Mães de jovens assassinados por policiais em manifestação - DIVULGAÇÃO
Mães de jovens assassinados por policiais em manifestaçãoDIVULGAÇÃO
Por Yuri Eiras

Rio - Mães que enterram os filhos sentem a inversão da ordem natural do tempo. As que os perdem para a violência policial são vítimas, ainda, da inversão do papel do Estado. Em 26 de julho de 1990, 11 jovens moradores da favela de Acari foram assassinados em um sítio em Magé por policiais que atuavam em um grupo de extermínio da Baixada Fluminense. O movimento Mães de Acari, que na época lutava para encontrar os corpos dos jovens, nunca localizados, completa 30 anos com um triste cenário: as mortes violentas de crianças e adolescentes ainda estampam as manchetes, dando vida à outras redes de mães.

Mônica Cunha criou o Movimento Moleque após a morte de seu filho Rafael Cunha, em dezembro de 2006, aos 20 anos. De semblante sério, costuma carregar cartazes contra o extermínio da juventude negra em manifestações. Para elas, fotografias, placas, camisetas manchadas de sangue são símbolos de resistência.

"As Mães de Acari nunca encontraram os corpos de seus filhos, mas seu exemplo encorajou muitas outras mães a se juntar na luta. Hoje estamos organizadas em uma rede nacional de familiares, cujo protagonismo se dá pelas mães, reunindo movimentos e coletivos de todo o país, com articulações nacionais e internacionais", afirma Mônica.

Mônica Cunha, mãe de Rafael Cunha, assassinado em 2006 - fotos DIVULGAÇÃO

"O impacto da mobilização destas mulheres foi tanto, que tentaram, de muitas formas, silenciá-las. Desacreditá-las foi uma delas, inclusive utilizando a expressão 'mães de bandido' para deslegitimar o que reivindicavam, mas nada foi capaz de pará-las. Nem mesmo a execução de Edméia, uma das lideranças do grupo", lembra, em referência a Edméia da Silva, assassinada na estação de metrô da Praça Onze em 1993. Ela havia saído do presídio Frei Caneca momentos antes, em buca de informações sobre o paradeiro do corpo do filho, Luís Henrique, de 16 anos.
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"O Movimento Moleque nasceu inspirado pela luta das mães de Acari, eu vi na fila para visitar meu filho no Degase, que a nossa cor era a mesma. Mulheres negras era imensa maioria. Comecei a estudar o Estatuto da Criança e adolescente e conversar com elas ali mesmo na fila".
Número de jovens mortos por agentes do Estado cresce
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De 1990 a 2020, os jovens das favelas cariocas seguem vítimas da violência. Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram que, no ano passado, foram registradas 557 "mortes por intervenção de agentes do Estado" de jovens entre 15 e 24 anos no estado. O número é crescente. Em 2018, foram 502; em 2017, 414. Entre as crianças e adolescentes - 0 a 17 anos - foram 121 vítimas em 2019.
Este ano, em junho, João Pedro Motta, 14, entrou para a trágica estatística. Ele foi morto dentro de casa, durante uma operação da polícia civil no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. "Meus dias estão sendo muito difíceis. A gente nem tem tempo de viver o luto, por entrar em luta por justiça. Já faz mais de dois meses que estou sem meu filho", lamenta Rafaela, mãe de João. Ela também tem participado do grupo de mães.
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"Essa luta é nossa e vem de muitos anos. Com outras mães me apoiando eu senti que não estava sozinha. Nossos filhos não voltam mais, mas essa luta é para que outras mães não percam seus filhos também".
 
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