Caixa d’água vazia de Maria de Jesus, moradora de Realengo - Reginaldo Pimenta
Caixa d’água vazia de Maria de Jesus, moradora de RealengoReginaldo Pimenta
Por Karen Rodrigues*
Rio - Parece que só São Pedro e muita chuva para ajudar os cariocas a ter acesso à água. Moradores de diversas localidades no Rio estão reclamando da falta d'água há semanas e estão tendo que recuperar a água da chuva para poder fazer tarefas básicas do dia a dia, como lavar as mãos, tomar banho e fazer comida, como é o caso da cozinheira Maria de Jesus, moradora de Realengo. O abastecimento de água reduziu em diversos municípios do Rio devido a um reparo emergencial na Elevatória do Lameirão, dispositivo que integra o sistema Guandu, realizado pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae).
"Tem mais ou menos um mês que ainda ‘tava’ me segurando, porque eu tenho caixas, mas secou, acabou. Não tenho água. Eu estou sobrevivendo na graça de Deus, porque está chovendo agora. A gente está colocando uma calha para a água cair dentro da minha caixa. Eu não tenho condições financeiras de comprar um carro-pipa, como tem gente que pode, eu não posso. Não tenho água em torneira nenhuma, no banheiro, na torneira, nem bica nenhuma na minha casa", contou a moradora de Realengo.
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Além de impedir a realização de tarefas cotidianas, a falta de água também impede o trabalho da Maria, que faz quentinhas para poder sustentar a família.
"Eu trabalho com culinária, eu vendo quentinha em casa. Eu tinha um pequeno restaurante, mas eu fechei por causa da pandemia e agora eu trabalho em casa. Então assim, as minhas economias que eu tinha já foi tudo para fazer compras para casa, porque eu não tinha como trabalhar. Para trabalhar com a culinária tem que ter água e bastante água, porque tem que ser tudo muito limpo. E eu não tenho água de jeito nenhum. Então, com esse pouco de água que eu pego, e agora choveu e eu resgatei um um pouco também, é algo que está sendo a minha sobrevivência. E acredito que tem muita gente aqui dentro do Parque Real, aqui onde eu moro que está vivendo a mesma situação", disse.
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A moradora de Realengo ainda está tendo que pedir ajuda do cunhado para poder ter acesso a um pouco de água e poder pelo menos tomar um banho e lavar a roupa, em um momento de pandemia.
"Para lavar roupa a gente está indo lavar roupa na casa do meu cunhado. Ele vem aqui com o carro, pega as roupas e bota para lavar. A gente está tomando água, porque ele também está fazendo doação de água para gente naqueles galões, ele compra. Eu sou mãe de família, e isso está me afetando, está ficando chato, afetou tudo na minha vida, afetou meu trabalho, afetou a minha casa, a minha casa está suja. Para dar banho nos meus filhos é difícil. Nós estamos no meio de uma pandemia, é uma complicação. Meus filhos não estão podendo brincar, porque não podem tomar banho e é um banho por dia com uma garrafa PET de água", contou ao DIA.
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Maria de Jesus chegou a receber a visita de funcionários da concessionária Cedae, mas nada foi resolvido. Segundo a cozinheira, eles chegaram a ver onde iriam colocar a mangueira até a caixa d'água dela, no entanto, os funcionários não retornaram. No site da concessionária, o abastecimento de água está previsto para voltar alguns dias antes do Natal.
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Apesar da falta de fornecimento de água, as contas não param de chegar e os usuários ainda têm que pagar, mesmo sem ter acesso ao serviço.
"As minhas contas está tudo paga, porque a gente paga todo mês direitinho. Então, é isso que eu fico mais indignada, que às vezes a gente tira de uma coisa que a gente não pode tirar para pagar a conta e aí no final a gente tem esse retorno. O que está mais me indignando também é que, no começo do ano, a gente teve que tomar água de 'cocô', a gente teve que tomar água de detergente, isso é um descaso. Só que essa é a segunda vez que está acontecendo isso com a população e isso não pode acontecer dessa maneira, eles têm que respeitar a gente, a gente só quer viver direito, a gente só quer dignidade", relatou Maria de Jesus.
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Segundo informações preliminares, a Cedae estaria planejando abrir um processo, esta semana, para oferecer desconto nas contas dos usuários que estão sem fornecimento de água nos últimos dias. O DIA entrou em contato com a concessionária para saber mais detalhes sobre o assunto, mas não obtivemos resposta.
Denúncias e processos contra a concessionária
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Além das denúncias da Maria de Jesus, milhares de consumidores afetados pela crise no abastecimento de água também fizeram reclamações contra a Cedae nos canais de denúncias da Comissão de Defesa do Consumidor da CMRJ, indicando claras violações de seus direitos, assim como lesão a própria saúde pública da população.
A vereadora Vera Lins (PP), presidente da comissão, encaminhou, na última sexta-feira, ao Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, um pedido de abertura de inquérito civil público responsabilizando na área administrativa, civil e penal, os responsáveis pelos transtornos causados no que diz respeito ao fornecimento e abastecimento de água realizado pela Cedae. Ela pede também para que seja apurado com o maior rigor possível as denúncias de fornecimento e baixa qualidade da água destinada ao consumo da população, além da cobrança por estimativa.
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O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) e a Defensoria Pública do Estado do Rio, ingressaram também, na última sexta-feira, junto à 8ª Vara de Fazenda Pública da Capital, um pedido de execução provisória para que a Cedae regularize o fornecimento de água em todas as áreas do município do Rio de Janeiro. Além disso, também pediu para que ambos adotassem medidas concretas para o abastecimento público de água em todas as áreas da capital, vedada a exclusão das comunidades carentes. 
A Defensoria Pública do Rio, por meio do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon), ainda oficiou, na última quinta-feira, a Cedae com prazo de 24 horas para que sejam prestadas novas informações, mais claras, quanto ao rodízio efetuado, além do motivo de algumas localidades que não se encontram na área afetada continuarem sem o fornecimento do serviço por prazo superior ao razoável.
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Áreas afetadas pela falta d’água
A Cedae está disponibilizando diariamente, desde a última terça-feira, no site, um mapa de regiões do Rio que podem ser afetados pela falta d'água. Para minimizar o caos instalado na cidade, a concessionária está fazendo um rodízio de abastecimento. Confira os locais que estão em destaque no mapa desta segunda-feira:
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Zona Norte: Cascadura, Madureira, Ricardo de Albuquerque, Anchieta, Senador Camará, Riachuelo, Rio Comprido, São Francisco Xavier, Rocha, Sampaio, Camarista Meier, Ilha do Governador,
Zona Sul: Parte de Copacabana, Laranjeiras
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Zona Oeste: Campo Grande, Senador Vasconcelos, Santíssimo, Sepetiba, Jabour, Inhoaíba, Cosmos, Santa Cruz, Vila Valqueire, Realengo
Região Central: Santa Teresa, São Cristóvão, Benfica
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Baixada Fluminense: Queimados, Nova Iguaçu, Japeri, Belford Roxo
*Estagiária sob supervisão de Gustavo Ribeiro