Alberto foi reconhecido como assaltante por uma foto 3x4Arquivo Pessoal

Rio - A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) vai pedir a revogação da prisão do estivador Alberto Meyrelles, de 39 anos, durante a audiência de custódia, que deve ser marcada nesta sexta-feira (19). Ele foi preso na quarta-feira (17), em Realengo, na Zona Oeste do Rio, acusado de ter praticado um assalto, em abril de 2019, no mesmo dia em que sua carteira foi roubada. De acordo com a subcoordenadora de Defesa Criminal da DPRJ, Isabel Schprejer, responsável pelo caso, desde que a prisão preventiva foi decretada, dois habeas corpus e um pedido de revogação foram negados pelo Tribunal de Justiça de Rio (TJRJ) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

"Nós estamos buscando a liberdade dele já há muitos meses, fizemos vários pedidos, mas antes dele ser preso. A gente tinha feito pedidos preventivos, para evitar justamente a prisão, que a gente entende ser desnecessária, ilegal. Ele tem carteira assinada, ele é um trabalhador e essa prisão prejudica muito. Desde a efetiva prisão dele, nós estamos aguardando a audiência de custódia acontecer para fazer um novo pedido", afirmou a defensora.

Segundo a subcoordenadora, os pedidos foram negados com base em "questões abstratas", como ordem pública. Ela explica que o estivador tem duas anotações por violência doméstica, mas que os dois processos foram extintos e não houve condenação. Dessa forma, ele continua sem antecedentes criminais e réu primário. Uma outra anotação também é referente a reconhecimento fotográfico, mas ainda não gerou processo, apenas inquérito policial.

"Só o fato dele entrar no sistema penitenciário já é uma questão muito grave. Ele é um homem que trabalha há muitos anos, comprovadamente, não estava fugindo, ele tem residência fixa. Nós entendemos que ele não precisa se recolher à prisão para pedir a revogação da prisão", alegou Schprejer, que acredita que uma possível condenação é injusta.

"Nós entendemos que se ele vier a ser condenado, seria uma injustiça muito grande. Possibilidade não tem como afastar, pode ser que o juiz o entenda assim, mas com certeza nós vamos ajuizar todos os recursos, todos os remédios cabíveis. Ele foi reconhecido com base em uma foto 3x4 da carteira de motorista, e só com base nisso foi decretada a prisão. Não tem nenhum outro indício, não tem nenhuma prova, então, se houver uma condenação, nós entendemos que será extremamente injusta."

Dados de relatórios da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ) e do Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege) mostraram que, entre os anos de 2012 e 2020, o reconhecimento por foto como única prova para prisão de suspeitos, prendeu 90 pessoas injustamente, sendo 81% delas negras. Desse total, 73 prisões aconteceram no Rio de Janeiro. Para a defensora, o método está baseado no racismo estrutural da sociedade.

"A gente vê que é algo que demonstra o racismo estrutural, que a gente tem na nossa sociedade. Na própria formação do álbum de suspeitos das delegacias, basta folhear que você vai ver quem são as pessoas que lá estão: jovens negros, muitas vezes com baixa escolaridade. Tem um perfil muito bem definido das pessoas que são penalmente perseguidas. A foto do Alberto não estava em um álbum de suspeitos, mas vem a pergunta: por que essa foto foi mostrada à vítima? Se fosse uma pessoa branca, será que mostrariam?".

A defensora ressalta ainda que, caso o pedido de revogação da prisão seja aceito na audiência de custódia, Alberto Meyrelles pode processar o Estado por danos morais e materiais. "Existe a possibilidade de uma ação de indenização por danos. Imagine que ele venha a perder o emprego por causa disso, ele vai ter danos materiais comprovados. Mas, tem os danos morais, também. O próprio recolhimento ao cárcere, o fato de estar respondendo a processo penal, por si só, já é um fardo, por ele estar na posição de réu. Ele poderia sim buscar a reparação", concluiu ela.
Em nota, a Polícia Civil informou que o reconhecimento fotográfico aconteceu na gestão passada da pasta e que a atual orientou, desde outubro de 2020, que os delegados não usem apenas o reconhecimento fotográfico como prova em inquéritos policiais para pedir a prisão de suspeitos. "A instituição informa que o método, que é aceito pela Justiça, é um instrumento importante para o início de uma investigação, mas deve ser ratificado por outras provas técnicas".