A Técnica de enfermagem Ingrid dos Santos, na porta  do Hospital de Campanha de Caxias, teve a função de trabalho modificada na carteira de trabalho digital
A Técnica de enfermagem Ingrid dos Santos, na porta do Hospital de Campanha de Caxias, teve a função de trabalho modificada na carteira de trabalho digitalEstefan Radovicz / Agência O Dia
Por Bernardo Costa
Como se não bastassem os salários atrasados e o não pagamento da verba rescisória, profissionais contratados pela OS Iabas para trabalhar nos hospitais de campanha de Duque de Caxias e Nova Iguaçu, que ficaram prontos, mas não chegaram a ser ativados, foram surpreendidos, esta semana, com uma mudança de função na carteira de trabalho digital. De técnico de enfermagem e auxiliar de rouparia passaram a gerente de projetos e serviços de manutenção.
Sem terem recebido pelos meses de junho e julho, enquanto aguardavam serem chamados para os hospitais que nunca abriram, e ainda sem terem sido pagos pela quebra de contrato pela Iabas, eles acreditam estarem sendo vítimas de mais uma fraude.
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"A gente acredita que seja golpe, alguma estratégia para se livrarem de um possível processo coletivo", diz Verônica Bezerra, contratada para atuar no hospital em Caxias. Ela teve a carteira assinada pelo Iabas como técnica de enfermagem em 25 de abril e conta que, na terça-feira passada, quando checou o aplicativo da carteira de trabalho digital, notou que sua função no contrato havia sido alterada: "Na segunda-feira, eu havia checado e não tinha nada disso", conta Verônica.
A técnica de enfermagem Verônica Bezerra é uma das profissionais que tiveram função alterada - Fotos do leitor
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O mesmo aconteceu com os colegas dela. Para Glauber Rodrigues, de 34 anos, que teve a carteira assinada como auxiliar de rouparia para atuar na unidade de Nova Iguaçu, a troca de cargo pode indicar lavagem de dinheiro. "Isso porque o cargo de gerente de projetos, em tese, tem um salário maior que o de maqueiro, a função que eu iria exercer em Nova Iguaçu", aponta Glauber.
A mudança nos cargos é um problema a mais na vida dos profissionais que se dispuseram a salvar vidas na pandemia e hoje encontram-se sem emprego e sem o dinheiro que deveriam ter recebido pelos meses em que aguardavam a convocação para atuarem de forma efetiva nos hospitais, que hoje estão sendo desmobilizados. Segundo relatam, a rescisão dos contratos sem a devida indenização aconteceu no fim de julho, por e-mail enviado pelo Iabas.
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“Cobramos respostas, fazemos contatos, por telefone, WhatsApp e e-mail, mas ninguém da OS responde mais. Chegaram a marcar uma data para a homologação do término do contrato, mas desmarcaram e depois sumiram. Permaneço sem ter como dar baixa na minha carteira e dar entrada no seguro-desemprego”, destaca Ingrid dos Santos, técnica de enfermagem em Caxias. Ela ainda aponta ‘pagamento-fantasma’ no extrato digital do INSS: “Aparecem salário e rescisão que nunca caíram na minha conta”.
Segundo Sérgio Batalha, presidente da Comissão da Justiça do Trabalho da OAB -RJ, o artigo 4º da CLT garante o recebimento de salários mesmo sem atuação efetiva dos profissionais: "Se os hospitais não abriram, não é problema deles”. Já sobre a mudança de função, Batalha afirma que é ilegal: “Isso também pode ser objeto de reclamação na Justiça do Trabalho".
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A técnica de enfermagem Thamyres Nóbrega foi demitida pelo Iabas após descobrir que estava grávida - Fotos do leitor
Gestante demitida pelo Iabas
A relação entre o Iabas e os profissionais ainda encerra mais uma ilegalidade. Enquanto aguardava ser convocada para o Hospital de Campanha de Caxias, como técnica de enfermagem, Thamyres Nóbrega, de 24 anos, descobriu que estava grávida. Ela mandou os exames para o Iabas por e-mail e, dois dias depois, em 30 de julho, recebeu a rescisão de contrato.
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“Eu não poderia ter sido mandada embora estando grávida. E ainda não me pagaram pelos meses de junho e julho e pela rescisão. Estou numa situação desesperadora”, desabafa Thamyres.
Segundo o advogado Sérgio Batalha, a lei garante estabilidade no emprego à gestante: “Ela deve ser reintegrada e receber o salário até cinco meses após o nascimento da criança. Minha sugestão é que procure a Justiça do Trabalho”.

Jogo de empurra
Em busca de respostas para os pagamentos devidos aos profissionais de saúde, a reportagem de O DIA esbarrou no mesmo problema que os trabalhadores têm enfrentado: o jogo de empurra entre a OS Iabas e a Secretária Estadual de Saúde (SES), que firmou o contrato com a empresa para gerir os hospitais de campanha.
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Segundo o Iabas, a Justiça determinou que o pagamento dos salários atrasados seja realizado pelo governo do estado. Já a SES informou que o vínculo empregatício dos profissionais contratados para atuarem nos hospitais de campanha de Duque de Caxias e Nova Iguaçu, assim como nos de Nova Friburgo, Campos dos Goytacazes e Casimiro de Abreu, é com a OS Iabas, que portanto deve arcar com as responsabilidades trabalhistas.
Porém, a Secretaria de Saúde do Rio disse que o governo do estado avalia um acordo com o Tribunal Regional do Trabalho para que esses profissionais possam receber seus salários direto em suas contas, como aconteceu com os trabalhadores das unidades Maracanã e São Gonçalo.
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O Iabas nega que tenha demitido funcionários no mês de julho e afirma que, em relação à troca de função dos profissionais e à demissão da funcionária grávida demitida, está fazendo uma apuração cuidadosa e que, caso exista algum equívoco, “o mesmo será sanado imediatamente”.