Pacientes com demência, como os portadores da doença de Alzheimer, apresentam até o triplo de risco de desenvolver formas mais graves de COVID-19
Pacientes com demência, como os portadores da doença de Alzheimer, apresentam até o triplo de risco de desenvolver formas mais graves de COVID-19Divulgação
Por O Dia
Rio - Pacientes com demência, como os portadores da doença de Alzheimer, apresentam até o triplo de risco de desenvolver formas mais graves de covid-19. A descoberta é de pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do Instituto Butantan e da Universidade de São Paulo (USP), que publicaram o estudo na revista científica Alzheimer’s & Dementia (da Associação de Alzheimer dos Estados Unidos).
No artigo "Dementia is an age-independent risk factor for severity and death in COVID-19 inpatients", publicado nesta quarta-feira (21), o grupo de pesquisadores brasileiros revela a urgência de se dedicar atenção especial na proteção e no cuidado com indivíduos portadores de demência durante a pandemia.

As pesquisas apontam que, ao serem infectados, pacientes com demência têm de duas a três vezes mais chances de desenvolver quadros graves de covid-19, podendo evoluir para óbito. Segundo o professor dos Institutos de Biofísica e de Bioquímica Médica da UFRJ (IBqM) Sérgio Ferreira, embora os resultados sejam claros ao revelar que a demência é um fator de risco importante para a covid-19 grave, o estudo ainda não é conclusivo em mostrar por que razão isso ocorre.

"Uma hipótese que pretendemos investigar é que os pacientes com demência já apresentem alterações nas respostas imunológica e inflamatória que fazem com que eles reajam de forma inadequada à infecção pelo SARS-CoV-2", alertou Ferreira. "De todo modo, nossos achados servem de alerta aos serviços de saúde pública para que atenção especial seja dada ao cuidado de pacientes de covid-19 com quadros de demência, pelo risco significativo de evolução para um quadro de difícil tratamento e reversão", disse.

A partir dos dados do UK Biobank (projeto que, desde 2006, acompanha e investiga cerca de 500 mil voluntários, com exames de saúde periódicos), os pesquisadores brasileiros identificaram mais de 16 mil indivíduos acima de 65 anos de idade (fase em que a demência se torna bem mais frequente) que haviam sido testados para covid-19 no período de março a agosto de 2020. Desses, cerca de 1.200 tiveram resultado positivo para a doença
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Os cientistas começaram a examinar detalhadamente os dados de saúde dos cerca de 16 mil indivíduos para verificar se havia diferenças importantes entre os pacientes positivos para COVID-19 e os negativos. "Analisamos os dados levando em conta se os pacientes tinham diversos outros possíveis fatores de risco para COVID-19, como hipertensão, sobrepeso, diabetes, doenças cardíacas ou pulmonares, entre outros. Essas informações já estavam disponíveis no banco de dados de forma organizada e precisa, o que nos garantiu agilidade para testar as nossas hipóteses", informou Ana Carolina Tahira, pesquisadora do Instituto Butantan responsável pelas análises.

Uma das preocupações do estudo, de acordo com Sergio Verjovski-Almeida, pesquisador do Instituto Butantan e do Instituto de Química da USP, foi investigar se a idade, frequentemente mais elevada nos pacientes com demências, poderia explicar o aumento da proporção de pacientes graves de covid-19. "Para isso, refizemos todas as análises dividindo os pacientes por grupos etários, de forma a levar em conta a idade. Nossos resultados se confirmaram mesmo levando em conta a questão da idade", explicou.

Embora a maior parte dos infectados consiga se recuperar da doença após alguns dias, uma proporção considerável dos pacientes desenvolve sintomas ou sequelas de longa duração, no que vem sendo chamado de "covid longa" ou de "síndrome pós-covid". Esses sintomas podem afetar vários órgãos e sistemas. No caso do sistema nervoso, os problemas causados pela covid-19 podem variar desde a perda de olfato ou paladar, que frequentemente é temporária, até sintomas mais duradouros como desorientação, dificuldade de concentração, problemas com aprendizado e memória e outros.

Sergio Ferreira informou que vários grupos de pesquisa no mundo, inclusive o nosso e os de outros colegas brasileiros, vêm se dedicando a entender o impacto da covid-19 no sistema nervoso e as consequências a médio ou longo prazo. "No entanto, a situação inversa, ou seja, se pacientes acometidos por problemas neurológicos prévios têm maior probabilidade de desenvolver formas complicadas da covid-19, ainda é pouco estudada", destacou o pesquisador da UFRJ.

O estudo foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelas Fundações de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e de São Paulo (Fapesp), pelo Instituto Nacional de Neurociência Translacional (INNT/Brasil) e pela Fundação Butantan.