Lembranças são mesmo assim: um pouco de nós segue no coração do outro e um pedaço do próximo fica com a genteArte: Kiko

Era manhã no fim de novembro, quando uma mensagem repleta de delicadeza surgiu no meu Whatsapp. "Oi! Estou procurando uma tatuagem de rosa dos ventos com mapa do Brasil para customizar uma jaqueta. Vi essa aqui e me lembrei de você", escreveu a minha amiga Gisele, compartilhando uma bela imagem em seguida. Nela, uma garota surgia imersa numa xícara de café e também numa leitura, reunindo duas paixões minhas. Respondi que havia amado a ilustração, e ela completou: "Sabia!"
É sempre assim: essas mensagens acompanhadas das mágicas palavras "eu me lembrei de você" mexem com o meu coração. Pelo simples fato de trazerem as singelezas da vida. Adoro recebê-las e também enviá-las. Nas minhas andanças pelo Rio de Janeiro, qualquer mapa que vejo em ilustrações ou pinturas me remete à Gisele, assim como bons brindes à vida. Afinal, ela é geógrafa por formação e apreciadora de vinhos por paixão.
Lembranças são mesmo assim: um pouco de nós segue no coração do outro e um pedaço do próximo fica com a gente. Sei também que a minha nostalgia canceriana já é bem compreendida por outra amiga, a geminiana Cláudia. Tanto que, logo no primeiro dia de 2022, ela resgatou e me enviou o áudio de uma mensagem de Ano Novo de 1980 de uma rádio carioca. Gostei de ouvir algo vindo de uma década que parece distante da nossa, mas que já desejava que "a saudade se transforme em presença".
Dos sons para a escrita, eu me recordo de um mimo trazido certa vez pela minha irmã e os meus sobrinhos de uma viagem a Maceió. Numa sorveteria, eles encontraram um lápis em que se lia: "Sua fábrica de felicidade". Ideal para simbolizar a minha paixão pela escrita. Da mesma forma, também já presenteei um amigo com um lápis, pelo simples fato de ser personalizado com o seu signo, que ele tanto ama. Difícil mesmo é apagar esses registros do coração.
Desse modo, cenas, lugares, fotos, aromas, histórias e expressões nos remetem a várias pessoas, sem nos pedir licença. Certa vez, os arremates do tempo me levaram imediatamente a outra amiga, Delma, que adora costurar. A lembrança veio através de uma ilustração no Instagram, com a pergunta: "É normal conversar com a máquina de costura?" Enviei para ela, que confirmou ser comum o bate-papo em questão.
As recordações são tão potentes que nem mesmo a ausência física é capaz de detê-las. Afinal, é ilusão achar que vamos cessar as lembranças — a diferença é como lidamos com elas. Assim, ao abrir uma gaveta de um armário na casa de praia em Rio das Ostras, no fim do ano, pensei na minha mãe. Lá estavam linhas e agulha deixadas por ela para reparos de última hora, dando os sinais de que mães se preocupam mesmo com tudo, especialistas que são na arte de alinhavar roupas, sentimentos e memórias eternas.