Rio - Bandidos invadiram a residência do babalorixá Jonyy de Ode na madrugada desta quarta-feira, em Maricá, na Região dos Lagos, e quebraram todos os objetos sagrados de seu terreiro. Em vídeo comovente entregue à Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), Jonyy narra, desesperado, a violência imposta pelos invasores, que também entraram em sua casa e destruíram paredes e outros objetos de cultos. Jonyy, membro do grupo de estudos de Ifá, não estava em casa, localizada no bairro Jardim Atlântico. “Olha o que fizeram comigo, gente! Quebraram tudo que construí com muita dificuldade. Minhas ferramentas de Orixás... Socorro, autoridades! Precisamos de políticas públicas que nos defendam”, apelou, chorando.
De acordo com o o babalawo Ivanir dos Santos, interlocutor da CCIR, o número de ataques criminosos a terreiros já passa de 20 este ano. “É inadmissível que templos religiosos sejam violados e destruídos. Precisamos respostas rápidas sobre esses terríveis crimes de intolerância religiosa. Como sacerdote e cidadão eu exijo respostas e a punição exemplar sobre os algozes de Maricá e outros municípios", afirmou Ivanir.
De acordo com Ivanir, na semana passada, em campos, no Norte Fluminense, outro caso de intolerância religiosa foi registrado. Uma casa de candomblé foi invadida, tendo seus proprietários expulsos. Segundo denúncias feitas à polícia, traficantes invadiram um barracão “com gritarias e desaforos”. O dirigente da casa, que não quis se identificar, por medo de represálias, não prestou queixa, deixando o local. Recentemente, uma mãe de santo, no mesmo município, vendeu a casa onde mantinha cultos e hoje vive de aluguel em outro bairro, porque "recebeu um recado, de que ali não poderia bater tambor”.
Para Ivanir dos Santos é preciso mais rigor identificar os agressores e aplicar punições. "Os casos continuam acontecendo. No cenário religioso, a liberdade de culto e de crença ainda não é uma realidade para todas e todos cultuarem os seus sagrados".
Violência sem fim
Levantamento da Secretaria Estadual de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos (SEDHMI), por exemplo, segundo lembrou Júlio Júnior, constatou que só do início de 2017 até o dia 20 de abril de 2018, foram contabilizados 112 casos de intolerância religiosa no estado. A Capital Fluminense concentrou 55% dos casos, seguido por Nova Iguaçu (12,5%) e Duque de Caxias (5,3%). O tipo de violência mais praticado no Estado é a discriminação, com 32%; a depredação de lugares ou imagens aparece com 20% dos casos, enquanto a difamação vem em seguida, com 10,8% dos registros. Com relação à orientação religiosa das vítimas, o Candomblé, com 30%, seguido de Umbanda, com 22%, são os segmentos religiosos que figuram com os maiores alvos da intolerância religiosa no Estado. As demais religiões aparecem com 15% do total.
Nos três últimos anos crescerem os ataques a terreiros em Nova Iguaçu, que chegaram a ser alvos de ataques em série. Diversos locais foram fechados após episódios seguidos de violência. Somente num semestre, sete centros religiosos de matrizes africanas sofreram depredações. Alguns foram incendiados. Além de quebrarem imagens sagradas dentro dos locais, os criminosos ainda levavam objetos como geladeira e freezer. No fim de agosto de 2017, uma senhora chegou a ser apedrejada por ser praticante do candomblé.
Os crimes são investigados pela Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi). De acordo com a Polícia Civil, há casos registrados com violações de domicílio, constrangimento ilegal, danos, furtos, agressões, além de muitos relativos ao artigo 20 da Lei Caó (7716), referente ao crime de racismo. A instituição não comenta investigações em andamento.