O jornalista Aloy Jupiara
O jornalista Aloy JupiaraReprodução de vídeo / Sempre um Papo
Por Ricardo Schott e Rachel Siston
Rio - Ética, paciência, concentração, dedicação e, acima de tudo, calma e gentileza. São qualidades ressaltadas por todas as pessoas que tiveram o prazer de conviver e trabalhar com Aloy Jupiara, editor-chefe do jornal O DIA, morto nesta segunda-feira à noite por complicações da covid-19. Ele estava internado desde o dia 29 de março na UTI do Hospital São Francisco, na Tijuca, Zona Norte do Rio. Aloy, que não tinha filhos, era o mais novo de três irmãos. A cremação será hoje às 14h no Caju.
Aos 56 anos, Aloy Jupiara Braz Teixeira tinha no currículo passagens por jornais como 'O Globo' (foi editor executivo do site do jornal e gerente de inovação digital), além de ter escrito os livros 'Os Porões da Contravenção' e 'Deus Tenha Misericórdia Dessa Nação', ambos em parceria com o jornalista Chico Otavio. No O DIA, iniciou os trabalhos assumindo o projeto Cidades em parceria com o portal iG. Em seguida, comandou o projeto de reportagens sobre eleições, e tornou-se editor-chefe do jornal. Participou recentemente do documentário 'Doutor Castor', da Globoplay, sobre a vida do bicheiro Castor de Andrade (1926-1997).
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Definido pelos amigos como um apaixonado pelo trabalho, dividia seu tempo com a paixão pelo Carnaval, acompanhando sua escola de coração (Império Serrano). Atuou também como integrante do Conselho Deliberativo do Museu do Samba, e como jurado do prêmio Estandarte de Ouro, do jornal 'O Globo'. "Nos momentos mais difíceis da história do Museu, o Aloy sempre esteve à disposição para nos socorrer. O carnaval perde um de seus maiores apaixonados e o Museu do Samba fica sem um de seus grandes pilares", lamenta a fundadora do Museu do Samba, Nilcemar Nogueira.
A pesquisadora Rachel Valença, uma das estruturadoras do museu, diz que a sensação é de injustiça. "Como é possível acontecer algo tão absurdo a uma pessoa generosa e solidária como ele? Um profissional competente e dedicado, mas simples e humilde, não tinha pose", ressalta.
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Já a sambista Dorina, que foi jurada do 'Estandarte de Ouro' ao lado dele, diz ter se apaixonado pela escrita de Aloy antes de conhecê-lo, e que ouviu sugestões dele quando escreveu um livro de contos, 'Contornos'. "Com Aloy, aprendi a importância de defender sua opinião com clareza, riqueza, profundidade, mas acima de tudo, com respeito e afeto ao outro. Ele era uma pessoa doce, mas decidida a fazer o melhor", diz.
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Inabalável
A jornalista Claudia Silva, que o conhecia desde os anos 1990, ressalta que Aloy estava isolado desde o começo da pandemia. "Ele tinha uma nobreza de caráter ímpar. Passou esse tempo todo do isolamento pagando a faxineira sem que ela fosse trabalhar. Pagava até a passagem dela! Ficou em casa esse tempo todo", conta, recordando a ocasião em que ela e seu marido levaram o amigo para passear em Londres. "Falávamos em voltar lá, que precisávamos ir. Na segunda-feira da semana passada, nos falamos por mensagem, disse que eu e meu marido o amávamos. Não me conformo em saber que ele poderia estar vacinado".
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Repórter do G1, Alba Valéria dividiu com Aloy coberturas como as do 11 de setembro, o impeachment de Collor e algumas eleições. Lembra do amigo sempre inabalável. "Não que fosse insensível. Ele sabia administrar o caos mesmo em cobertura estressantes. Podia até compará-lo a um anjo: alegre, discreto, fala baixa, bom ouvinte, calmo, gestos comedidos, divertido, andar leve", diz. Aziz Filho, jornalista e sócio da empresa Avenida Comunicação, recorda-se que o amigo era bastante cuidadoso. "Sempre tinha um zelo danado por princípios, como respeitar qualquer entrevistado e sempre ouvir os dois lados", conta. "Adorava o Méier, sabia tudo da Zona Norte, era um apaixonado pela ideia de uma cidade unida, sem preconceitos".
Irmão de Aloy, Marcus Teixeira enviou nota ao DIA agradecendo todas as homenagens feitas a ele. "Descobrimos agora o quanto ele era maior do que nós da família imaginávamos. E descobrimos, por conta dele, que nossa família é bem maior", afirmou.
