Em nota, a emissora disse que a decisão judicial é um "cerceamento à liberdade de informar, uma vez que a investigação é de interesse de toda a sociedade". A TV Globo também afirmou que avalia providências legais cabíveis.
A liminar que proíbe a emissora de divulgar documentos do caso das rachadinhas foi dada pela juíza Cristina Serra Feijó, da 33ª Vara Cível do Rio, que alegou risco de dano à "imagem" do filho do presidente Jair Bolsonaro caso as peças fossem veiculadas pela Globo.
Segundo a magistrada, sua decisão "não diz respeito propriamente à liberdade de imprensa", mas sim à "responsabilidade pelos danos causados pela divulgação de documentos e informações". Ela nega ter cometido censura.
"Embora admirável a atuação do jornalismo investigativo na reconstrução e apuração dos fatos, ela esbarra nos limites da ofensa a direito personalíssimo", afirmou Feijó. "A exposição indevida de documento sigiloso ou a divulgação de informação protegida por sigilo pode vir a comprometer a higidez da investigação".
"Some-se a isto que o requerente (Flávio Bolsonaro) ocupa relevante cargo político e as constantes reportagens, sem qualquer dúvida, podem ter o poder de afetar sua imagem de homem público e, por via transversa, comprometer sua atuação em prol do Estado que o elegeu senador", afirmou a juíza.
A decisão atendeu pedido da defesa do senador, liderada pelos advogados Rodrigo Roca e Luciana Pires. Segundo Flávio, as reportagens investigativas sobre o caso das rachadinhas feitas pela TV Globo "excedem" os limites da liberdade de imprensa "ao exibir documentos sigilosos que instruem o procedimento investigatório", como extratos bancários e declarações de imposto de renda, "fazendo ilações sobre patrimônios e operações financeiras".
Flávio Bolsonaro é investigado por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa em suposto esquema do qual faria parte seu então assessor Fabrício Queiroz, demitido em 2018 após os primeiros indícios de irregularidades no gabinete do filho do presidente serem revelados. Queiroz foi preso em Atibaia (SP) em junho, e cumpre prisão domiciliar na Taquara, na Zona Oeste da capital.
Em agosto, extratos bancários de Queiroz anexados à investigação revelaram que o ex-assessor de Flávio depositou 21 cheques em nome da primeira-dama Michelle Bolsonaro. As transações datam de outubro de 2011 a dezembro de 2016, em valores que variam de R$ 3 mil a R$ 4 mil. Somados, os cheques somam R$ 72 mil.
Movimentação semelhante foi descoberta na conta de Márcia Aguiar, mulher de Queiroz. Registros indicam que ela depositou outros seis cheques para Michelle no valor total de R$ 17 mil.
CRÍTICAS
Após a decisão, a juíza Cristina Serra Feijó divulgou nota de esclarecimentos no site da Associação dos Magistrados do Rio sobre sua decisão. Segundo ela, a liminar foi "exclusivamente técnica".
"A decisão visa preservar a segurança da investigação e a intimidade dos envolvidos", afirmou, negando se tratar de censura. "A decisão não determina censura a conteúdo previamente divulgado, muito menos a retirada de reportagens do ar".
A censura da magistrada provocou forte reação de entidades que defendem a liberdade de imprensa. Em nota, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) criticou a liminar e disse que a decisão atenta "contra a liberdade de imprensa, cerceia o direito da sociedade de ser livremente informada".
O presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Marcelo Träsel, também criticou a censura imposta pela Justiça do Rio.
"Consideramos qualquer tipo de censura prévia inaceitável numa democracia, sobretudo quando o alvo da cobertura jornalística é uma pessoa pública cujo mandato foi outorgado pelo voto, o que lhe traz a obrigação de prestar contas à sociedade. Não tivemos acesso à sentença, mas uma medida como essa exigiria razões excepcionais para se justificar", afirmou. "A decisão da 33ª Vara Cível do TJRJ dificulta a cobertura jornalística das graves denúncias contra o senador Flávio Bolsonaro, violando a liberdade de imprensa e o direito à informação".
O senador Flávio Bolsonaro celebrou a medida.