Garçonete reclama de abandono do poder público no desabamento de prédios na Muzema - Gustavo Ribeiro / Agência O Dia
Garçonete reclama de abandono do poder público no desabamento de prédios na MuzemaGustavo Ribeiro / Agência O Dia
Por GUSTAVO RIBEIRO

Rio - "O Rio está abandonado. Nenhum lugar tem regra. Nenhum lugar tem habitação. Se tivesse, não teria acontecido isso. Não construiriam prédios onde era para ser uma floresta, onde era para ter só árvores". Enxugando as lágrimas pelo tio morto soterrado na comunidade da Muzema, a garçonete Taylane Pontes, 25, ainda aguardava, às 18h desta sexta-feira, as buscas por dois primos, de 15 e 9 anos, desaparecidos nos escombros. Ela lamenta o abandono do poder público.

Segundo Taylane, a Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros estiveram no local pela primeira vez hoje, quatro dias após o temporal de segunda-feira, depois que os dois prédios já tinham desabado. O tio da garçonete, Raimundo Nonato do Nascimento, foi encontrado morto nas primeiras horas da manhã. Dois filhos dele, Rafael, de 5, e Pedro, de 3, além de sua mulher, foram resgatados com vida.

A aflição da família continua durante as buscas por Lauane, de 15 anos, e Isac, de 9. As vítimas estavam dentro do apartamento da família, no sexto andar de um dos edifícios, no momento do desabamento. "Vou ficar aqui até o último sair. Se Deus quiser", diz Taylane, que permanece no local desde o início da manhã. Por alguns instantes, os parentes chegaram a imaginar que Raimundo estava vivo, mas depois descobriram que outro Raimundo Nonato tinha sido socorrido com vida.

Assim como diversas famílias que vivem na região, Raimundo Nonato do Nascimento se mudou para a Muzema para realizar o sonho da casa própria. Ele trabalhava como motorista de van e vendeu o veículo para dar entrada no imóvel, onde morava com a mulher e os filhos há apenas quatro meses.

"Ele era motorista de van. Tinha a própria van dele. Ele lutou muito. Sempre teve muito sacrifício pra ter as coisas, sempre foi muito esforçado. É um homem que sempre ajudou muito as pessoas. Ele se foi assim, sabe? Dói. Tava tão feliz com a casinha dele, com os filhos, com a esposa. Se foi...", desabafa a sobrinha.

Abandono da prefeitura e falta de informações

A sensação de desamparo do poder público, relatada por Taylane, pode ser vista bem antes do acesso ao Condomínio Figueira do Itanhangá, onde os prédios vieram abaixo na manhã desta sexta-feira. Ao longo de toda a Estrada do Itanhangá até a entrada para a comunidade da Muzema, moradores ainda convivem com lixo, lama, entulho e alagamentos provocados pelas chuvas de segunda e terça-feira.

Já dentro do condomínio, edificações construídas irregularmente estão comprometidas. Muita água ainda escorre do morro, das pedras e das construções. Quem vive no local, como Taylane, tem medo de novos desastres.

"Nós estamos muito abandonados. Estamos à mercê. O que aconteceu hoje foi uma fatalidade, não só pra mim, mas para outras famílias que perderam familiares ou que estão esperando para reencontrar, como eu também. Me entristece, porque não é só o estado. O país está abandonado por pessoas que eram para cuidar de nós. Era pra gente ter proteção, pra gente ter tudo, e não temos nada. Saneamento está precário, saúde está precária. Tudo está precário", diz a garçonete, sem saber até que horas a angústia vai continuar.

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