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Parceiros
Chico Otávio diz que ser amigo de Aloy foi um enorme privilégio. "Era praticamente um irmão. Nós tínhamos uma amizade profunda. Ele sempre foi uma referência, eu sempre o consultava", afirma. Os livros em parceria surgiram de uma série de reportagens feitas pelos dois. "Eu tenho um grande respeito pelo profissional que ele era. Ético, criterioso, sempre foi uma referência. Ele era muito detalhista, fazia questão de entregar ótima qualidade para o leitor".
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Também jurado do Estandarte de Ouro, jornalista e escritor, Marcelo de Melo lembra do detalhismo de Aloy. "Em 1997, na visita do (presidente dos Estados Unidos) Bill Clinton ao Brasil, eu me lembro que o Aloy fez uma arte sobre o avião presidencial e ele ficou até tarde olhando cada detalhe. Era uma arte muito bem feita, mostrando cada detalhe. Ele olhava como um artesanato", recorda.
Tribunal de Justiça
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Henrique Carlos de Andrade Figueira, presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, enviou nota lamentando a morte de Aloy. "Em sua longa trajetória, o profissional foi um colaborador inestimável para o Estado, com o olhar crítico e apurado para os problemas sociais. O jornalismo está de luto mas, inspirado pelo caráter, profissionalismo e seriedade de Aloy Jupiara, seguirá cumprindo sua missão essencial à democracia", conta.
Elba Boechat, assessora de imprensa do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro e grande amiga dele, ressalta que "a genialidade, o carisma, a afeição, o amor e o profissionalismo do meu querido amigo e irmão serão sempre lembrados pelos que tiveram a sorte de conviver com ele e desfrutar de sua amizade e companhia. Eu tive essa sorte e agora é como se tivessem tirado um pedaço de mim", lamenta. 
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O vereador Chico Alencar (Psol) citou Aloy em sua fala na Câmara na tarde desta terça-feira. "Um ser humano pacífico, democrático, praticava o jornalismo investigativo e estimulava todos os jovens a fazer o mesmo", disse, citando os livros do escritor.
As homenagens do DIA
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Alexandre Donizeti, presidente do DIA, homenageou Aloy. "Um grande amigo, leal, dedicado, acima de tudo totalmente comprometido com a empresa e com seus colegas de trabalho. Infelizmente não tive muito contato pessoal com ele, mas certamente, as pessoas que tiveram, irão confirmar que tudo que ele foi como profissional foi ainda mais como amigo. Por isso, todos nós teremos saudades eternas desta grande pessoa", conta.
Bruno Ferreira, editor-executivo do jornal, ressalta: "A serenidade era o traço principal do Aloy. Nada o abalava nem fazia levantar a voz. Um profissional dedicado 100% ao jornal e, acima de tudo, um amigo sempre presente em todas as horas. Uma grande perda para todos nós". Luiz Mendes, diretor de mídias digitais do jornal, diz que Aloy "aliava um enorme amor ao trabalho, uma dedicação por ajudar todos aqueles que se relacionavam com ele, com um perfil tranquilo e sereno. Aloy é uma daquelas pessoas que marcam todos o que o conheceram".
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Futebol
Torcedor do Fluminense, Aloy ganhará uma homenagem amanhã durante o clássico entre Flamengo e Vasco, que será disputado no Maracanã. Antes do começo da partida será respeitado um minuto de silêncio.
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Última foto no Instagram
Último post do Aloy Jupiara no Instagram
Último post do Aloy Jupiara no InstagramDivulgação
No dia 15 de fevereiro, dia em que aconteceria o Carnaval de 2021 (data amada por Aloy), o jornalista foi até o Sambódromo, na Avenida Marquês de Sapucaí, e deixou na grade uma rosa branca com a inscrição "Resistência". Foi sua última foto no Instagram, com o seguinte texto:
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"Deixei uma rosa branca com a inscrição Resistência. Pelo carnaval, pelo samba, pela saúde das pessoas, pelos que perderam amigos e parentes, pelos que se sentem desprotegidos por políticas públicas, e resistência para todos os profissionais de Saúde da linha de frente do combate à Covid, alguns dos quais pereceram nessa luta. Gratidão a vocês", escreveu.
"A rosa tem uma história de outra resistência. Ganhei na sessão de estreia do filme 'Torre das Donzelas, As mulheres presas na ditadura', numa sessão no Odeon, no amado Festival do Rio. Achei que era a hora de passar essa rosa da resistência, com toda a força daquelas mulheres, aos que lutam e sofrem agora, e que o Sambódromo transformado em local de vacinação representa: o Carnaval é também resistência e voltará ano que vem. E em memória à minha mãe, Irene, enfermeira, que coordenou um dos postos de vacinação (PAM Del Castilho) nas campanhas de vacinação dos anos 70. Beijo", escreveu.