Com salários atrasados, a servidora Cláudia Batalha passou a recolher latinhas de alumínio para bancar os gastos - Alexandre Brum / Agencia O Dia
Com salários atrasados, a servidora Cláudia Batalha passou a recolher latinhas de alumínio para bancar os gastosAlexandre Brum / Agencia O Dia
Por RENAN SCHUINDT

Rio - Cláudia Maria Batalha levanta da cama antes de amanhecer. Ela aproveita a pouca movimentação e sai de casa às 5h para catar latinhas de alumínio. Lá, até a energia elétrica foi cortada por falta de pagamento. Com o dinheiro da venda no ferro-velho, compra medicamentos para o bisneto, com uma doença degenerativa rara que afeta os músculos. Em seguida, recolhe madeira para cozinhar em um fogão improvisado com tijolos no quintal da casa onde mora, no bairro São Bernardo, em Belford Roxo, na Baixada. Foi a forma que ela encontrou para minimizar os problemas causados pela prefeitura, em estado de calamidade pública desde 2016. Servidora pública cedida ao Conselho Tutelar, Cláudia já contabiliza cinco meses de atrasos no salário.

A rotina enfrentada por Cláudia já traz transtornos psicológicos. "Os problemas só estão se agravando. Até para dormir tem sido difícil", desabafa. Além dela, há outros funcionários com atrasos em vencimentos desde 2016. Realidade que contrasta com despesas milionárias do poder público. Isso inclui a encenação da Paixão de Cristo, que ocorreu na sexta-feira. Entretanto, a prefeitura esclarece que a verba de quase R$ 4 milhões está destinada a cobrir gastos de serviços previstos em pelo menos cinco pastas. Parte desse montante foi destinado para o evento da semana passada, que integra o calendário cultural da cidade há nove anos.

Dívidas desde 2016

Outros servidores também reclamam da situação. "Na Saúde, ainda temos os quatro últimos salários de 2016 para receber. Além disso, resta pagar o 13º. A única resposta que tivemos da prefeitura é que ela não iria se responsabilizar por despesas da gestão anterior", reclama uma servidora, que prefere não se identificar, com medo de represálias. Para um aposentado, que também optou pelo anonimato, a quebra de compromisso em relação às dívidas de 2016 foi uma decepção. "Houve um acordo na Justiça, onde se estabeleceu que o pagamento seria feito em oito parcelas. Desse total, a prefeitura pagou apenas cinco. A última vez foi em agosto de 2017. O que não podemos aceitar são os gastos com festas enquanto tem gente passando necessidade", argumenta.

Prefeitura reconhece falha

Procurada pelo O DIA, a Prefeitura de Belford Roxo atribuiu o atraso no pagamento dos salários de Cláudia a um problema na folha de ponto do Conselho Tutelar, que não registra o nome da servidora. Em nota, informou que a falha foi resolvida e se comprometeu a quitar a dívida nesta semana. A prefeitura diz, ainda, esperar a melhora do fluxo de caixa para zerar os vencimentos atrasados que se arrastam desde 2016, respeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Outros gastos polêmicos

Em julho de 2017, O DIA revelou o desejo da Prefeitura de Belford Roxo em demolir o portal que ficava na entrada do município, construído durante a gestão de Jorge Júlio da Costa dos Santos, o Joca, o primeiro prefeito desde a emancipação, assassinado em 1995. Na ocasião, moradores lamentaram a decisão do prefeito Wagner dos Santos Carneiro, o Waguinho (MDB). A obra foi orçada em R$ 205 mil e começou nove meses depois da demolição. O assunto virou polêmica, já que a antiga estrutura não oferecia qualquer risco de queda.

As principais queixas da população também eram a falta de serviços públicos e os salários dos servidores atrasados. Em dezembro do ano passado, o Ministério Público pediu o afastamento de Waguinho do cargo por irregularidades que configuram improbidade administrativa. A derrubada do pórtico, a criação de 20 secretarias e a demolição de uma creche foram citadas pela ação civil pública. Agora, há outras denúncias de gastos desnecessários, como um investimento de R$ 1 milhão para construção de 16 praças.

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