociais? Como um simples áudio pode tomar conta de milhares de celulares e gerar uma resposta coletiva tão grande?

Para a Diretora de Conteúdo da Ecoar Educação para Mídias, Mônica Chaves, a questão envolve diversos aspectos. Um deles é que o ambiente virtual reflete a maneira como nos relacionamos no mundo "real". 

"Quando interagimos com os outros na internet, esquecemos que tem uma pessoa de carne e osso do outro lado. Como não vemos, é muito mais fácil sermos levados ao erro. Além disso, existe um mecanismo cognitivo que é uma tendencia a creditar em coisas que confirmam o que a gente já acredita. Se chama de "viés de confirmação". Essa tendencia é uma das armadilhas. Quem nunca teve vontade de xingar o patrão? Com isso, se você recebe esse áudio que faz o que você tem vontade, você se identifica e acredita nele", explica.

Criador do Museu do Meme, da Universidade Federal Fluminense, Viktor Chagas explica a relação de identificação entre quem escutou o áudio e o personagem dele.

"No caso do áudio do Seu Armando, o narrador é uma pessoa comum (o empregado), a situação é banal e cotidiana (os problemas de mobilidade urbana, os efeitos das chuvas), mas há um exagero quase caricato na reação do sujeito (a exaltação, o xingamento) e uma subversão da ordem (o empregado esculhambando o patrão). O empregado é um herói subalterno, um sujeito que se revolta contra a opressão e a exploração, e é por isso que o áudio desperta o riso e envolvimento de quem o escuta".

Uma maneira de fugir dessa armadilha e não cair mais nas famosas "fake news", seria começar duvidando de tudo o que se recebe. No caso do áudio "Seu Armando", por exemplo, Mônica explica que seria fácil identificar, bastava prestar atenção. "Uma coisa no áudio que chama atenção é que o cara fala que não vai à padaria encher saco de farinha. Quem trabalha em padaria não enche saco de farinha. A gente precisa aprender a lição de tentar identificar, criar formas, de desconfiar do que se recebe", aconselha.

Algumas pessoas chegaram a identificar a suposta padaria e até um print da fachada do local foi divulgado nas redes sociais. Isso deixou os funcionários do local apreensivos. Mas, ao contrário do pensamento coletivo, todo mundo está vulnerável a ser a próxima vítima da "fake news". 

"Se nós como um todo não pararmos com esse tipo de atitude, de acreditarmos em qualquer coisa que nos mandam e compartilharmos, todos estamos vulneráveis de ser uma vitima um dia. É o perigo dos linchamentos virtuais. A gente em geral fica prestando atenção, critica e questiona as supostas pessoas que produzem as fake news. Estamos muito focados no outro que produz, como se quem as produzisse fosse uma pessoas específica com má intenção. Precisamos olhar pro papel que estamos desempenhando nesse ciclo da informação, porque a gente também está passando adiante a informação sem reflexão", explica Mônica.

Já para Viktor, a saída seria ampliar a capacidade de questionar das pessoas: "Há um conjunto de estudos que provam que as pessoas que compartilham notícias falsas, por exemplo, para ficarmos apenas nos conteúdos informativos (o que não é o caso do áudio do Seu Armando), passam adiante essas notícias não porque acreditam que são verdadeiras, mas porque elas corroboram suas próprias visões de mundo. Mesmo quando descobrem se tratar de notícias falsas, isso não as faz deixar de compartilhar esses conteúdos. A solução, portanto, não passa por tentarmos conter o compartilhamento indiscriminado, ele é apenas um sintoma. A solução passa por ampliarmos o horizonte crítico dos indivíduos"

E uma dica simples que Mônica dá para aqueles que querem evitar passar fake news é: "A gente ouve muito as pessoas falando 'não sei se é verdade essa informação, mas vou compartilhar'. O que eu aconselho é: na dúvida, não compartilhe. Delete".

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