Hospital de Campanha de Duque de Caxias, área interna. Fotos de terça-feira, dia 8 de setembro de 2020
Hospital de Campanha de Duque de Caxias, área interna. Fotos de terça-feira, dia 8 de setembro de 2020Foto do leitor
Por Bernardo Costa
A Justiça do Trabalho deu ganho de causa para duas técnicas de enfermagem que haviam sido contratadas para atuar no Hospital de Campanha de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, com reconhecimento de dívida por parte da OS Iabas. A unidade foi construída em meados do ano passado mas, sem ser ativada, não chegou a receber um paciente sequer. De acordo com sentença da juíza Adriana Leandro de Sousa Freitas, titular da 7ª Vara do Trabalho de Duque de Caxias, a Iabas, contratada pelo Governo do Estado para construir e gerir os hospitais de campanha do Rio, deverá pagar salários, verbas rescisórias e proporcionais de férias remuneradas e décimo terceiro às funcionárias, além do recolhimento do fundo de garantia. As duas sentenças foram expedidas no último dia 15.

As duas sentenças têm valores de causa, estabelecidos na inicial dos processos, de R$11.134,28 e R$10.731,95. No entanto, segundo o advogado Rodrigo Gonçalves, que representa as técnicas de enfermagem, os valores a serem pagos serão calculados em fases posteriores dos processos, cujas decisões foram definidas em primeira instância.

Aline Nascimento dos Santos, de 37 anos, é uma das técnicas de enfermagem que tiveram ganho de causa. Ela foi contratada pela Iabas no início de abril e teve contrato rescindido, por e-mail, em 26 de julho. Durante o período, ela conta ter recebido apenas parte de um salário, no valor R$120, apesar de ter tido carteira assinada com vencimentos fixados em R$1.100.

"Em abril, soube da vaga de trabalho e me inscrevi pela internet. Fui aceita e tive a carteira assinada no Hospital de Campanha do Maracanã. Fiquei à disposição da empresa, mas nunca fui convocada, pois o Hospital de Caxias nunca chegou a funcionar. Estávamos à disposição, se o hospital não abriu, não é por culpa nossa", diz Aline.

Aline atualmente trabalha como técnica de enfermagem na UPA de Engenho Novo, no Rio, e recebe um salário mínimo. Ela conseguiu o emprego em julho do ano passado. O processo na Justiça contra a Iabas e o Governo do Estado referente ao Hospital de Campanha de Caxias teve início em 28 de agosto de 2020.

"Estou rezando para que, agora com essa decisão da Justiça, esse dinheiro seja pago logo, pois vai me ajudar muito. Sou mãe solteira e está muito difícil sustentar meus dois filhos, de 6 e 14 anos, com um salário mínimo. Está tudo muito caro, os preços subiram absurdamente", comenta Aline, que mora em Imbariê, em Duque de Caxias.

A Justiça também determinou que seja dada baixa na carteira de trabalho das profissionais. Segundo as sentenças, as partes serão intimadas para comparecer na secretaria da 7ª Vara de Trabalho para cumprimento da determinação em momento oportuno.

Enquanto permanece sem baixa na carteira de trabalho, Aline teme que não consiga arrumar outro emprego caso surja uma oportunidade:

"Eu poderia conseguir outra ocupação que fosse possível de conciliar com minha escala de trabalho na UPA de Engenho Novo, mas tenho receio que o empregador veja o vínculo com a Iabas ainda ativo, e pense que eu não teria condições de cumprir carga horária por estar em dois empregos".

Responsabilidade também do estado

Nas sentenças, a Justiça do Trabalho reconheceu a responsabilidade subsidiária do Estado do Rio pelos pagamentos, e decidiu que, caso a Iabas não cumpra com a quitação dos débitos com as funcionárias, o estado deverá arcar com os custos como o real tomador dos serviços, cuja contratação de funcionários foi terceirizada à Iabas.

"Conquanto tenha sido legítimo e regular o contrato de prestação de serviços terceirizados, se a contratada deixa de ter idoneidade econômico-financeira para satisfazer os direitos trabalhistas de seus empregados, mormente quando se torna revel (que não acata ordem estabelecida), por exemplo, a beneficiária dos serviços (tomadora) é tida como responsável subsidiária", destaca trecho da decisão da juíza Adriana Leandro de Sousa Freitas.

Segundo o advogado Rodrigo Gonçalves, há um total de 15 processos semelhantes em tramitação na 7ª Vara do Trabalho de Duque de Caxias. A expectativa do magistrado é que, com essas duas decisões favoráveis às funcionárias, os outros processos também tenham ganho de causa para os trabalhadores.

"Estamos conseguindo também a retificação da função na carteira de trabalho, pois alguns funcionários tiveram função alterada pela Iabas em suas carteiras de trabalho digitais para cargos que seriam inferiores. Essa troca pode ser um indício de fraude, uma tentativa de a OS se livrar de tributos fiscais e verbas rescisórias mais pesadas. Mas isso não tenho como afirmar categoricamente", diz Rodrigo Gonçalves.
Procurada, a Iabas informou que irá recorrer da decisão, pois afirma que ela não imputou responsabilidade à Fundação Saúde, a quem de fato, segundo a Iabas, compete quitar os salários e verbas rescisórias em aberto, conforme decreto estadual de intervenção e determinação da Justiça. A Iabas respondeu, ainda, que cobra do Governo do Estado, na Justiça, repasses que somam R$ 102,3 mil referentes a contratos de gestão de unidades destinadas ao combate à covid-19 no Rio.  
Publicidade
O DIA também procurou o Governo do Estado, e aguarda respostas aos questionamentos da reportagem.
Governador afastado
Publicidade
O contrato firmado entre o Governo do Estado e a OS Iabas para a construção dos hospitais de campanha no Rio teve valor de R$ 835 milhões e se deu de forma emergencial. Das unidades planejadas: Maracanã, São Gonçalo, Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Campos dos Goytacazes e Casimiro de Abreu, apenas as duas primeiras entraram operação. 
O contrato é um dos fatores que deram origem às operações Placebo e Favorito, em maio do ano passado, e Tris in Idem, em agosto, que afastou o então governador Wilson Witzel do cargo. Witzel responde a processo de impeachment no Tribunal de Justiça do Rio.