Familiares de suspeitos acusam policiais de usarem facas durante operação
Familiares de suspeitos acusam policiais de usarem facas durante operaçãoDaniel Castelo Branco / Agência O DIA
Por Yuri Eiras
Rio - Em meio a dor de mães e esposas, gritos por "justiça" de que "foi chacina" rompem o silêncio no Instituto Médico Legal (IML), no Centro, onde se reúnem familiares dos suspeitos mortos durante a operação de quinta-feira, no Jacarezinho. Até agora, 19 das 27 famílias estiveram no local. André Frias, policial morto na ação, será enterrado em Sulacap na tarde desta sexta. O corpo sairá em cortejo da Cidade da Polícia.

A mãe de um dos suspeitos, que preferiu não se identificar, diz ter ouvido de policiais que "20 mães chorando é pouco", e que "iam chorar mais". Ela conta que soube que seu filho já teria se rendido, mas foi morto na ação. "Isso não é operação nem aqui, nem na China. É chacina. Eu fui até o local onde fiquei sabendo que ele estaria, falaram que meu filho estava lá nessa casa com outros três. Esperei pra ele sair, mas não saiu. Ele não vai voltar mais. Essas mães todas chorando vão ficar impunes? A gente não cria filho para ser bandido", diz a mãe.
"Nossos filhos iam se entregar, não reagiram. Quando aglomeramos dentro da casa para eles saírem, eles saíram sem arma, sem nada", completou. A polícia nega a versão, e diz que o único executado foi o policial civil, André Frias, baleado na cabeça por um traficante baseado em uma seteira.
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Thaynara Paes, 22, esposa de outro suspeito morto, Romulo Oliveira, também diz que o marido também havia se rendido. "Eles só pensavam em matar friamente. Eu moro no Jacarezinho há quatro anos, eles nunca vêm pra prender, sempre levam alguém. Depois que o policial morreu, eles voltaram com mais sangue nos olhos. Tem mais de 25 mortos, fora os sumidos. A última palavra dele foi 'perdi'".
A direção do Hospital Municipal Souza Aguiar informou que, na quinta-feira (6), 20 pessoas deram entrada na unidade já em óbito. Os corpos estão sendo levados para o IML, que vai avaliar os tipos de lesão e confirmar a identificação de cada um.
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O MP informou que um perito do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) acompanha a perícia nos corpos das pessoas mortas durante operação. O médico vai acompanhar todo o trabalho no IML e registrar, inclusive em imagens, o que for do interesse da investigação independente do MPRJ, que está sendo conduzida pela 1ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal Especializada do Núcleo Rio de Janeiro.
A Operação Exceptis, que cumpria 21 mandados de prisão contra traficantes suspeitos de recrutarem menores de idade, é tratada como a mais sangrenta no Estado do Rio.
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A Polícia Civil diz que as informações não procedem. "A Polícia Civil do Rio de Janeiro informa que todos os mortos durante a ação tinham antecedentes criminais e eram envolvidos com atividades criminosas. O único executado foi o inspetor de Polícia André Leonardo de Mello Frias", diz o texto.
O chefe do DGPE, delegado Felipe Curi, afirmou em coletiva na quinta-feira que a única execução que aconteceu na ação foi a do policial civil André Frias. "Se alguém fala de execução, a execução é esse colega tomar um tiro e vir a falecer", argumentou.
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Segundo Curi, a operação foi planejada com 10 meses de investigação. "A operação de hoje foi fruto de uma investigação de cerca de dez meses da delegacia de proteção à criança e ao adolescente. Essa investigação tinha como alvo a comunidade do Jacarezinho, tendo em vista que é dominada por uma das maiores facções do Rio de Janeiro".
"Investigamos o tráfico, mas no bojo da investigação descobrimos uma série de crimes. Tais como aliciamento de jovens e crianças, sequestro de composições da SuperVia, homicídio de pessoas que têm seus corpos sumidos", completou.
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Cerca de 200 agentes da Polícia Civil participaram da operação. Policiais militares apoiaram a operação, impedindo a fuga de criminosos pela linha férrea. Na ação, de 21 mandados de prisão, três foram cumpridos. Foram apreendidas 16 pistolas, 6 fuzis, uma submetralhadora (similar a usada na morte da vereadora Marielle Franco), uma munição ante aérea e 12 granadas.
Mortos no Jacarezinho são identificados
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Uma equipe da OAB-RJ colheu os dados de boa parte dos suspeitos mortos na ação. Confira lista abaixo:

1. Raul Barreto de Araujo, 19 anos
2. Romulo Oliveira Lucio, 20 anos
3. Mauricio Ferreira da Silva, 27 anos
4. Jhonatan araujo da Silva, 18 anos
5. John Jefferson Mendes Rufino da Silva, 30 anos
6. Wagner Luis de Magalhaes Fagundes, 38 anos
7. Richard Gabriel da Silva Ferreira, 23 anos
8. Marcio da Silva, 43 anos
9. Francisco Fabio Dias Araujo Chaves, 25 anos
10. Toni da Conceição, 30 anos
11. Isaac Pinheiro de Oliveira, 22 anos
12. Cleiton da Silva de Freitas Lima, 27 anos
13. Marcio Manoel da Silva, 31 anos
14. Jorge Jonas do Carmo, 31 anos
15. Carlos Ivan Avelino Costa Junior, 32
Polícia: 'Não há de se comemorar o resultado'
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De acordo com o delegado Felipe Curi, diretor do Departamento-Geral de Polícia Especializada, os 24 suspeitos mortos eram envolvidos com organizações criminosas que atuam na região. Segundo ele, três suspeitos eram alvos da operação. A ação terminou com seis presos e armas e drogas apreendidas.
"Todos os protocolos definidos na decisão do STF foram cumpridos, sem exceção. Lamentavelmente teve muito confronto na comunidade. Não há de se comemorar esse resultado, tamanha a quantidade de pessoas que vieram a falecer, da mesma forma também que não existe a capacidade de qualquer pessoa querer de alguma forma nos confortar pela morte do nosso policial. Ele estava lá em defesa da sociedade, cumprindo o seu dever e acabou sendo vitimado logo no início dessa operação", disse Rodrigo Oliveira, secretário da instituição, que negou ainda execuções na favela.
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Durante a coletiva, Oliveira ainda criticou o que chamou de ativismo judicial em relação às operações policiais em comunidades no Rio.
"Há de se discutir o que se entende por excepcionalidade a simples extensão do confronto, as barricadas existentes, as imagens que foram geradas pelas emissoras de TV, enfim, todos esses dados nos dão absoluta convicção de que não estamos lidando com uma excepcionalidade".