A presença de jacarés no entorno do Complexo Lagunar de Jacarepaguá tem sido muito constante - Divulgação
A presença de jacarés no entorno do Complexo Lagunar de Jacarepaguá tem sido muito constanteDivulgação
Por FRANCISCO EDSON ALVES

Rio - Ameaçados pelo desequilíbrio ecológico provocado por ações humanas, segundo especialistas, animais silvestres e exóticos estão sendo expulsos gradativamente do que resta de florestas e recursos hídricos, seus habitats naturais, e ocupando outra selva, a de pedra, em meio aos espaços urbanos em todo o Estado do Rio. Em virtude de desmatamentos, construções irregulares, aterros clandestinos e outros fatores degradantes da natureza, a presença de bichos como preguiças, jacarés, cobras, micos, capivaras, falcões, gaviões, morcegos, jacarés e até onças, estão cada dia mais presentes em calçadas, ruas, condomínios e até entrando em quintais, escolas e shoppings.

Na Zona Oeste, por exemplo, em Jacarepaguá e Recreio dos Bandeirantes, tornou-se comum bombeiros serem chamados para resgatarem jacarés-de-papo-amarelo das ruas, onde moradores se arriscam fazendo selfies ao lado das feras, e até de piscinas residenciais. No dia 12, conforme O DIA publicou, vídeo postado pela internauta Clarisse Terran, mostrando um jacaré 'passeando' numa calçada no Bosque da Freguesia, viralizou nas redes sociais.

"Aos meus amigos que se preocuparam depois da chuva, meu muito obrigada, estamos bem. Hoje fui dar uma caminhada no Bosque da Freguesia e a vizinhança está bem tranquila...", ironizou, Clarisse, na legenda de uma vídeo mostrando jacaré de quase dois metros andando pela calçada.

De acordo com o fundador do Instituto Jacaré, o biólogo Ricardo Freitas Filho, a instituição já capturou cinco jacarés este ano em áreas públicas do Rio. "Sem recursos suficientes, não conseguimos atender a outros chamados. Ano passado fizemos 25 resgates de jacarés na cidade", lembrou Ricardo.

"A convivência dos cariocas com animais silvestres é irreversível, devido ao quadro atual de desmatamentos, poluição e violência urbana. Temos que aprender a dividir o planeta com os bichos, harmoniosamente. Do contrário, desiquilíbrios ambientais colocarão em risco a própria sobrevivência humana", reforça o alerta que dá em palestras. Ainda segundo Ricardo, a maioria das espécies só é agressiva quando atacada. "Mas fazer selfies com jacarés, como ocorre muito na Zona Oeste, é uma insanidade", adverte.

Na terça-feira passada, o susto foi com uma cobra, encontrada próxima a mochilas de crianças dentro da Creche Municipal Sempre Vida Loreto, no Galeão, na Ilha do Governador. De acordo com bombeiros do 19º GBM (Ilha), o réptil, de aproximadamente 30 centímetros, não feriu ninguém e foi levado para uma área de preservação.

"Ambientes onde os animais vivem naturalmente, como no que sobrou de manguezais e brejos dos maciços da Tijuca e Pedra Branca, vêm sendo bombardeados direta e indiretamente pela nociva presença humana, além de esgotos, lixos e caça", afirma o biólogo Mário Moscatelli.

Paulo Maia, ecologista da SOS Aves e Cia, diz que sua ONG socorre ao menos dez bichos silvestres feridos em áreas urbanas a cada 24 horas. "Hoje só há 10% de Mata Atlântica no Rio. Os bichos estão sendo expulsos", lamenta.

Cresce número de resgates

Os bichos estão alcançando áreas habitadas com mais frequência também na Região Metropolitana e nos municípios do interior do estado. Em Niterói, segundo a prefeitura, em 2018, o governo municipal resgatou 41% a mais de animais silvestres em relação ao ano anterior.

Só este ano, no primeiro trimestre, já foram feitos outros 424 salvamentos, acionados pelo telefone 153 (aumento de 38.56% em relação ao mesmo período de 2018). Na lista dos capturados estão atobás, tartarugas, filhotes de gambás, corujas, porcos-espinhos, bichos-preguiça, tamanduás, capivaras, caranguejos e cobras.

Em Macaé, no Norte Fluminense, uma surpresa: dez câmeras fotográficas digitais, com sensores especiais, foram acopladas a árvores do Parque Municipal Atalaia, reserva da Mata Atlântica, e flagraram, no período noturno, 18 animais de grande e médio portes, como onça parda, gato do mato, cutia, entre outros.

O projeto, que é desenvolvido desde 2016 por pesquisadores orientados pelos professores de Zoologia, Pablo Gonçalves, e de Ecologia, e Malinda Henry, com apoio da Secretaria de Ambiente e Sustentabilidade, faz parte do Mapeamento e Conservação de Mamíferos Silvestres na Bacia do Rio Macaé (RJ).

Jacaré tomam a Zona Oeste

Ricardo Freitas Filhos, do Instituto Jacaré, lembra que a presença do réptil nas ruas e próximos a moradias é cada vez maior no entorno do Complexo Lagunar de Jacarepaguá, onde existem cerca de 4 mil animais da espécie. Em contrapartida, a população ao redor foi a que mais cresceu no Rio nos últimos 16 anos, com mais de 400 mil habitantes e centenas de novos empreendimentos imobiliários. Muitos deles, clandestinos, ligados à milícia.

Na Via Dutra, resgates de animais são frequentes. A concessionária CCR NovaDutra firmou parceria com o Centro de Reabilitação da Universidade Vale do Paraíba (Univap), em São José dos Campos (SP). É para lá, por exemplo, que foi encaminhada uma preguiça apreendida recentemente em Resende.

"Cerca de 200 colaboradores da concessionária foram treinados com conteúdos teóricos e práticos sobre como identificar, manejar e remover animais domésticos e silvestres", ressalta a gestora de Relações Institucionais e Sustentabilidade da CCR NovaDutra, Carla Fornasaro. 

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