O músico Evaldo Rosa foi morto atingido por nove tiros - Arquivo Pessoal
O músico Evaldo Rosa foi morto atingido por nove tirosArquivo Pessoal
Por RENAN SCHUINDT
Rio - A Justiça Militar ouviu, nesta terça-feira, sete testemunhas de acusação no caso na ação de militares do Exército que fuzilaram o carro de uma família em Guadalupe, Zona Norte do Rio. Na ocasião, o músico Evaldo Rosa dos Santos e o catador Luciano Macedo, que o tentou socorrer, foram baleados e morreram. Uma nova perícia constatou que os envolvidos dispararam mais de 200 vezes e 63 projéteis foram encontrados no carro do músico. O Superior Tribunal Militar (STM) deve se reunir na próxima quinta-feira para retomar o julgamento do pedido de liberdade aos nove militares presos. A audiência foi interrompida após o voto de quatro ministros, com três votos favoráveis ao pedido de liberdade e um voto contrário. 
Além das sete testemunhas de acusação, Sergio Gonçalves de Araújo, o sogro de Evaldo que estava no banco do carona quando também foi baleado, foi um dos depoentes. A pedido do Ministério Público, o primeiro a ser ouvido foi Marcelo Bartoly, motorista do Honda City que havia sido roubado minutos antes dos militares efetuarem os disparos contra o veículo do músico.
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De acordo com Marcelo, foi possível ouvir em dois momentos distintos os disparos. No entanto, o rapaz não soube precisar se os tiros teriam partido dos militares ou bandidos. "Foi um barulho muito alto, mas não deu para ver quem atirou. Só deu tempo de se abaixar e correr", afirmou. Ainda segundo a testemunha, duas mulheres que passavam pelo local o ajudaram a procurar abrigo.

A testemunha disse ainda que, no momento da ação. não foi capaz de reconhecer os assaltantes, mas lembrou algumas características. "Fui rendido por três bandidos. Um deles era muito jovem e franzino. Eles estavam armados com pistolas".
Visivelmente abalada, a viúva de Evaldo, Luciana dos Santos Nogueira foi a segunda a depor. De acordo com a técnica de enfermagem, a falta de socorro por parte dos militares foi um fator determinante para a morte do marido. "Eu desci do carro desesperada em busca de ajuda. Muitas pessoas vieram nos socorrer, mas quando os militares se aproximaram, já atirando, as pessoas correram com medo. Os soldados debocharam, riram e não prestaram ajuda", disse.

Segundo Luciana, o socorro foi prestado pelos Bombeiros, mas o marido já estaria sem vida. "Perdi a melhor pessoa. Perdi meu melhor amigo. Eles não tinham motivos para fazer isso. Ainda de acordo com a viúva, no dia do ocorrido, o filho do casal que estava no banco traseiro vinha abraçado ao pai, por trás do assento. "A blusa do meu filho ficou com a mancha de sangue do pai. Eles eram muitos apegados um ao outro", relatou.

Luciana, que já estagiou na Hospital da Força Aérea, no Galeão, disse ainda que chegou pedir calma ao marido quando o viu baleado. "Eu pedia para ele manter a calma porque vi que se tratava do Exército e que eles estavam vindo para ajudar, mas não foi o que aconteceu", finalizou.
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A terceira testemunha a depor foi Dayane, viúva de Luciano, catador de recicláveis que tentou ajudar Evaldo e que também acabou morto. "Quando começaram os tiros eu e meu marido estávamos chegando na pista. Ele me empurrou e mandou que me escondesse. Foi quando meu esposo correu para ajudar o Evaldo". Ainda de acordo com Dayane, ela viu o exato momento em que o músico olhou para Luciano, como se pedisse ajuda, instantes antes de falecer.

Segundo Dayane, os militares chegaram a dizer que seu marido seria um dos bandidos envolvidos no assalto que antecedeu as mortes. "Foram os moradores que negaram o envolvimento. Estávamos catando madeira para a construção do nosso barraco", acrescentou a mulher, que espera o primeiro filho do casal.
O advogado dos militares, Paulo Henrique de Melo, disse à imprensa que 'ninguém demonstrou que os militares são executores ou assassinos'. Confira o vídeo:
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Denúncia
A denúncia foi oferecida pelo Ministério Público Militar (MPM) no último dia 10 e enumera os supostos crimes praticados pelos envolvidos: duplo homicídio qualificado e tentativa de homicídio, previstos no artigo 205 do Código Penal Militar (CPM), e omissão de socorro, descrito no artigo 135 do Código Penal Comum.
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Fazem parte do processo um tenente, um sargento, dois cabos e oito soldados, todos lotados no 1º Batalhão de Infantaria Motorizado, na Vila Militar. Nove dos acusados seguem presos, inicialmente por meio de uma prisão em flagrante, transformada em prisão preventiva.

Segundo o MPM, "a conduta dos denunciados desrespeitou o padrão legal de uso da força e violou regras de engajamento previstas para operações análogas, em especial o emprego da força de forma progressiva e proporcional e a utilização do armamento, sem tomar todas as precauções razoáveis para não ferir terceiros".